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Por Leonardo Boff*
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Não é verdade que vivemos tempos pós-utópicos. Aceitar esta afirmação é mostrar uma representação reducionista do ser humano. Ele não é apenas um dado que está ai fechado, vivo e consciente, ao lado de outros seres. Ele é também um ser virtual. Esconde dentro de si virtualidades ilimitadas, que podem irromper e concretizar-se. Ele é um ser de desejo, portador do princípio esperança (Bloch), permanentemente insatisfeito e sempre buscando novas coisas. No fundo, ele é um projeto infinito, à procura de um obscuro objeto que lhe seja adequado.
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Essas são as utopias maximalistas. Propunham o máximo. Muitas delas foram impostas com violência ou geraram violência contra seus opositores. Temos hoje distância temporal suficiente para nos confirmar que estas utopias maximalistas frustraram o ser humano. Entraram em crise e perderam seu fascínio. Dai falarmos de tempos pós-utópicos. Mas o pós se refere a este tipo de utopia maximalista. Elas deixaram um rastro de decepção e de depressão, especialmente, a utopia da revolução absoluta dos anos 60-70 do século passado, como a cultura hippy e seus derivados.
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Mas a utopia permanece porque pertence ao ânimo humano. Hoje, a busca se orienta pelas utopias minimalistas, aquelas que, no dizer de Paulo Freire, realizam o “possível viável” e fazem a sociedade “menos malvada e tornam menos difícil o amor”. Nota-se por todas as partes a urgência latente de utopias do simples melhoramento do mundo. Tudo o que nos entra pelas muitas janelas de informação nos leva a sentir: assim como o mundo está, não pode continuar. Mudar e, se não der, ao menos melhorar.
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Não pode continuar a absurda acumulação de riqueza como jamais houve na história (85 mais ricos possuem rendas correspondentes a 3,57 bilhões de pessoas, como denunciava a ONG Oxfam intermón em janeiro deste ano em Davos). Para esses, o sistema econômico-financeiro não está em crise; ao contrário, oferece chances de acumulação como nunca antes na história devastadora do capitalismo. Há que se pôr um freio à verocidade produtivista que assalta os bens e serviços da natureza em vista da acumulação, produz gases de efeito estufa que alimenta o aquecimento global, que, ao não ser detido, poderá produzir um armagedon ecológico.
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A nível das grandes maiorias, são verdadeiras utopias mínimas viáveis: receber um salário que atenda às necessidades da família, ter acesso à saúde, mandar os filhos à escola, conseguir um transporte coletivo que não lhe tire tanto tempo de vida, contar com serviços sanitários básicos, dispor de lugares de lazer e de cultura, e com uma aposentadoria digna para enfrentar os achaques da velhice.
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A consecução destas utopias minimalistas cria a base para utopias mais altas: aspirar a que os povos se abracem na fraternidade, que não se guerreiem, se unam todos para preservar este pequeno e belo planeta Terra, sem o qual nenhuma utopia maximalista ou minimalista pode ser projetada. O primeiro ofício do ser humano é viver livre de necessidades e gozando um pouco do reino da liberdade. E por fim poder dizer “valeu a pena”.
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* Leonardo Boff escreveu 'Virtudes para um outro mundo possivel', 3 vol. (Vozes, 2005).
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