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segunda-feira, 25 de maio de 2015

Oliver Sacks: “Minha própria vida”

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Este texto foi publicado originalmente no New York Times em 19 de fevereiro de 2015. A tradução é da Karin Hueck.
 
Há um mês, eu sentia que estava em boas condições de saúde, robusto até. Aos 81 anos, ainda nado uma milha por dia. Mas a minha sorte acabou – há algumas semanas, descobri que tenho diversas metástases no fígado. Nove anos atrás, encontraram um tumor raro no meu olho, um melanoma ocular. Apesar da radiação e os lasers que removeram o tumor terem me deixado cego deste olho, apenas em casos raríssimos esse tipo de câncer entra em metástase. Faço parte dos 2% azarados.
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Sinto-me grato por ter recebido nove anos de boa saúde e produtividade desde o diagnóstico original, mas agora estou cara a cara com a morte. O câncer ocupa um terço do meu fígado e, apesar de ser possível desacelerar seu avanço, esse tipo específico não pode ser destruído.
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Depende de mim agora escolher como levar os meses que me restam. Tenho de viver da maneira mais rica, profunda e produtiva que conseguir. Nisso, sou encorajado pelas palavras de um dos meus filósofos favoritos, David Hume, que, ao saber que estava terminalmente doente aos 65 anos, escreveu uma curta autobiografia em um único dia de abril de 1776. Ele chamou-a de “Minha Própria Vida”.
 
“Estou agora com uma rápida deterioração. Sofro muito pouca dor com a minha doença; e, o que é mais estranho, nunca sofri um abatimento de ânimo. Possuo o mesmo ardor para o estudo, e a mesma alegre companhia de sempre.”
 
Tive sorte de passar dos oitenta anos. E os 15 anos que me foram dados além da idade de Hume foram igualmente ricos em trabalho e amor. Nesse tempo, publiquei cinco livros e completei uma autobiografia (um pouco mais longa do que as poucas páginas de Hume) que será publicada nesta primavera; tenho diversos outros livros quase terminados.
 
Hume continua: “Eu sou… um homem de disposição moderada, de temperamento controlado, de um humor alegre, social e aberto, afeito a relacionamentos, mas muito pouco propenso a inimizades, e de grande moderação em todas as minhas paixões.”
 
Oliver-Sacks-3Aqui eu me distancio de Hume. Apesar de desfrutar de relações amorosas e amizades e não ter verdadeiros inimigos, eu não posso dizer (e ninguém que me conhece diria) que sou um homem de disposições moderadas. Pelo contrário, sou um homem de disposições veementes, com entusiasmos violentos e extrema imoderação em minhas paixões.
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E ainda assim, uma linha do ensaio de Hume me toca como especialmente verdadeira: “É difícil”, ele escreveu, “estar mais separado da vida do que eu estou no presente.”
 
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Nos últimos dias, consegui ver a minha vida como a partir de uma grande altura, como um tipo de paisagem, e com uma sensação cada vez mais profunda de conexão entre todas suas partes. Isso não quer dizer que terminei de viver.
 
Pelo contrário, eu me sinto intensamente vivo, e quero e espero, nesse tempo que me resta, aprofundar minhas amizades, dizer adeus àqueles que amo, escrever mais, viajar se eu tiver a força, e alcançar novos níveis de entendimento e discernimento.
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Isso vai envolver audácia, claridade e, dizendo sinceramente: tentar passar as coisas a limpo com o mundo. Mas vai haver tempo, também, para um pouco de diversão (e até um pouco de tolice).
 
Uncle-Tungsten-1Sinto um repentino foco e perspectiva nova. Não há tempo para nada que não seja essencial. Preciso focar em mim mesmo, no meu trabalho e nos meus amigos. Não devo mais assistir ao telejornal toda noite. Não posso mais prestar atenção à política ou discussões sobre o aquecimento global.
 
6_seeing_low_res-1An-Anthropologist-on-Mars-1Isso não é indiferença, mas desprendimento – eu ainda me importo profundamente com o Oriente Médio, com o aquecimento global, com a crescente desigualdade social, mas isso não é mais assunto meu; pertence ao futuro. Alegro-me quando encontro jovens talentosos – até mesmo aquele que me fez a biópsia e chegou ao diagnóstico de minha metástase. Sinto que o futuro está em boas mãos.
 
