Mostrando postagens com marcador indisciplina. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador indisciplina. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Professor saudável é vantajoso para todos

.
Mariana Cruz
 
O trágico acidente com o Airbus A320 que partiu de Barcelona, na Espanha, com destino a Dusseldorf, na Alemanha, ocorrido em março último, foi causado pelo copiloto, que, segundo foi apurado, sofria de depressão e síndrome de burnout, que é definida como "um fenômeno psicossocial, caracterizado por esgotamento físico e mental intenso, que se desenvolve como resposta a pressões prolongadas que uma pessoa sofre a partir de fatores emocionais estressantes e interpessoais relacionados com o trabalho". Essa definição deixa claro por que tantos professores (e bancários, enfermeiros, médicos, policiais, agentes penitenciários, atendentes de telemarketing e outras profissões que exigem contato direto com as pessoas) são acometidos por ela.
 
No caso dos professores, a questão se intensifica, uma vez que tal contato se dá com muitas pessoas (alunos, diretores, pais de alunos, colegas de trabalho etc.), às vezes centenas delas em algumas horas. É só fazer os cálculos: um professor que dá aula diariamente para seis turmas de 35 alunos lida com nada menos com 210 alunos por dia. Além disso, há a pressão indireta: se o aluno não vai bem, o professor é, muitas vezes, tido como o culpado. Mesmo que o aluno não tenha o menor interesse pela matéria, dizem que o professor é quem não sabe torná-la interessante. Isso até pode ocorrer em determinados casos, mas não é regra. Muitas vezes é o aluno que não se identifica com aquele conteúdo. E, no caso de um aluno bagunceiro, indisciplinado, quem lida diretamente com ele é o professor. Para tantas demandas, haja estofo psicológico.
 
Quando se trata de uma instituição privada, o aluno é visto como "cliente", e, como diz o ditado, "o cliente tem sempre razão". Quando se trata de escola pública, apesar de o aluno ser também um cliente, não é tratado como tal. Nesse caso, quem as direções buscam agradar são as secretarias de Educação. O irônico é que, se os resultados da escola forem positivos, os louros vão para os diretores, mas se for um fracasso a culpa é do professor.
 
Mas nem tudo é negativo na vida do docente. A lida com crianças e jovens é geralmente muito rica, além de ser motivo de orgulho para qualquer professor ver o aluno aprender, se transformar, conhecer coisas novas, ir construindo um corpus de pensamento próprio. Isso não tem preço.
 
A despeito dessas dificuldades, o grande problema do magistério talvez seja o baixo salário, que obriga o professor a trabalhar em diversos lugares. Quem não trabalha com educação pode considerar que um docente que tenha uma matrícula de 30 horas semanais trabalha pouco. De fato, comparado com os outros trabalhos que são de no mínimo 40 horas semanais, parece vantajoso. Acontece que nessa comparação de carga horária se está levando em conta apenas a quantidade, e não a qualidade. Diferente de muitos trabalhos, o tempo que o professor está em sala ele não pode fazer nada que não seja dar aula. Não vai ao banheiro, não come, não fala ao telefone, não checa os e-mails, não sai para tomar um ar, não pode relaxar por cinco minutos. Trata-se de um trabalho físico e vocal árduo, no qual há que se ter domínio da turma, certa moral para silenciar aqueles alunos que estão papeando alto, bom jogo de cintura para prender a atenção da turma, habilidade para fazer com que entendam o que está sendo dito e, quiçá, estimular os estudantes a participar e interagir.
 
Infelizmente não há receita pronta sobre como lidar com uma turma de 40 alunos, até porque são várias turmas por dia, cada uma com um perfil. Como fazer os alunos ficarem interessados full time? Como lidar com eventuais conflitos que venham a surgir? Tais demandas, somadas ao excesso de aulas que o professor é levado a ministrar a fim de obter melhoria salarial, podem vir a comprometer a qualidade das aulas, da didática, dos conteúdos, da atenção que deveria ser dispensada a cada aluno. Além disso, dificultam conhecer cada um deles pelo nome e saber de suas dificuldades e talentos.
 
Não precisa ser gênio para concluir que um professor com poucas turmas pode dedicar mais tempo na elaboração e correção de trabalhos, solicitar tarefas mais profundas e elaboradas, enfim, explorar mais as potencialidades de cada aluno. Infelizmente, isso é uma utopia para alguém que dá aula das sete da manhã às seis da tarde (muitos professores estendem até o horário noturno). Trata-se de uma rotina exaustiva, tanto assim que muitas vezes já na hora do almoço alguns professores estão roucos e exaustos.
 
Talvez o ideal para o professor fosse cumprir uma carga mínima de horas semanais (quem sabe  uma matricula de 16 horas) e no tempo restante exercer outra atividade que não tivesse a ver com a docência. Algo em que ele não tivesse que lidar com tantas pessoas, não tivesse que gastar tanto a voz, resolver conflitos, explicar incontáveis vezes a mesma coisa. Algo relacionado à pesquisa, à teoria, enfim alguma coisa que o tirasse dessa obrigação de matar um leão por dia.
 
