quinta-feira, 9 de junho de 2016

O “Estado Penal”


Fonte Jornal O TEMPO.

Lúcio Alves de Barros*


Se existe um fato vergonhoso e que faz a corrupção desenfreada no país parecer brincadeira de criança é a política criminal. Entendo política criminal como todo aparato repressivo que levam ao final homens e mulheres ao encarceramento. Não faz muito tempo apareceu nos meios acadêmicos a questão da configuração de “Estados penais” ou “Estado policiais”. Tratava-se de uma leitura bastante ousada na qual se assentava análises de políticas públicas voltadas ao encarceramento intenso de boa parte da população. Essa tese tinha como exemplo países como os EUA, a Rússia ou a China. Aos poucos a turma foi colocando o Brasil no meio. E não era para menos. As informações disponíveis apontam que no Brasil temos cerca de 622.202 pessoas presas e que este número – proveniente do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias, Ministério da Justiça, 26 de abril de 2016 – dobrou foi nos últimos 14 anos. As razões são diversas e no pouco espaço teço algumas considerações:

Em primeiro lugar, não é preciso ir longe para dizer que toda política de encarceramento tende a mostrar um país que não sabe, não pretende e não deseja fazer valer os direitos humanos. A privação de liberdade como mecanismo de dissuasão de crimes há muito é política falida, não valeu à pena no passado e não vai muito longe nos dias atuais, a não ser se continuarmos com essa de prender todos aqueles que carregam o estigma do “indesejável”, do “inimigo”, do “desviado” ou “diferente”. É claro que temos os criminosos, inclusive os de colarinho branco que estão recheando as manchetes de jornais. Mas como as coisas estão andando não creio que vamos muito longe. O nosso sistema ainda nos dias atuais tem como protagonista o ladrãozinho de galinha.

Em segundo lugar, vale chover no molhado e apontar que nossa cultura é autoritária e que tem por natureza pregar na cruz as pessoas negras, jovens e pobres. O leitor pode mencionar que o fenômeno é histórico. O que, na verdade, não tem valor nenhum quando atrás das grades não estão os filhos da “classe média alta” ou da “classe alta”. Fato é que a maioria da população encarcerada é de pessoas pretas e pardas (61,6%). No conjunto da população brasileira elas aparecem com 53,6%. Logo, a cadeia é negra e, como se não bastasse, de baixa escolaridade. Os dados do Ministério da Justiça apontam que os encarcerados possuem menos escolaridade que a média da população. Uma grande parte dos presos (75%) sequer concluiu o ensino fundamental e somente 9,5% chegou a terminar o ensino médio. Como se vê, presos e presas perdem na condição étnica e na possibilidade de agregar um mínimo de capital cultural necessário para pelo menos tentar uma medíocre defesa.

Em terceiro e último lugar, é lícito afirmar que algo está errado pois, apesar da onda “Lava Jato”, menos de 1% dos presos brasileiros estão atrás das grades por crimes relacionados à corrupção. A maioria está presa por roubo (21%), furto (11%), ações relacionados às drogas, como o tráfico (27%) e crimes contra a pessoa, o homicídio, por exemplo (14%). Cumpre verificar que o tráfico de entorpecentes lidera a quantidade de crimes que a moçada encarcerada andou cometendo. A situação é vergonhosa e passamos da hora de debater a liberação da maconha e outros mecanismos de identificação de criminalidade nos casos do “mundo das drogas”. Como se sabe a questão aqui também é seletiva: uma coisa é um jovem negro pobre com três ou quatro bolinhas de crack ou de maconha, outra é um jovem de classe média, branco e morador da zona sul. A droga se tornou no sistema criminal um forte mecanismo de distinção e posterior aprisionamento daqueles que por ora ou outrora estavam incomodando. Não pode ser por acaso que a maioria das pessoas aprisionadas é negra, jovem, com baixa ou sem escolaridade e muito pobre. Não se fazem masmorras com ricos. Ao contrário de grades, aos estudados temos prisões domiciliares, especiais, ou mesmo penas alternativas. O uso de tornozeleira eletrônica não parece cair bem na favela ou no bairro pobre. Longe das políticas públicas de segurança o sistema penitenciário há anos vem agonizando - em um equilíbrio tênue próximo a um controle consentido – e, como ele trata de uma população que fica do “lado de lá”, é bom nos acostumar com dados que revelam que no Brasil existem 306 presos para cada 100 mil habitantes. É muita gente presa para uma taxa mundial (que acho alta) de 144 pessoas presas por 100 mil habitantes.