Nos últimos dez anos mais ou menos, tenho ficado cada vez mais consciente das mortes dos meus contemporâneos. Minha geração está de saída, e sinto cada morte como uma ruptura, como se dilacerasse um pedaço de mim mesmo. Não vai haver ninguém igual a nós quando partirmos, assim como não há ninguém igual a nenhuma outra pessoa. Quando as pessoas morrem, não podem ser substituídas. Elas deixam buracos que não podem ser preenchidos, porque é o destino – o destino genético e neural – de cada ser humano ser um indivíduo único, achar seu próprio caminho, viver sua própria vida, morrer sua própria morte.
 
Não posso fingir que não estou com medo. Mas meu sentimento predominante é de gratidão. Amei e fui amado; recebi muito e dei algo em troca; li, viajei, pensei e escrevi. Tive uma relação com o mundo, a relação especial do escritor e leitor.
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Acima de tudo, fui um ser sensível, um animal pensante nesse planeta maravilhoso e isso, por si só, tem sido um enorme privilégio e aventura.
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Oliver Sacks é neurologista e escritor; autor de diversos best-sellers, como “Um antropólogo em Marte” e “O Homem que confundiu sua mulher com um chapéu”
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domingo, 14 de julho de 2013

"As vantagens de ser invisível" (indicação)

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Por Elen Martins
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Minha opinião sobre "As Vantagens de ser Invisível"
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1- Demorei a ver, mas deixei reservado por causa dos trabalhos anteriores dos atores principais que gostei muito como “Efeito Borboleta, Precisamos falar sobre Kevin e Harry Potter”.
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Não achei pesado, não achei que seja um filme de romance como muitas pessoas são induzidas a ver e depois não gostam do filme. É um filme mais sobre amizade e tem uma... forma mais leve para dar início a grandes discussões em grupo sobre a fase de transição da vida colegial para universitária. Pode ser apresentada de pais para filhos, de professores para alunos ou mesmo em grupo de amigos. Com seus alunos, não sei qual matéria seria mais prudente apresentar... Porque este filme mostra diversos problemas que qualquer jovem pode passar nesta fase: bullying, homossexualismo, aborto, abuso sexual,suicídio, interação social, entre outros.
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2- Séria ótimo se aqui no Brasil as nossas escolas pudessem disponibilizar “uma cópia de um livro literário” para leitura dos alunos, eu já teria outra visão do mundo nesta faixa etária.Grandes clássicos.Como sempre vejo em muito s filmes.
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3- Fui até “a baixo e além” hahaha jurando que já tinham postado sobre este filme e desisti de procurar e fazer uma postagem nova, apenas foi bom porque desenterrei alguns postes antigos interessantes e vi todas às criticas possível de outros.
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4- Qualquer filme que tenha músicas do Bowie e Smith são inspiradores.
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terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Como se fossem morrer

Pablo Capistrano (Escritor, professor de filosofia do IFRN)

Sábado passado as pessoas andavam pelas ruas de Natal como se fossem morrer. Os carros zuniam seus motores poluentes, os ônibus lotados freavam bruscamente nas paradas entupidas, os salões de beleza congestionavam, os corredores dos shopping centers latejavam de pessoas percorrendo suas veredas coloridas com montes e montes de sacolas, como se aquele fosse o último presente, a derradeira bijuteria, a blusa definitiva.

Estamos perto do fim do ano, na semana da festa do Sol Invicto (que os cristãos costumam chamar de Natal), e as pessoas estão correndo como se estivessem tentando se esconder do tempo. Como se tivessem a morte bafejando no cangote.

Nosso tempo é um tempo de fins, de interrupções. Quando o ano começa definitivamente seu crepúsculo, as pessoas mergulham nessa euforia histérica que mistura medo, culpa e esperança em uma mesma bipolaridade urbana.

Sente-se no ar o clima desses meses, apimentado pelo vento leste do verão que chega matando a fúria do mar e lambuzando o céu de Natal de um azul tão definitivo que dói no coração.

Nos tempos velhos, anteriores ao nascimento de Jesus, filho de José, na terra de Israel, todos os povos agrários tinham seus cultos de morte e renascimento. Naquelas eras, o tempo não acabava. Não havia um começo de tudo, e por isso não poderia também haver um fim. Os mitos gregos ensinavam que tudo sempre havia existido e que por isso nada acabaria. Dentre os grandes mistérios da religião pagã, nos cultos da fertilidade e na magia da grande mãe, três se destacavam: o culto a Deméter, os ritos em homenagem a Perséfone e os mistérios de Dionísio.

Durante muito tempo pensou-se (devido às leituras popularizadas por Nietzsche) que Dionísio era uma divindade oriental, exótica, vinda de um ponto impreciso a leste do planalto da Anatólia, cujo culto deveria ter sido introduzido na Grécia por volta do século V antes da era comum. Hoje se sabe que seu culto é muito, muito antigo e que remonta aos fundamentos mais arcaicos da velha sociedade matriarcal da aurora da humanidade.