Esse excesso de aulas muitas vezes faz o professor adoecer, ficar semanas de licença médica afastado do trabalho; sendo assim, não é algo bom para a instituição de ensino, nem para o governo, nem para o país.
 
Outro dia fui parada em uma blitz e, enquanto aguardava a checagem de meus documentos, comecei a conversar com um motorista de uma companhia de seguros de automóveis. Percebi, ao ver a forma como a empresa dele agia, como é obtusa essa lógica de explorar o professor a ponto de fazê-lo adoecer. Explico: a tal companhia enviava um motorista gratuitamente para buscar pessoas que vão para a balada de carro, consomem álcool e depois não podem voltar dirigindo o veículo. Achei a mordomia um tanto exagerada e perguntei ao moço se isso não acarretava prejuízo para a seguradora. Ele disse-me que, ao contrário, a empresa ganhava duas vezes: além de atrair mais clientes com tal cortesia, era muito mais econômico para ela fazer isso do que arcar com possíveis acidentes em que uma pessoa alcoolizada pudesse se envolver. Assim deveriam pensar os governantes sobre seus docentes: professores ganhando pouco e com excesso de trabalho adoecem. É muito melhor termos professores saudáveis, dispostos e estimulados; mas para isso é preciso lhes dar melhores condições salariais e trabalhistas.
 
Se até uma empresa de seguros cujo interesse maior é o lucro conseguiu perceber isso, como nossos governantes não percebem?
 
Publicado em
 
Fonte: Revista Educação Pública - http://educacaopublica.cederj.edu.br/revista/cultura/professor-saudavel-e-vantajoso-para-todos

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Alunos promovem quebra-quebra em escola de Goiás

RIO - Um grupo de alunos da escola Caic Tancredo de Almeida Neves, em Goiás, realizou um quebra-quebra no colégio, na última sexta-feira. A ação dos jovens foi filmada e divulgada na internet. De acordo com a secretaria municipal de Valparaíso de Goiás, os estudantes que participaram do motim já estão sendo identificados e “representam uma minoria entre os quase 600 alunos de 6º ao 9º ano que estudam no período vespertino”.
.
Durante a ação, o grupo revirou carteiras escolares e quebrou janelas e portas. A secretaria informou que todos os objetos danificados já começaram a ser substituídos. Segundo relatos, o motivo da ira dos alunos seria a postura mais rígida da nova direção.
.
O governo local admitiu que a escola enfrenta “historicamente” problemas de indisciplina e garantiu que a questão vem sendo tratada com “projetos que envolvem o fortalecimento do conceito de cidadania e maior participação dos pais e da sociedade no ambiente escolar”.
.
A secretaria de educação informou ainda que irá estender o Programa Educacional de Resistência às Drogas (Proerd), desenvolvido pela Polícia Militar, aos estudantes do 6º ao 9º anos. Atualmente, o projeto, que é visto pelo órgão como uma das ações de fortalecimento da cidadania, é feito apenas com os alunos de 1º a 5º ano.
.
Fonte: O Globo (29/04/2015)

domingo, 13 de junho de 2010

INDISCIPLINA EM SALA DE AULA: aluno vilão ou refém “do sistema”?

Por Sarah Aline*

Indisciplina: uma palavra que amedronta o corpo docente. Comportamentos inesperados e inimagináveis, posturas ríspidas e agressivas, indiferença diante da autoridade do professor. Entre outras, estamos falando de relações dentro ou fora da sala de aula, que leva muitos professores a desistirem de sua carreira. A pergunta: De quem é a culpa? Possíveis respostas: “do aluno"; “do professor”, “da escola”, “da família” ou “do sistema”. Enfim, colocar a culpa ou inserir mecanismos para justificar comportamentos, não é o foco do texto em questão. Possíveis causas e métodos auxiliares ao professor são meios a serem observados com cautela, a fim de tratar seres humanos, com o máximo de humanidade.

Nós professores, em nosso ofício, não lidamos com máquinas. Parece óbvio, mas muitos “profissionais” da área agem como se ignorassem esse “detalhe”. Não podemos processar dados no cérebro, ou incutir um comando a ser manipulado por controle remoto. Assim como o alfaiate trata a seda, o pintor a tela, o poeta as palavras e sentimentos, assim devemos tratar nossos alunos. Somos copeiros cuidando de taças de cristal; devemos poli-las sem quebrá-las. Na presente metáfora, polir não é saturar o aluno de conteúdo. Estamos formando seres humanos nos bastidores de um palco nada fácil, o palco da vida. E analisando de forma pragmática, não estamos nos bastidores. Entramos com tudo (ou com nada) em cena, e procurando ou não uma forma de entreter os alunos temos múltiplas funções: ensinar o conteúdo, lidar com temperamentos e humores diferentes, seguir regras de instituições e “gingar” com o tempo que corre sem esperar o silêncio ou a participação necessária para bom rendimento da aula.