* Professor na FAE (Faculdade de Educação) - Belo Horizonte - UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais)

Educação em humor


quinta-feira, 24 de março de 2016

Falta Política


Lúcio Alves de Barros*

O momento político que perpassa a alma nacional é de crise. Penso que crises são interessantes e eficientes para se chegar a algum lugar. Elas têm importância quando temos ciência deste lugar e qual é o fim almejado quando lá. O problema no Brasil é que as crises são utilizadas como meios nos quais a vaidade, a medição de falo, a calúnia e a difamação são empregadas ostensivamente. Tais mecanismos de briguinha de rua e de vizinhos invejosos matam a política que, por definição, é campo de negociação, busca de consentimento, de conversa, de objetivos maiores e públicos. Estamos perdendo tempo e ele é grande. Nesse caminho levanto somente alguns pontos na tentativa de elucidar o andar correto da carruagem.

Em primeiro lugar, são inadmissíveis  ações que podem gerar violência. O ódio já está no ar e uma guerra civil verborrágica não leva grupos e ideias a nada. Pelo contrário, ela emperra o debate, cala os atores, empodera os mais fortes e joga um “estado de direito” no chão. O caminho trilhado hoje no Brasil, de calar o outro na pancada e na voz alta, sem o direito à defesa ou ao contraditório não é nem um pouco civilizado. As pessoas já perderam o equilíbrio dos nervos, estão se sentindo injustiçadas, desajustadas, traídas, amedrontadas, confusas, inseguras e sem lugar. No caso em tela existe somente uma saída: a conversa, as negociações, acordos tácitos e manifestos para que o fim seja o equilíbrio institucional e, por ressonância, o social.

Em segundo lugar, é preciso lembrar que a governabilidade é atributo da sociedade e não dos atores que estão entrincheirados no judiciário, no executivo e no legislativo. Em outros termos, cumpre à sociedade – este mundo da vida repleto de relações sociais – a busca do equilíbrio e da normalidade social. Todo processo anômico tem por natureza a falta de regras e normas consensuais. Os acontecimentos mais recentes nos mostram que estamos longe disso. Portanto, não existe outra saída e vou repeti-la: é necessário a conversa, as negociações e um acordo pró-sociedade e pela política. A normalidade social só se fortalece com indivíduos interessados em escutar, entender e levantar possíveis consensos. Não se discute com sangue na boca, nos olhos ou nas mãos. Não há conversa que se sustenta com surdos sem libras e bêbados com estômagos vazios. A sociedade clama por clarividência, seriedade, explicações e valores nobres e aceitáveis capazes de darem rumo a um país que está parado e enfrentando uma séria crise econômica.

Em terceiro e último lugar, faz-se imperativo, na esteira do que pensava o sociólogo alemão Max Weber, chamar os atores à responsabilidade. Dito de outra forma, no campo minado da política, onde se procura um gato preto em um quarto escuro, faz-se primordial a responsabilidade daqueles que operam nas instituições. Considero que existe muita irresponsabilidade no executivo, no judiciário e no legislativo. Não é preciso colocar mais fogo no que está queimando há anos. Às lideranças dos poderes sugiro novamente o que toda política necessita: a arte da conversa, da negociação e dos acordos e consentimentos. A política morre na calúnia passível de destruição do outro, no jogo sujo do roubo, da corrupção, da incerteza social, na vaidade individual e no espetáculo sem rumos que se tornou esta esfera no campo midiático. É mais do que necessário que os atores se sintam responsabilizados pelo estado das coisas e pelo que pode acontecer em casos de desordem sem fim. Que não seja preciso a destruição do oponente ou a produção de um corpo sem vida para legitimar o poder. A política responsável bem como a sua legitimidade, na qual a linguagem é o mecanismo perfeito, está em xeque neste momento. Aqui e acolá estamos à beira de um ataque de nervos, a ansiedade e os hormônios em descontrole arrebentam a tireoide nacional e a insensatez toma força. Portanto, vale um apelo: crianças birrentas no poder parem de brigar, adolescentes machões, beijem logo de língua e acabem com esta bagunça. Adultos, se confessem, busquem o perdão, liguem para o Papa, vale uma ajuda do terapeuta ou mesmo uma simples reunião (sem escutas telefônicas, é claro) como tantas para negociar, para fazer política, conversar, entrar em consenso e equilibrar o que outrora e historicamente já nos levou para cenários constrangedores e perigosos.

