sexta-feira, 23 de outubro de 2015

A justiça é branca e rica

 
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No dia 15 de outubro Juliana Cristina da Silva, de 28 anos, responsável pelo atropelamento de dois operários que pintavam uma ciclo-faixa, foi libertada da prisão onde estava desde o dia do acidente, 18 último, para responder ao processo em liberdade.
 
Juliana terá de pagar um fiança de 20 salários mínimos, o equivalente a 15 mil reais, e comparecer ao fórum a cada dois meses. Foi comprovado que Juliana estava embriagada no momento do acidente.
 
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José Airton de Andrade e Raimundo Barbosa dos Santos morreram vítimas do atropelamento. O primeiro deixa dois filhos e o segundo, quatro. Além de atropelar e matar os dois homens, Juliana fugiu do local do acidente e chegou a percorrer cerca de 3 quilômetros antes de ser parada pela polícia. E Juliana responderá em liberdade.
 
Dina Alves, advogada e ativista, concluiu uma pesquisa de mestrado nesse ano na PUC São Paulo, na qual analisou o modo pelo qual rés negras são tratadas pelo judiciário. A pesquisa Rés negras, Judiciário branco: uma análise da interseccionalidade de gênero, raça e classe na produção da punição em uma prisão paulistana, tinha o objetivo de oferecer uma análise interseccional de gênero, raça e classe sobre a distribuição desigual da punição no sistema de justiça criminal paulista e aprofundar a relação entre a feminização da pobreza e feminização da punição.
 
“A análise interseccional oferece possibilidades de descentralizar (ou complexar) os estudos sobre as prisões que têm privilegiado a perspectiva de classe social em detrimento de uma abordagem mais ampla e condizente com a realidade racial brasileira”, diz Dina.
 
“Embora as mulheres presas tenham sido objeto de crescente interesse entre pesquisadores do sistema penitenciário nacional, as mulheres negras não aparecem em suas discussões, ainda que constituam o principal grupo de presas no país. Alguns trabalhos têm mostrado que as mulheres, de modo geral, possuem uma vulnerabilidade específica, marcada por sua condição de gênero em uma sociedade estruturada a partir de desigualdades entre homens e mulheres", prossegue.
 
"Apesar de tais estudos ajudarem a entender a dimensão de gênero nas prisões – uma vez que elas têm o mérito de des-masculinizar as narrativas sobre o universo prisional - eles têm se revelado insuficientes no que diz respeito à especificidade da mulher negra”, conclui.
 
Para tal, Dina entrevistou algumas rés negras para que falassem de suas situações e eventuais violências sofridas e as histórias demonstram a parcialidade da justiça brasileira. Dina não colocou os nomes verdadeiros das mulheres, segundo ela o uso do nome fictício foi político “para preservar a imagem da entrevistada e para romper com a lógica burocrática que a reduziu a números, tanto nos seus prontuários que tive acesso, quantos nos processos criminais”. Dessas, se destaca a história de Joana.
 
“Eu peguei sete anos de novo e tou aqui com minha filha, e agora ela teve um bebê, meu neto. Quando fui presa, trabalhava como carroceira e morava nas ruas, embaixo do viaduto do Glicério. Eu tava na cracolândia e o policial me levou. Eu engoli três pedras de crack pra não ser presa. Já perdi as contas de quantas vezes vim pra cá. A primeira vez foi com 17 anos quando fui para a Febem, e hoje tenho 49 anos. Já vivi mais aqui do que lá fora. O que eu quero hoje é poder ficar com minha filha mais perto e meu neto. O pai do menino a polícia matou e eles querem levar meu neto para a adoção, mas eu não vou deixar. Já falei com a Pastoral”, relata uma entrevista realizada em 5 de outubro de 2014.
 
Sobre Joana, Dina diz: “Nos meus encontros com Joana percebi a figura de uma mulher negra, carroceira, sem dentes, obesa e dependente de drogas. A experiência de Joana como usuária e vendedora de drogas na Cracolândia ajuda a entender o que a socióloga norte-americana Julia Sudbury chama de “feminização da pobreza”.
 
