Por Ana Cássia Maturano*
Especial para o G1, em São Paulo
A relação que as pessoas estabelecem com o tempo é bastante peculiar. Algumas parecem senti-lo escorrer pelos dedos, aproveitando-o a cada segundo. Estão sempre fazendo algo e não deixam para amanhã o que já pode ser concluído. Para outras, a sensação é de que o tempo não acaba. Vão protelando a realização do que deve ser feito. Perdem prazos ou vivem períodos de muita angústia – passam madrugadas para concluírem algo cujo limite de entrega expira em poucas horas.
Cada pessoa tem um ritmo e um modo de funcionar no tempo. Entre outros fatores, isso tem a ver um pouco com a cultura em que vivem. Para os brasileiros, por exemplo, existe a máxima de que o ano só começa depois do carnaval. Essa idéia está tão arraigada, que a impressão que se tem é que é assim que funciona mesmo.
Não raro, observamos pessoas que mesmo desempregadas há uma boa temporada, não se movimentam para buscar trabalho se está, por exemplo, na época das festas de final de ano. Como se esse período significasse apenas festejar e se divertir, em que as coisas sérias da vida não ocorressem. Mesmo pensando assim, elas acontecem. Inclusive, morre-se ou se nasce nesse período.
E quando o novo ano inicia, estende-se mais uma vez seu começo para depois do carnaval. As tomadas de decisões e atitudes importantes ficam para depois, perdendo-se tempo. Porém, as coisas estão sempre acontecendo. E essas pessoas ficam paradas, impedidas de dar os passos da vida, arranjando um pretexto aqui e outro ali para não encará-la de frente.
Neste ano, a folia carnavalesca aconteceu mais tarde, deixando evidente que essa idéia é um grande engano. Algo que ficou bastante perceptível na escola, que parecia só tomar pé após o carnaval. Aqueles que têm filhos estudando, puderam observar que os compromissos acadêmicos foram cobrados já nesse primeiro mês de aula. Muitos já tiveram que ler livros, fazer provas e trabalhos. Ninguém esperou o carnaval para levar a sério o início do ano letivo.
E nem precisou desse primeiro mês para esquentar os motores. Até porque, esse vai sendo aquecido aos poucos. Sem dúvida, precisamos de um tempo para entrarmos num ritmo pós férias, sejam elas escolares ou não. Para os estudantes, provavelmente a primeira semana de aula é mais lenta e menos produtiva. Aquela que poucas coisas eles deveriam ter para fazer. Aos poucos, elas vão pegando o ritmo. É uma questão natural – após cerca de dois meses de férias, o ritmo das pessoas muda.
Como muitas vezes se tem apenas uma semana de aula antes do carnaval, talvez a impressão que ficou é de que o calendário letivo só comece depois, e consequentemente o ano também. Independente de qualquer marco na folhinha, seja carnaval ou final de ano, a existência do ser humano é contínua. Ele deve atentar para não achar que as coisas estão para acontecer. Em verdade, as coisas estão sempre acontecendo.
E que ninguém se engane pensando que o Brasil só vai começar mesmo depois da semana santa. Até lá, muita água vai rolar.
* - Ana Cássia Maturano é psicóloga e psicopedagoga
Fonte: G1
Nenhum comentário:
Postar um comentário