* Professor na Faculdade de Educação / FaE - Campus BH / UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerias). 

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Pequenos príncipes

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Por Tory Oliveira.
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Eles são agressivos, mimados e mandões. Tudo precisa ser feito para eles e na hora que eles demandam. Tal comportamento, cada vez mais presente em casa ou na escola, faz dessas crianças déspotas mirins, pequenos sem limites que acreditam ser o centro do mundo.  Essa é a visão da psicanalista e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa de Psicanálise e Educação da USP Marcia Neder, autora do livro Déspotas Mirins – O Poder nas Novas Famílias, publicado pela Editora Zagodoni.
 
Na obra, a psicanalista defende que, com a perda de poder do pai na família, quem ganhou espaço foi a criança. “É no século XX, a partir da despatriarcalização familiar, que a criança passa a ocupar cada vez mais o papel de organizador”, afirma Marcia, que estuda o assunto desde 2006, quando escolheu o tema para sua tese de pós-doutorado.
 
Para ela, os pequenos tiranos são frutos não só da educação dada pelos pais hoje, mas também de um contexto social que coloca a criança como centro do mundo na família. A virada teria começado a partir do século XVIII, quando a mulher passou a representar um novo papel como mãe. O processo, que nasceu como uma campanha pela amamentação dos filhos pela progenitora (e não por uma ama de leite, como era comum), evoluiu para a exigência do cuidado e da dedicação aos filhos em tempo integral. “O século XIX é conhecido pelos historiadores como o ‘século da mãe’, quando se instituiu a imagem da ‘boa mãe’, que deixa a vida mundana para se dedicar aos filhos”, explica.
 
A partir daí, diz ela, a sociedade passou a ter um adulto, a mãe, designado para orbitar em torno da criança. “Isso é uma das grandes sementes do despotismo infantil”, analisa. Além disso, se antes os pais exigiam respeito e obediência, hoje preferem ser amados e aprovados pelas crianças – o que também contribui, ela diz, para a instituição da “pedocracia”.
 
As consequências dessa mudança vão além das birras. Na escola, o déspota mirim desafia os professores e recusa-se a seguir as regras da instituição. A situação é especialmente delicada em instituições particulares, apesar de Marcia defender que o conflito é comum em todas as classes sociais. “O aluno se tornou cliente na escola. Tudo isso desfavorece o professor, que seria o representante do adulto que educa na escola. Se os pais não têm poder dentro de casa, a criança buscará a mesma soberania na escola.
 
Professora de Artes na Educação Infantil em uma escola particular na região do ABC Paulista, Paula Aviles, 31 anos, conta que os conflitos com as crianças mandonas são comuns e começam cada vez mais cedo. “O que a gente percebe é que os pais têm pouco tempo para os filhos e compensam deixando a criança fazer o que quer”, opina. A professora conta o caso de um aluno de 2 anos de idade, agressivo, que destruiu o trabalho feito por outra docente durante um evento na escola com os pais. “A mãe disse que ele não poderia ser contrariado”, lembra. Já outro aluno, de 14 anos, recusava-se a assistir às aulas e ficava de costas para a professora. A justificativa era que ele “não gostava” da disciplina.
 