Cada vez mais marginalizadas do acesso às esferas de produção de consumo e direitos de cidadania, mulheres negras, como Joana, figuram na economia ilegal do tráfico de drogas como vendedoras, mulas ou simplesmente consumidoras. Joana tem uma história de uso de drogas que tem tudo a ver com o processo de racismo e feminização da pobreza no Brasil.
 
Sua história de aprisionamento começou aos 11 anos de idade quando viveu entre as ruas e abrigos do Estado. Foi apreendida aos 17 anos de idade na atual Fundação Casa (FEBEM) e hoje cumpre pena na penitenciaria Feminina de Santana com sua filha e seu neto recém-nascido. Entre a prisão e as ruas, Joana tem a vida marcada por um assalto patriarcal ao seu corpo que pode ser visto em sua aparência doentia e envelhecida, embora possua apenas 49 anos de idade”.
 
Joana não teve a mesma sorte de Juliana. Joana é negra, pobre e desde muito cedo sofre com a omissão do Estado. Juliana é branca e rica e, mesmo tendo matado duas pessoas, é beneficiada pela ação do Estado que concede privilégios ao grupo branco por conta do racismo estrutural. Joana, aos 49 anos seguirá encarcerada e sem oportunidades.
 
Juliana, após tirar a vida de dois trabalhadores por dirigir alcoolizada, o que também configura crime, vai passar o natal com a família porque na lógica desigual racista, foi só uma moça de bem que cometeu um erro.
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O MasterChef Júnior e a sexualização infantil

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A versão infantil do reality show foi ao ar na noite de terça-feira 20/10/2015
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Valentina foi escolhida para participar do MasterChef Júnior junto com diversas outras crianças, meninos e meninas. O que separa Valentina de todas as outras crianças, por enquanto, não é seu talento na cozinha, mas a cultura do estupro que permite que homens adultos falem por aí como poderiam estuprar a garota.
 
(É bom avisar que mesmo que a descrição de Valentina fosse outra, tudo que vamos ver abaixo continuaria sendo errado e horrível)
 
Vamos deixar algo claro desde o começo: qualquer tipo de relação de natureza sexual com uma criança é estupro. Uma criança nunca pode ter uma relação sexual consensual porque ela é criança e não pode tomar esse tipo de decisão. Por lei.
 
Vamos dar o nome certo às coisas. Aqui não estamos falando de pedofilia, que é uma doença que pode ser tratada antes que a pessoa cometa qualquer crime –  seja ele consumir pornografia infantil ou o estupro. Nenhum desses homens que comentou sobre a MasterChef é doente, eles apenas acham que têm o direito de falar absurdos como esse porque olham para ela e não enxergam uma criança, mas uma mulher.
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Antes que seja tarde...

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Organizações internacionais se manifestam contrárias à redução da maioridade penal no Brasil.
Após incidência política da Anced/Seção DCI e Renade, organizações internacionais se manifestam contrárias à redução da maioridade penal no Brasil.
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Leia mais: www.carinhodeverdade.org.br/releases/ler/690
Foto: Centro de Defesa da Criança e do Adolescente

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Relações com Anísio Teixeira e Leonel Brizola fizeram de Darcy Ribeiro um dos expoentes das reformas educacionais no país


ILUSTRAÇÃO MATHEUS VIGLIAR

Helena Bomeny*
 
O encontro de Darcy Ribeiro com o educador Anísio Teixeira, na década de 1950, foi mais do que a ventura da aproximação entre dois amigos: produziu no antropólogo um verdadeiro roteiro de atuação pública e deu a ele o desenho de uma agenda na qual o tema da educação ocupou lugar primordial. “Anísio me ensinou a duvidar e a pensar”, lembraria Darcy.
 