O vinho, “a porção ardente da mãe negra”, de acordo com Eurípedes, ou a “mãe selvagem” de acordo com Ésquilo, era seu símbolo mais forte. Mas não era o único. A hera selvagem que brotava do solo também representava esse deus agrário que entusiasmava os adeptos de seus cultos. O entusiasmo (enthousiasmos em grego – “ter o deus dentro”) era o presente do vinho daquele deus possuído, louco de uma energia poderosa que unia homens e mundo em um ciclo eterno de morte e renascimento. Eram desses mistérios que os velhos gregos aprendiam sobre o destino da alma depois da morte e sobre o modo como a natureza regulava seus ciclos. O mistério da vida que gera mais vida, o segredo primitivo da morte que cria mais vida.

Hoje perdemos contato com esses antigos mistérios (ressalvadas algumas raríssimas exceções) e até a missa, esse profundo ritual de morte e renascimento que mistura a ceia do Pessach com os cultos de fertilidade dos velhos deuses, em que o sangue e a carne de Deus são consumidos como na Antiguidade pagã se consumia o vinho e a carne de Dionísio, anda dessignificada no coração de muitos cristãos.

Talvez por isso, quando se aproxima o fim de ano, nós, órfãos do sagrado, extirpados do contato com as velhas forças da terra e com as antigas e misteriosas práticas que ligavam os homens aos céus no tempo da morte, experimentamos a náusea de nosso próprio fim e respondemos à demanda de nosso renascimento com o único poder que conhecemos: a irredutível e magnética força de nossos cartões de crédito.

Publicado em 04/01/2011 - In: http://www.educacaopublica.rj.gov.br/cultura/prosaepoesia/0276.html

domingo, 31 de outubro de 2010

NOTÍCIAS...

Comunidade do orkut incentivava a agressão

"Rodeio de gordas" dos jogos da Unesp era 'ensinado' e estimulado na internet

por José Maria Tomazela e Cláudio Dias, Especial "O Estado de S. Paulo" - 28 out. 2010

Uma comunidade do site de relacionamentos Orkut chamada Rodeio da Gorda reúne 21 integrantes desde 27 de janeiro de 2006. O grupo se dedica a agarrar e montar em cima de garotas obesas em festas universitárias. Na página, retirada da internet após a divulgação do caso, os estudantes explicam a “brincadeira que virou mania no Interunesp de Araraquara 2010".

O líder da comunidade, identificado como Tiago Kodic, ensina: “Quando você estiver numa balada/festa/baile com seus amigos e já tiver tomado algumas/várias, ache a mina mais gorda da balada, daí um de vocês chega nela por trás e coloca os braços em volta dela. Então sussurre no ouvido dela ‘você é a coisa mais gorda que eu já vi’ e vê quanto tempo você consegue segurara!”.

Nas regras, os agressores estabelecem que “todo peão deve permanecer oito segundos segurando a gorda”. O tempo é reduzido para cinco segundos se ele “segurar com uma mão só”. Um parágrafo fala sobre o corpo da vítima, que deve ser “bem grande”, e destaca a premiação a ser dada à “gorda bandida” – possível referência a um touro difícil de ser montado –, um sanduíche gigante. As “gordas bandidas”, explica a comunidade, são mais valiosas. “Quanto maior o número de coices despejados, mais pontos.” O internauta Daniel comenta: “Da primeira montaria eu me lembro como se fosse ontem, como eu era inexperiente e ela era uma bandida, eu fiquei apenas três segundos.” Outro, identificado como Goyano, anuncia o “World Chicks Championship Rodeo” para 2011. “Contamos com a presença de todos os bravos toureiros.”

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

VALORIZAÇÃO DA VIDA?

Estatísticas indicam uma linha paralela entre maior número de jovens na Escola e queda da violência

GILBERTO DIMENSTEIN

DESDE QUE comecei a investigar, no fim da década de 1980, as mais diversas formas de agressão contra crianças e adolescentes no Brasil, constatei que a origem da violência estava na família. Ou na falta dela. Nas entrevistas, surgiam, invariavelmente, histórias de maus-tratos em casa. Percebi que, embora nem todas as vítimas se tornassem pessoas violentas, os violentos tinham sofrido algum trauma doméstico, esta uma das causas do problema.

Tempos depois, tomei conhecimento de imagens captadas por ressonância magnética que mostravam que os maus-tratos na infância geram uma alteração cerebral e podem explicar atitudes antissociais. Pesquisas realizadas nos Estados Unidos revelam, com nitidez, como crianças que recebem bom atendimento desde o berço e que são estimuladas pelos pais e, depois, na pré-escolasão mais propícias a um bom desempenho Escolar, têm maior chance de empregabilidade e menor risco de envolvimento em problemas com a polícia e a Justiça.