Os desmandos das crianças refletem-se até mesmo nos presentes que ganham dos pais. “A criança se sente com poder de decisão. Não é o pai que compra o presente, é ela quem decide o que quer. Elas não enxergam os pais como alguém que comanda ou orienta. Ela se vê como igual”, analisa a professora. Para a autora do livro, os efeitos acabam atingindo a própria criança. Em alguns casos, o mandão acaba discriminado no ambiente escolar. Em situações mais extremas, a própria saúde da criança pode estar em perigo. “Eu já vi crianças que precisavam fazer dieta por problemas de saúde e os pais não conseguiam restringir sua alimentação”, relata Marcia.
 
Para a orientadora educacional dos anos iniciais do Ensino Fundamental da Escola Stance Dual, Luciana Lapa, colocar limites e lidar com as frustrações invariavelmente sofridas pelas crianças ao longo da vida escolar têm sido grandes questões para os pais.  O problema se agrava, afirma, quando a criança sai da família, uma instituição privada, e vai para a escola. Ali, passa a fazer parte de um grupo e precisa lidar com a noção de direitos e deveres. “Muitas vezes a criança tem dificuldade de lidar com esses aspectos”, explica.
 
Mas por que é tão difícil colocar limites? Para Luciana, existe um desgaste das relações autoritárias entre pais e filhos, que estão sendo substituídas por modelos mais democráticos de relacionamento. Muitas vezes, porém, os pais passam a acreditar que impor limites significa ser autoritário, e abandonam o papel de estabelecer para a criança o que pode e o que não pode fazer. “A criança precisa de um norte, de saber até onde ela pode ir. Não ter isso pode gerar até insegurança”, afirma Luciana.
 
“A escola convive com os mesmos desafios postos na sociedade”, concorda Giselle Magnossão, diretora pedagógica do Colégio Albert Sabin. Na visão da educadora, vivemos uma crise de autoridade, de regras e de relações com o outro na sociedade, que acaba resvalando na escola. “Temos uma geração de pais que saiu do seu lugar. Não é mais preciso ser opressor para educar para o limite e para o respeito. Esse é o desafio de hoje.
 
As educadoras são unânimes ao apontar que escola e família precisam trabalhar juntas – e no longo prazo – para destronar o pequeno déspota. “Muitas vezes, a criança não tem consciência do que está fazendo. Para ela, aquilo não é errado, é como ela está acostumada a agir”, pondera Luciana Lapa.
Também é importante mostrar quem é o adulto da relação e deixar claro que ele não pode ser desrespeitado. “É importante trazer a família para a discussão”, sugere Giselle, que defende trabalhar a questão dos limites a partir da percepção do outro, em vez de optar por medidas restritivas ou punitivas. “O limite deve ser trabalhado a partir da perspectiva do respeito e da empatia”, conta.
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Polícia cerca manifestantes na Consolação durante ato contra reorganização escolar

 
Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO
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Em meio ao ato que pedia a revogação definitiva do projeto de reorganização escolar anunciado pelo governador Geraldo Alckmin, a PM (Polícia Militar) cercou os manifestantes na avenida Consolação na noite desta quarta-feira (9).
 
Bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo foram usadas para conter o grupo em meio aos carros que passavam pela via, uma das mais movimentadas da cidade. A reportagem do R7 viu uma das bombas atiradas pelos policiais atingir a parede de um prédio.
 
Uma frente de PMs vinha por trás dos manifestantes, pela avenida Consolação, enquanto outra se posicionou na esquina seguinte, não deixando nenhuma saída em meio à chuva de explosões e gás lacrimogênio. 
 
A confusão começou cerca de três horas após o início da manifestação na avenida Paulista. Por volta das 21h, o ato passava em frente à Secretaria Estadual da Educação, quando iniciou-se um confronto entre mascarados, que lançaram rojões contra a Tropa de Choque e alguns manifestantes, que revidaram as bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral com rojões. Durante o tumulto que se espalhou pela região, pelo menos 13 pessoas ficaram feridas — entre elas, oito PMs — e dez foram detidas. Três estudantes em fuga buscaram abrigo dentro de um teatro, que foi invadido pela PM.
 
