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Menos da metade dos professores de ensino fundamental no Brasil pode se dar
ao luxo de laborar num único colégio. O dado, revelado pela Pesquisa Internacional
de Ensino e Aprendizado (Talis, na sigla em inglês) da OCDE, o clube dos países
mais desenvolvidos, joga luz sobre um problema que, de acordo com especialistas,
afeta diretamente a qualidade da educação.
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Segundo o levantamento, que a OCDE realizou junto a cem mil professores em 34
países e cujos resultados apresenta hoje em Paris, apenas 40% dos docentes
brasileiros que atuam nos primeiros anos do ensino têm dedicação exclusiva,
contra 82% na média das nações pesquisadas. De acordo com a gerente da área técnica do movimento Todos Pela Educação,
Alejandra Meraz Velasco, por trás dessa realidade estão os salários
insuficientes e o baixo número de professores em determinadas áreas.
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— Os profissionais de exatas, por exemplo, encontram oportunidades mais
atraentes que a sala de aula quando se formam. Isso gera um déficit que acaba
sendo tratado com o deslocamento de profissionais — observa. — A consequência é
um prejuízo no envolvimento do professor com o projeto pedagógico das
escolas.
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A vida em mais de uma escola é o caso de Marcelle Aguiar, professora de
inglês de 33 anos. Para alcançar renda mensal de R$ 3.500, ela precisou assumir
19 turmas em quatro escolas. Marcelle trabalha para a rede municipal do Rio,
onde atua num colégio na Pavuna e outro em Acari, e também para a rede municipal
de Magé, na qual dá aulas em mais dois colégios.
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— Seria infinitamente melhor se pudesse receber um bom salário para atuar em apenas uma escola. Teria mais tempo para planejar atividades e vínculos ainda mais fortes com os alunos — pondera.
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— Seria infinitamente melhor se pudesse receber um bom salário para atuar em apenas uma escola. Teria mais tempo para planejar atividades e vínculos ainda mais fortes com os alunos — pondera.
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Além da rotina pesada, a professora também já precisou enfrentar escolas
inseridas em contextos de violência, como comunidades marcadas pelo tráfico de
drogas. Segundo ela, muitas vezes esse peso recai diretamente sobre o
professor:
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— Em alguns casos, os alunos liberam toda a sua agressividade na escola. Os
colégios cada vez mais têm que estar preparados para agir como agentes
transformadores. Mas, para isso, é preciso apoio de psicólogos e assistentes
sociais, já que determinados aspectos fogem ao nosso alcance.
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O cenário descrito por Marcelle também aparece na pesquisa da OCDE, que pediu
a professores e diretores (15 mil deles apenas no Brasil) que respondessem a
questionários com perguntas sobre liderança escolar, ambiente de trabalho,
satisfação e eficiência, práticas pedagógicas e expectativas, avaliação,
aprendizado e desenvolvimento de oportunidades. Dos 34 países, somente em
Brasil, Malásia e México mais de 10% dos diretores relataram que experimentam
episódios de vandalismo ou roubo em uma base semanal. Para a organização, “não
surpreende que, tanto no Brasil quanto em outras nações, gestores escolares
tenham relatado níveis mais elevados de inadimplência em suas escolas, além de
níveis mais baixos de satisfação no trabalho.”
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Nosso país também aparece ao lado do México, da Suécia e da Bélgica no
quesito respeito ao professor: quase um terço dos professores trabalham em
escolas onde houve relatos de intimidação ou abuso verbal por parte dos alunos.
O Brasil é um dos únicos também onde mais de 10% dos diretores disseram ter
presenciado agressões verbais a seus professores toda semana.
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MULHERES SÃO ESMAGADORA MAIORIA
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O estudo também comprova uma realidade que
qualquer um que já entrou numa escola de ensino fundamental percebeu: as
mulheres são a esmagadora maioria dos professores. Mais especificamente, 71%
deles (na média de todos os países pesquisados, são 68%). Embora 96% dos docentes por aqui tenham diploma de graduação, somente 76%
completaram cursos de licenciatura. Esse índice fica abaixo da média mundial, de
90%. Mesmo assim, os profissionais de educação básica daqui acumulam uma
experiência profissional de 14 anos, só dois a menos que a média.
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Também na direção das escolas, só 25% são homens, contra 51% na média da
OCDE. As gestoras têm formação mais elevada que seus empregados professores: 96%
delas completaram graduação com licenciatura, e 88% fizeram algum tipo de
treinamento para assumir o posto administrativo. No entanto, se os diretores nos
34 países da pesquisa somam tempo médio de experiência profissional de 30 anos,
por aqui o número cai para 21. Outro ponto bastante enfatizado pela TALIS é a questão da avaliação de
professores e de como ela impacta o dia a dia na sala de aula. Por aqui, 80% dos
docentes disseram ter implementado melhores práticas letivas depois de receber
bons retornos de seus superiores, contra só 62% na média da OCDE.
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A atual coordenadora da pré-escola na Escola Americana, Isabela Baltazar
também já foi professora da instituição e defende que, em ambas posições, o
retorno sobre o trabalho em sala de aula é fundamental para o bom
rendimento:
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— Dando este tipo de suporte, temos professores mais confiantes. Isso passa
mais segurança ao aluno.
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SOBRE A TALIS
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Esta é a segunda edição da Pesquisa Internacional de Ensino e Aprendizado,
sendo a primeira realizada em 2008 com pouco mais de 20 países. Para o Talis
2013, foram ouvidos cerca de 100 mil professores e diretores de escolas em 34
países. No Brasil, cerca de 15 mil docentes e mil gestores de escolas atenderam
aos questionários enviados pela OCDE.
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A organização os pediu que respondessem questões que versavam sobre liderança
escolar, ambiente de trabalho, satisfação no trabalho e eficiência, práticas
pedagógicas e expectativas, avaliação e feedback, aprendizado e desenvolvimento
de oportunidades.
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Fonte: O Globo on line e Todos pela Educação
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