No primeiro momento houve uma espécie de desconfiança mútua. Anísio, americanista, urbano, envolvido com os problemas da educação e com a universalização desse direito, era uma das lideranças mais notáveis do Movimento dos Pioneiros da Educação Nova – que arregimentou intelectuais na década de 1920 em caravanas por reformas educacionais em praticamente todos os estados brasileiros. Darcy, com as lentes voltadas para a questão indígena (herança de sua aproximação com o marechal Cândido Rondon), adentrava o interior brasileiro em busca do que supunha traduzir a alma nacional. Duvidava do que considerava uma educação comunitária, aquela preconizada na América do Norte, fruto da cultura protestante, que obrigava os fiéis à leitura da Bíblia, situação em nada comparável com o Brasil. 
 
Quando seus percursos se cruzaram, iniciou-se um intenso caminho em comum. O encontro aconteceu no Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep), criado por Anísio, de onde nasceria o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), que contou com participação ativa de Darcy. A parceria se afinou na criação da Universidade de Brasília (UnB) e foi consolidada quando Darcy Ribeiro assumiu o Ministério da Educação e Cultura (MEC), sendo substituído por Teixeira na reitoria da UnB. O golpe de 1964 retirou o antropólogo não só do governo João Goulart (de quem era chefe da Casa Civil) como da Universidade do Brasil, onde lecionava desde 1956. 
 
A notícia da morte abrupta de Anísio Teixeira, em 1970, alcançou Darcy no exílio. Ao retornar ao Brasil definitivamente em 1978, ele reiniciou a cruzada pelo ensino básico, e cultivaria ao longo de sua vida o patrimônio herdado da união com o renovador da educação no Brasil. Pode-se dizer que Darcy Ribeiro foi o último expoente da Escola Nova – não fez parte do movimento, mas manteve-se fiel à causa que mobilizou uma de suas lideranças mais notáveis.
 
Os últimos 15 anos de sua vida foram marcados por outra parceria igualmente impactante: com Leonel Brizola, Darcy obteve carta branca para prosseguir em sua utopia escolanovista, escrevendo um dos capítulos da reforma educacional mais conhecidos do país. Em 1982, Darcy elegeu-se vice-governador do Rio de Janeiro pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), na chapa encabeçada por Brizola. A convivência o fez consolidar seu discurso popular, embasado não mais nas Minas Gerais, sua terra de origem, mas na tradição rio-grandense e no que chamou de “apreço pela classe de baixo” daquela elite política, traço visível em Vargas, João Goulart e Brizola. 
 
Tornou-se lugar comum na memória carioca e fluminense confundir o programa de educação dos governos Leonel Brizola com os CIEPs (Centros Integrados de Educação Pública). Mas o Programa Especial de Educação (PEE) era mais ambicioso do que isso. O objetivo era garantir à população o direito a um ensino gratuito moderno, reestruturado do ponto de vista pedagógico e tecnologicamente aparelhado. Previam-se metas assistenciais (como uniformes, calçados e melhoria da qualidade da merenda) e pedagógicas (como aumento da carga horária diária para cinco horas e revisão de todo o material didático), treinamento dos professores e melhoria de suas condições de trabalho, reforma e conservação das escolas e do mobiliário e novos projetos educacionais – voltados à pré-escola, à criação de Centros Culturais Comunitários e à educação juvenil noturna. Havia entre os idealizadores a convicção de que a democratização da educação teria que minimizar as carências essenciais daqueles estudantes que provinham de situações sociais desprotegidas. 
 
Os CIEPs foram concebidos como estabelecimentos que desenvolveriam uma extensa programação de atividades escolares e assistenciais para crianças e jovens, das 7h30 às 17h. Havia a figura do animador cultural – pessoa da comunidade capaz de trabalhar a cultura local junto com os alunos. Personagens mais próximos dos estudantes, despidos da “face professoral”, estimulariam padrões de interação entre crianças e educadores, recriando possibilidades de aprendizagem. Tudo começava com a cultura comunitária, suas manifestações, seus artistas sendo mobilizados para a rotina escolar. Os cuidados se estendiam à montagem de bibliotecas, salas de estudo e espaços de lazer com profissionais treinados para a jornada de tempo integral. Como parte da estrutura física do prédio, previam-se dormitórios para abrigar “pais sociais”, que se responsabilizariam, em troca da moradia, pelo acompanhamento escolar de crianças que também morassem na escola.
 