É por esse prisma que encaro o debate sobre aborto no Brasil, tratado agora com um tom histericamente eleitoral. Causaram polêmica em escala mundial estatísticas divulgadas por economistas, segundo as quais os crimes violentos nos Estados Unidos caíram mais nas cidades em que o aborto é permitido. Por mais terrível que seja esse dado, não me espantei: deixaram de nascer crianças rejeitadas e desrespeitadas pelos pais. Misturem-se aí a baixa Escolaridade, a dificuldade de conseguir um emprego, comunidades infestadas de criminosos tidos como referência a ser admirada, a falta de lazer e o acesso fácil a drogas.

Nada disso significa a defesa do aborto para evitar o crime, mas apenas a constatação de que o poder público deveria ajudar as mulheres a realizar planejamento familiar. O acesso a métodos contraceptivos é também uma questão de Educação. O planejamento familiar no país cresceu. Poderia ter crescido mais rapidamente se não fosse a força das religiões -tão grande que, como se vê nestas eleições, José Serra e Dilma Rousseff se veem obrigados, contrariando suas crenças íntimas, a pôr a fé acima da saúde pública.

Somente em 1994 se regulamentou o aborto nos casos de estupro e risco de morte das mães, uma lei aprovada em 1940 (sim, 1940!). Grupos religiosos, conectados com os governos, atacaram a distribuição de pílula anticoncepcional, de camisinhas e de pílulas do dia seguinte. Condenaram até mesmo programas de Educação sexual nas Escolas, apontados como imorais. Na semana passada, o Vaticano atacou o Prêmio Nobel concedido ao criador da fertilização in vitro.

Isso retardou ou impediu o desenvolvimento desses programas. É uma situação terrível. A mulher não consegue se proteger por falta de apoio do poder público e/ ou desinformação. Engravida contra a própria vontade. É condenada a fazer um aborto nas piores situações possíveis, correndo riscos, por falta de um sistema digno de saúde. Depois, ainda é apontada como criminosa e pecadora. Uma das principais causas da evasão Escolar é a gravidez na adolescência.

Não quero ofender ninguém, mas isso me parece fazer maldades em nome de Deus. Experiências isoladas vêm mostrando, no Brasil, como aliar informação a acesso a métodos contraceptivos tem funcionado nas comunidades mais pobres, ajudando as mulheres a planejar o tamanho de sua família, a manter-se nos estudos e a obter melhores empregos. Depois, tendem a ser melhores mães. Até porque são mais educadas.

Essas ações são resultado de gente que teve coragem de enfrentar os preconceitos e a pancadaria. Assim, hoje se pode pegar de graça pílula do dia seguinte ou camisinha numa estação do metrô ou num posto de saúde em São Paulo. Lembro, por sinal, que estatísticas em bairros da cidade de São Paulo indicam uma linha paralela entre maior número de jovens nas Escolas e queda da violência.

Penso que isso é valorizar a vida, considerando-a uma energia divina de criação.

PS- Para fazer justiça: nas minhas andanças pelos lugares mais violentos, investigando a situação das crianças e dos adolescentes, as pessoas mais despojadas que encontrei foram alguns padres, freiras e pastores. Foram lições inesquecíveis. Apesar de discordar de suas posições, prefiro a honestidade deles à encenação cristã de José Serra e Dilma Rousseff.

Fonte: Folha de S.Paulo (SP)

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

NOTÍCIAS...

Pais e escola trocam acusações após bullying

Carolina Stanisci - Estadão.edu, 20 set. 2010

Ter as bochechas apertadas, ser beliscado e até virar alvo de gozação de toda a turma, até certo ponto, fazem parte dos percalços da convivência escolar. Mas e se a “brincadeira” é colocar a cabeça dentro do vaso sanitário e enfiar a língua dentro d’água, como L., de 9 anos, fez a pedido de alguns colegas?

Pais e direção não souberam como agir no caso do aluno do 4.º ano do ensino fundamental da tradicional escola particular Ofélia Fonseca, no bairro de Higienópolis, em São Paulo. A história de L., assediado por colegas há um ano, provocou um jogo de empurra de responsabilidade entre família e escola. Quando soube do episódio, a mãe de L., a jornalista Ana Paula Feitosa, de 38 anos, ficou muito nervosa e também incomodada com a falta de ação da escola, onde seu ex-marido havia estudado. “Fiquei sozinha nessa história. Achei um descaso”, conta ela, que diz ter procurado o colégio por várias vezes no último ano para tentar dar fim às chacotas contra o filho.