“Reféns dos alunos”, “Vários CONTRA um”, “Com ou sem colaboração do corpo discente eu recebo meu salário...”, entre outras frases e expressões, é o que alguns professores dizem diante da indisciplina. A sala de aula vira um campo de batalha, onde o professor não tem direito à trincheira ou qualquer tipo de proteção. No sentido literal, o professor é aquele “soldado” solitário na infantaria. A guerra que pode ser desencadeada por um pedido de silêncio é o retrato da falta de autoridade do docente, o qual em alguns casos usa o autoritarismo como saída ou levanta a bandeira branca aos que não desejam ouvi-lo e se torna um conformado que não diversifica nos métodos e/ou trabalha desmotivado. Mas surge outra pergunta: “Não querem os alunos ouvir?” Difícil a resposta, pois acordar cedo, ou se encaminhar para as aulas em outros horários, deslocar-se de casa muitas vezes em vão, não parece uma atitude muito inteligente para – pelo menos – os que desejam estudar. Obviamente, outros fatores fazem o aluno sair de casa e ir à escola. A casa, na maioria das vezes, apresenta-se como um lugar de clima desagradável, a mãe obriga o filho a estudar ou mesmo trabalhar em busca do conhecimento. Infelizmente, são muitos - e hoje em dia não há mais espanto - os alunos que vão à escola com o único objetivo de se alimentar ou manter uma “ajuda” governamental. Diante de não poucos problemas sociais, o professor não deve se prender apenas ao conteúdo. Claro, não deve pensar que irá mudar o mundo e esquecer do que é cobrado em vestibulares e em outras situações, mas deve buscar o equilíbrio entre conteúdo e diálogo, no sentido de buscar as origens da falta de disciplina.

A indisciplina pode ser causada por problemas familiares, de saúde, afetivos em todos os sentidos possíveis, sociais, e ouso dizer, na maioria dos casos, pala falta de interesse do professor e por falta de conhecimento ou reconhecimento de seu papel social. Um educador é, acima de tudo, um influenciador que deve ter ciência de sua importância para a vida de seus alunos. Em famílias de relacionamento baseado no diálogo, a primeira coisa que o aluno conta para os pais depois do primeiro dia de aula é a recepção do professor. Claro, o docente não é o único a contribuir para o afloramento da indisciplina. A escola, com regras flexíveis e inadequadas às diversas realidades, ou a família mal estruturada são fatores relevantes. Porém, a apatia ou a euforia de uma sala de aula é o resultado dos métodos e práticas executados pelo professor.

Números ou códigos da lista de chamada não são meios de identificar seres humanos que vivem suas idiossincrasias e peculiaridades. Resumi-los numericamente ou em grupo com juízos de valores pré-estabelecidos não é humano, é mecânico e sistematizado. Devemos cuidar das inteligências e das boas qualidades e defeitos de cada um. O reconhecimento dentro e fora da sala de aula, o olhar nos olhos, sem gritos de autoritarismo, demonstrar a autoridade que possuímos, deixando claro que, liberdade é diferente de libertinagem é de capital importância. Porém, se for necessário alterar a voz ou estufar o peito não devemos nos abster de dar um banho de realidade através de expressões peculiares a cada professor.

Mais do que nunca se faz necessário ouvir e ganhar o respeito do aluno devido ao bom trabalho, tanto no que se refere ao conteúdo, quanto nas relações sociais cotidianas. Diversificar, levar ânimo e a esperança sempre banhada na realidade é bom, principalmente para que as situações posteriores ao incentivo não os surpreendam negativamente. O primeiro dia de aula é crucial: não para imposições, mas para acordos que serão executados e respeitados durante as aulas. Devemos ser firmes para ganhar e manter o respeito, e, ao mesmo tempo flexíveis e sensíveis às mudanças para melhorar o processo de ensino/aprendizagem. Devemos manter a persistência, dando o melhor de nós, sem, contudo, perder a humanidade. Acima de todas as coisas devemos fazer nosso trabalho semeando e o fazendo com amor, pois os frutos serão correspondentes às sementes.

Finalmente, é preciso saber ir além do conteúdo, ter o equilíbrio necessário para falar e agir no meio social que vai além do currículo “conteudista”. Ser humano e prático com as coisas da vida na sala de aula ajuda e, certamente, a educação será mais ampla em termos sociais e menos passarela de desfile de policiais ou palco de guerras de efeitos visíveis ou invisíveis como aparentemente parece ser atualmente.


* Professora de informática e estudante do curso de história da Faculdade ASA de Brumadinho; Jun. 2010.