“Ao invés de escamotear a dura realidade em que vive a maioria de seus alunos, proveniente dos segmentos sociais mais pobres, o CIEP compromete-se com ela para poder transformá-la. É inviável educar crianças desnutridas? Então o CIEP supre as necessidades alimentares dos seus alunos. A maioria dos alunos não tem recursos financeiros? Então o CIEP fornece gratuitamente os uniformes e o material escolar necessário. Os alunos estão expostos a doenças infecciosas, estão com problemas dentários ou apresentam deficiência visual ou auditiva? Então o CIEP proporciona a todos eles assistência médica e odontológica”, proclamava Darcy Ribeiro.
 
Durante oito anos o programa de Brizola e Darcy ergueu 507 CIEPs e alcançou uma repercussão pública pouco comum em assuntos educacionais. A figura política do governador e a personalidade apaixonada e nem sempre ponderada do vice, a marcha frenética com que os CIEPs eram construídos e a confecção de um programa complexo implantado por meio de uma secretaria extraordinária de Educação despertaram reações positivas e críticas, vindas de diferentes extrações da comunidade intelectual e das hostes políticas adversárias. Uma intervenção pedagógica completamente ungida na esfera política criou mal-estar na comunidade dos educadores. O argumento era que o PEE havia se transformado em programa político, em detrimento da melhoria do sistema educacional. A cada matéria crítica contrapunha-se a voz de Darcy Ribeiro, sustentando a continuidade no tratamento de uma escola pública que até aquele momento, no Brasil, estava longe de cumprir o papel que a ela deve ser atribuído em uma sociedade democrática. 
 
Entre os educadores a reação foi igualmente virulenta. Ficaram expostos os pontos de fragilidade do PEE, que já nascia como programa de massa, extenso, volumoso, caro e sem condições de funcionamento na medida e na velocidade com que se implantava. Entre os cientistas sociais, a nota crítica foi para o populismo implicado na política pública assistencialista do governo Brizola. Pesava o estilo de liderança de ambos os condutores: personalista, voluntarista, demagógico, inconsequente. 
 
Talvez por ter acumulado um conjunto tão expressivo e abalizado de críticas, o brusco desmonte do programa pelo governo seguinte, de Moreira Franco, não produziu qualquer reação capaz de impedir a descontinuidade do esforço e do investimento até então dispensados. Os CIEPs foram desmontados como estruturas de ensino em horário integral, e as construções foram interrompidas. A rede pública de ensino voltaria ao sistema convencional, agora com o ensino fundamental municipalizado.
 
Ainda hoje os CIEPs permanecem como referência nas discussões mais importantes que embasam a tomada de decisões de políticas educacionais no Rio de Janeiro e no Brasil. O tempo de permanência das crianças nas escolas continua sendo um tema estratégico. Sempre que se renovam propostas de ensino em tempo integral e integração entre escola e comunidade, presta-se uma homenagem, mesmo que implícita, à obra de grandes personagens da história da educação no Brasil. Darcy Ribeiro está entre eles, ao lado de seus parceiros Anísio Teixeira e Leonel Brizola. 
 
*Helena Bomeny é professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, autora de Intelectuais da Educação (Zahar, 2001); Darcy Ribeiro. Sociologia de um indisciplinado (Editora da UFMG, 2001), e organizadora de A Escola que faz Escola (FGV, 2002).
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Fonte: Revista História. com.br http://rhbn.com.br/secao/retrato/em-boa-companhia

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Educação sem humor


Alta rotatividade no MEC afeta políticas públicas de ensino

 
RIO— É máxima entre educadores que para colher frutos no ensino de um país é preciso implementar políticas de longo prazo. No entanto, a troca constante de ministros na área indica que a realidade brasileira vai na contramão, criticam especialistas. Desde a redemocratização do país, há 30 anos, o Brasil teve 16 pessoas conduzindo o Ministério da Educação (MEC). Média de menos de dois anos para cada. Só no governo Dilma Rousseff, cujo slogan é “Pátria Educadora”, com a demissão de Renato Janine Ribeiro, ontem, houve cinco trocas em menos de cinco anos. Aloizio Mercadante, que ocupou o cargo de 2012 a 2014, está de volta à pasta. Ele será o quarto ministro da Educação em menos de um ano.
 
