.
João Batista Damasceno*
.
A palavra ‘vandalismo’ é uma das poucas que sabemos onde e quem a usou
pela primeira vez. Padre Grégoire, deputado influente na Constituinte francesa e
membro da Convenção, período da Revolução que antecedeu o Diretório e a ascensão
de Napoleão Bonaparte, a escreveu em 1794. Nos relatórios, Grégoire estigmatizou
“o vandalismo e a violência revolucionária do populacho que destrói patrimônio”.
O termo foi usado correntemente depois da decapitação de Robespierre, a quem a
alta burguesia dizia ser “vandalista que se infiltrou entre nós”. A comissão
especial instituída para investigação dos atos de vandalismo, nominada de
‘Comissão dos Monumentos’ ou ‘Comissão de Instrução Pública’, tinha o objetivo
de apurar e denunciar a “barbárie” e os “vândalos” como forças hostis. Além de
apontar a violência dos revolucionários como nociva, inventariou “os prejuízos
resultantes da venda de bens nacionais” pela aristocracia.
.
.
Ninguém se propõe a fazer apologia de destruições, mas foram os
comportamentos radicais, patrióticos e cívicos dos ‘sans-culottes’,
trabalhadores pobres e considerados “classe perigosa” pela grande burguesia
francesa, que ensejaram as transformações políticas das quais o mundo hoje se
orgulha.
.
.
O poder constituído, na defesa dos interesses que não os do povo, criminaliza
os movimentos sociais. Em ‘Comentários sobre a Primeira Década de Tito Lívio’,
Maquiavel escreveu que “Os que criticam as contínuas dissensões entre os
aristocratas e o povo parecem desaprovar justamente as causas que asseguraram
fosse conservada a liberdade de Roma, prestando mais atenção aos gritos e
rumores provocados por tais dissensões do que aos seus efeitos salutares. Não
querem perceber que há em todos os governos duas fontes de oposição: os
interesses do povo e os da classe dominante. Todas as leis para proteger a
liberdade nascem da sua desunião”.
.
Criminalizar os movimentos sociais é o primeiro recurso da elite dominante.
Quando a ordem jurídica não o admite, o Estado o faz ilegalmente.
.
* é Doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito. Membro da
Associação Juízes para a Democracia.
.
Fonte: O DIA
Nenhum comentário:
Postar um comentário