Barricadas com lixo e fogo foram erguidas na tentativa de pedir o avanço dos policiais — a maioria, nas avenidas Ipiranga e São Luís. 
 
Na avenida São Luís, testemunhas relataram que um PM teria sacado um arma de fogo e disparado três vezes para cima. Entre os 10 presos, nove foram capturados na rua Itacolomi, próximo da rua da Consolação.
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A reportagem do R7 flagrou policiais militares disparando bombas em um grupo de cinco manifestantes que tentavam se esconder na entrada de um estacionamento na rua Peixoto Gomide, que dá acesso à avenida Paulista. Uma criança, de cerca de seis anos de idade, e duas senhoras moradoras da região reclamaram do ardor nos olhos e da dificuldade de respirar por conta do gás lacrimogênio lançado pela polícia.
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Diversos manifestantes utilizaram vinagre para tentar amenizar a ação das bombas de efeito moral.
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A Secretaria da Segurança Pública classificou como "absolutamente necessária a intervenção da PM" no ato, e chamou a "atitude de grupos de manifestantes" como "política e criminosa".
 
Pacífica
 
A manifestação começou pacífica no vão livre do Masp. Na avenida Paulista, o grupo decidiu manter as invasões dos colégios — segundo a pasta, 136 unidades estavam tomadas por alunos ontem; o movimento chegou a ocupar 196 escolas no Estado. O movimento seguiu da avenida Paulista para a 9 de Julho, passando pelas praças 14 Bis e da Bandeira, viadutos Maria Paula e do Chá, até chegar à praça da República.
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Ao longo do ato, grupos de black blocks atuaram formando cordões para auxiliar na organização do protesto, com o objetivo de impedir que os manifestantes seguissem por ruas que não faziam parte do trajeto. No percurso, o clima foi de protesto contra a política educacional de Alckmin — o governador pretendia fechar no próximo ano 93 escolas, transformar 754 em ciclos únicos e transferir 311 mil alunos, mas suspendeu a reorganização até janeiro para "dialogar" com pais e alunos. 
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Violência escolar e possibilidades de prevenção

 
Por Lúcio Alves de Barros*
 
A violência escolar, devido à sua peculiar invisibilidade em determinados tempos, poderia com poucas ou reduzidas ações chegar ao seu fim ou mesmo ao seu equilíbrio. Apesar de toda discussão em torno da democratização das instituições escolares – o que é até matéria constitucional e está presente na LDB –, fato é que estamos patinando em terreno movediço simplesmente por ignorarmos possibilidades que definitivamente ajudariam na solução do problema.
 
Uma das possibilidades que poderia fazer parte do cotidiano escolar é a designação de uma potente esfera de negociação de conflitos. Colocar os pares frente a frente ou mesmo professores e alunos para conversar sobre a temática é de crucial importância. A ação é barata: uma sala, uma pessoa que tenha autoridade simbólica em meio às partes e mesas redondas com cadeiras no intuito de fomentar o debate não em relação à ação de X, Y ou Z, mas sim sobre a conjuntura que levou à configuração da violência ou da incivilidade, como querem os estudiosos do assunto.
 
Outra boa possibilidade é a predição. Evitar o problema antes que ele aconteça não faz parte de nossa cultura. Os brasileiros são recalcitrantes às demandas de evitar o pior. Não por acaso, caem viadutos, encostas, telhados, temos enchentes e crises como a hídrica. Nas escolas não é diferente: salas desleixadas, quadros destruídos, áreas sujas e emporcalhadas, banheiros vergonhosos, muros pichados são amostras de ambientes que inegavelmente interferem na ecologia da violência. Quanto aos alunos, é possível a percepção no dia a dia do seu estresse, dos problemas domésticos que chegam à escola ou da necessidade de auxílio que, por natureza e em algum momento (crianças, adolescentes ou jovens), demandam. O mesmo pode-se dizer dos professores que, adoecidos e estressados, também andam necessitando de ajuda, sempre bem-vinda, seja da direção, seja das famílias dos estudantes.
 