Desde 1985, quando José Sarney assumiu a Presidência, entre os cinco ministros que permaneceram menos tempo no MEC, três foram do governo Dilma: Cid Gomes, que ficou dois meses e meio, Janine com menos de seis meses, e Henrique Paim, que durou cerca de um ano. Da galeria de ministros, o único que conseguiu ter uma passagem ainda mais breve foi Eraldo Tinoco Melo, que comandou o MEC por menos de dois meses antes do impeachment de Fernando Collor.

A preocupação é com políticas públicas que podem ser afetadas devido ao troca-troca. Atualmente, especialistas se mostram temerosos em relação a medidas em elaboração, como a Base Nacional Comum — que unifica o conteúdo a ser ensinado nas escolas brasileiras —, o Plano Nacional de Educação (PNE) e investimentos em pós-graduação.
 
À frente da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Maria Margarida Machado criticou a constante mudança de ministros. Ela teme que a substituição de Janine interrompa a rodada de negociações para a liberação de recursos. A área foi uma das mais afetadas pelos cortes de gastos feitos pelo governo desde o início do ano.
 
— Perdemos mais uma vez com essa descontinuidade. Vamos ter que aguardar o posicionamento da nova equipe. O que preocupa quando há uma troca é a demora para que aquilo que estava em andamento seja retomado. No caso da pós, de julho para cá conseguimos a liberação de 25% do recurso de custeio e de verbas referentes a programas. Essa negociação não pode ser interrompida — comenta Maria Margarida.
 
Os quase seis meses de Janine à frente do ministério foram marcados por problemas em programas que são vitrine da presidente Dilma. O ministro anunciou medidas impopulares, como o aumento da taxa de juros do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e a diminuição do prazo para pagamento do crédito estudantil. Houve atrasos sistemáticos nos repasses do Pronatec às instituições que dão cursos do programa e o anúncio de apenas 1,3 milhão de vagas para este ano, o equivalente a 43% do que foi ofertado em 2014. O programa Ciência sem Fronteiras também foi esvaziado, e ainda não há previsão de vagas para 2016. As greves em boa parte das 63 universidades federais têm sido outro problema para o MEC. Na Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara destacou a importância de se colocar o Plano Nacional da Educação (PNE), que estabelece 20 metas a serem alcançadas até 2024, no centro da política do governo, o que, segundo ele, até agora não aconteceu.
 
— Para que as políticas tenham continuidade, a estabilidade do ministério é da maior importância. Precisamos ter clareza sobre quem são os atores da área — afirma o educador, que dá conselhos ao novo titular da pasta: — Janine não teve força para enfrentar os ajustes. O importante é que o próximo ministro tenha poder de frear os cortes. Mercadante tem mais força que Janine. Ele é um político com algum trânsito dentro do governo, Janine não tinha. O que preocupa é que ele ainda não transmitiu que tem o PNE como referência, como política educacional a ser seguida.
 
Segundo Cara, que atuou pela aprovação do PNE no Congresso, ano passado, o plano não sobrevive nessa realidade de ajuste fiscal:
 
— Não vejo disposição e instrumento orçamentário capazes de fazer essa confrontação hoje, o que está posto é a inviabilização do PNE.
 
Segundo o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Eduardo Deschamps, as mudanças no MEC podem ter impacto sobre eixos centrais da educação básica. Ele demonstra especial preocupação com a Base Curricular Comum, cuja proposta inicial foi divulgada pelo MEC em meados de setembro.
 
— Nunca é bom que haja tantas mudanças. Nossa maior preocupação é que projetos como Base Nacional Comum sejam descontinuados — ressalta Deschamps, antes de ponderar: — Mas também temos que entender que essas medidas, às vezes, são necessárias.
 
Coordenadora do movimento Todos Pela Educação, Alejandra Meraz Velasco faz coro com a questão da Base Comum. Segundo ela, as trocas também podem refletir sobre articulações que vinham sendo construídas em função de programas e projetos importantes.
 
— Irmos para o terceiro ministro em um ano traz um enorme prejuízo à educação. A estabilidade é fundamental para o sucesso das políticas públicas — pontua. — Não digo que a articulação da Base Nacional Comum terá recomeçar do zero, mas quando há uma troca de ministro, algo que já havia sido iniciado precisa ser revisitado.
 
O pró-reitor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e membro da Academia Brasileira de Educação Antônio Freitas é taxativo:
 
— Isso causa incerteza nos escalões inferiores, sobre a permanência ou não de diretores, coordenadores e executivos que estão ocupando postos importantes, o que faz com que projetos fiquem parados durante as transições — diz.— Essa mudança contínua é, de fato, uma negociação para preencher cargos e agradar partidos, o que obviamente prejudica muito a educação

Fonte: O Globo

Janine é demitido e, em dez meses, pasta da Educação terá 3º ministro

"A presidenta da República, Dilma Rousseff, esteve com o ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, nesta quarta-feira, 30, às 15h, no Palácio do Planalto. Ficou confirmada a saída de Janine Ribeiro do cargo. A presidenta reconheceu e agradeceu o trabalho do ministro no MEC", afirma a nota divulgada pelo ministério.
 
Em seu perfil no Facebook, o ministro informou: "Mandei publicar esta nota no Portal do MEC. O encontro foi absolutamente cordial".
 
Troca de cadeiras
Mercadante será o terceiro ministro da Educação desde janeiro deste ano – o primeiro nome escolhido para a pasta foi o do ex-governador do Ceará Cid Gomes, que deixou o posto após sessão conturbada no Congresso Nacional. O petista deixou o MEC no início de 2014 para assumir a Casa Civil e seu retorno deve motivar novas alterações no ministério.
 
Seu atual secretário-executivo, Marco Antonio de Oliveira, por exemplo, foi secretário de ciência e tecnologia para inclusão social quando Mercadante era o titular de Ciência e Tecnologia e, em seguida, foi nomeado para a secretaria de educação profissional do Ministério da Educação. Mercadante vai deixar a Casa Civil, que ficará com o atual ministro da Defesa, Jaques Wagner.
 
Nesta quarta-feira (30), Wagner informou que, se fosse convidado para assumir o cargo, estaria à disposição para ajudar. Ele também afirmou que o trabalho de articulação política do governo deve continuar nas mãos do ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini.
Berzoini também deve trocar de posto e atuar no Palácio do Planalto, à frente de uma nova pasta englobando a Secretaria de Relações Institucionais, o Gabinete de Segurança Institucional e a Secretaria Geral da Presidência.
 
Gestão de Janine
A gestão de Renato Janine no Ministério da Educação foi marcada por um orçamento limitado e certo incômodo com interferências externas na pasta – mais precisamente, do novo titular da Educação, que carrega o lema do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, Pátria Educadora.
 
Professor de Ética e Filosofia Política na USP, Janine teve seu nome anunciado em meio a investigações do maior escândalo de corrupção no país, e num momento de fragilidade política da gestão petista. A necessidade de melhorar o relacionamento com a base aliada foi justamente o que motivou uma nova troca na Educação, quase seis meses após a posse de Janine.
 
"Uma semana intensa de trabalho no MEC me familiarizando com seus mil programas e sua equipe", escreveu o ministro em rede social, no início de abril, dias antes de assumir o ministério. Desde então, Janine anunciou uma forte redução no número de contratos do Fies (cerca de 57% a menos em relação a 2014), se viu diante da mais longa greve das universidades federais e divulgou dados "preocupantes" sobre a alfabetização de crianças matriculadas no 3º ano do fundamental público. "Este ano vai exigir muita paciência", afirmou ele em entrevista publicada no dia em que tomou posse na nova função.
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Fonte: O Tempo (MG)