A violência poderia ser diminuída ou exterminada também com a efetiva e verdadeira participação da família no cotidiano da escola. Especialmente em instituições públicas, as crianças e adolescentes raramente não são esquecidos pelos pais ou responsáveis que justificadamente – em sua grande maioria – precisam trabalhar. Todavia, o trabalho não pode e não deve impedir que os pais deem atenção aos filhos durante o cotidiano de suas tarefas escolares. Mais que isso; é imprescindível que saibam da realidade do filho em toda a sua condição como discente da instituição escolar. Geralmente os pais somente verificam notas e se apresentam quando as relações já estão mais do que tensas e fora dos limites aceitáveis da civilização. O engano reside nessa questão, pois pais avisados e armados vencem a guerra contra a violência com mais tranquilidade e assertividade. Além disso, distribuem a responsabilidade com os professores e ajudam a direção a tomar novas frentes em casos nos quais a escola e as famílias podem caminhar de mãos bem unidas.
 
Por último, vale frisar uma possibilidade que não é boa: “ligar para o 190”. Criminalizar e judicializar ações violentas de crianças e adolescentes em escolas constituem um retrocesso imenso. Primeiro porque a polícia não está – dentre várias ações – preparada para isso; segundo que a obrigação da solução de um problema na escola é dos atores que vivem o cotidiano escolar e que têm a consciência de como é o modus operandi institucional. Chamar a polícia tornou-se um golpe caro e sério nas organizações escolares, a ponto de escolas ficarem rotuladas de violentas e perigosas. Todos perdem o crédito: a escola, os professores, a direção e os estudantes. De tudo isso, nada como velhas falas e fórmulas em contextos minados, “menos polícia e mais negociação: bom para o aluno, ótimo para a escola”.
 
* Professor na Faculdade de Educação da UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais)
 
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sexta-feira, 13 de novembro de 2015

No ano passado, 554 mil crianças de 5 a 13 anos estavam trabalhando, diz IBGE

 
O País registrou um aumento no trabalho infantil em 2014, segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2014), divulgada nesta sexta-feira, pelo Instituto Brasileira de Geografia e Estatística (IBGE). O número de pessoas de 5 a 17 anos ocupadas cresceu 4,5%, o equivalente a 143,5 mil crianças e adolescentes a mais nessa condição. No ano passado, 554 mil crianças de 5 a 13 anos estavam trabalhando.
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Houve aumento no nível de ocupação em todas as faixas etárias e em todas as regiões do País. Na faixa etária de 5 a 9 anos de idade, o total de crianças ocupadas teve um salto de 15,5%, nove mil indivíduos a mais. Em 2014, o País já tinha 70 mil crianças dessa idade trabalhando. Entre 10 e 13 anos de idade, o total de crianças trabalhando aumentou 8,5%, para 484 mil pessoas, 38 mil crianças a mais nessa condição.
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"Os pequenininhos são muito ocupados em atividades com rendimentos menores", disse Maria Lucia Vieira, gerente da Pnad no IBGE.
Saiba mais
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A atividade agrícola concentrou 62,1% da população ocupada com idade entre 5 e 13 anos, mesma proporção registrada em 2013. IBGE não soube dizer por que houve aumento do número de crianças trabalhando. A gerente do instituto afirma que quem puxou a alta no trabalho infantil foi a faixa etária de 16 a 17 anos, que recebe rendimento maior e, em geral, vive em domicílios com rendimento mais alto. Na faixa etária de 16 e 17 anos, o total de ocupados aumentou 2 7%, o equivalente a 51 mil pessoas a mais, totalizando 1,926 milhão de pessoas. Dos 14 aos 15 anos, o número de ocupados cresceu 5,6%, para 852 mil trabalhadores, 45 mil indivíduos a mais.

O Sul registrou o mais alto nível da ocupação das pessoas de 5 a 17 anos (10,2%), seguido por Norte (9,2%), Nordeste (8,7%), Centro-Oeste (8,2%) e Sudeste (6,6%).
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Fonte: Estado de Minas (MG)