O dono do Ofélia Fonseca, Sergio Brandão, afirma que foram “tomadas as medidas” e diz estar “tristíssimo” com o caso, que culminou na transferência de L. e na expulsão de outro colega, supostamente um dos algozes. “Foi como perder um filho.” Para Brandão, a fragmentação das famílias, com pais ausentes, atrapalha o ambiente escolar. “Às vezes, as crianças chegam chateadas e têm atitudes imprevisíveis. Elas não dão problema. Os adultos, sim.”

A história de L. não é um caso isolado de bullying em escola particular. Com medo da repercussão negativa, os colégios em geral abafam os episódios. Os pais, preocupados com o estigma, escondem a situação. Ana Paula preferiu inverter a lógica do silêncio. Para se livrar da angústia que não passava, decidiu contar a história de seu filho. “Ele sempre foi fechadinho, imaturo e quietinho; é filho único. Mesmo assim, nunca achei que fosse acontecer com ele. Agora, sempre alguém vem com um caso para me contar.” Para especialistas na área, a jornalista e o pai do menino, o técnico em eletrônica Marcelo Cortelazo, de 37 anos, agiram corretamente ao dividir a experiência com outras pessoas. A psicóloga Lídia Webber, do Núcleo de Análise de Comportamento do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Paraná, diz que não é possível esconder esse tipo de situação.

A psicóloga considera saudável que o tema seja amplamente discutido pela sociedade. As escolas, tanto particulares como públicas, diz Lídia, não têm conseguido adotar estratégias eficientes para dar conta da violência entre as crianças e adolescentes – e ela tem se intensificado.

“Lá fora, o bullying é tratado na base da tolerância zero”, diz Lídia. E isso não significa que as crianças sejam punidas pelo Estado. Ao contrário, ao menor sinal de que algo anda mal, providências intensas são tomadas, envolvendo pais e direção. “O menino que faz o bullying tem de sofrer consequências, dentro da escola”, diz.

Para Miriam Abramovay, coordenadora de pesquisas da Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla), o acompanhamento escolar cuidadoso e constante é necessário. No caso do Ofélia Fonseca, as medidas para sanar a situação de L., como conversas entre as crianças, para que elas se conscientizassem sobre o assunto, foram tomadas. “A escola, muitas vezes, faz alguma coisa. Mas essas ações precisam de tempo para amadurecer”, diz Cléo Fante, pedagoga da ONG Plan.

Legislação. Na opinião de alguns especialistas, parte da confusão sobre o que fazer ao se deparar com um caso de bullying na escola particular ocorre porque ninguém tem muito claro como agir. Há lacunas na legislação e faltam políticas específicas. “Não existe na esfera federal uma política pública sobre isso”, diz Cléo. Projetos de lei tramitam no Congresso, tanto no sentido de prevenir a violência na escola como para criminalizar condutas. Um deles foi aprovado em julho pela Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados e alteraria a Lei de Diretrizes e Bases (LDB). A proposta tem o objetivo de acabar com a “exclusão do aluno do grupo social, a injúria, calúnia e difamação, a perseguição, discriminação e uso de sites e redes sociais para incitar violência”. No Estado de São Paulo também existe um projeto de lei. Em Santa Catarina e Rio Grande do Sul foram aprovadas normas nesse sentido. Políticas públicas também foram adotadas pela Secretaria Estadual de Educação paulista, como o Prevenção Também se Ensina.

“Os programas têm diminuído muito os casos de bullying”, diz Jurema Reis Corrêa Panza, coordenadora do departamento de educação preventiva da Fundação para o Desenvolvimento da Educação, ligada à secretaria. Nem todos, porém, apostam em políticas públicas antibullying, como Arthur Fonseca Filho, do Conselho Estadual de Educação de São Paulo. “O melhor é que cada escola resolva a situação”, afirma.

Depoimento - ANA PAULA FEITOSA (MÃE DE VÍTIMA DE BULLYING)

“Ele me ligou na quinta-feira (há duas semanas) e contou que tinha feito uma brincadeira ‘verdade ou desafio’ e teve de lamber a privada. Eu perguntei a ele por que fez isso e ele disse: ‘Mãe, você não está entendendo, eles iam me fazer dançar a dança da galinha.’ Gritei tanto ao telefone, não acreditei e chorei muito.”

Definição do termo - ‘Bullying’ é empregado para designar a agressão física ou psicológica entre colegas, que ocorre repetidas vezes, sem motivação concreta.

Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,pais-e-escola-trocam-acusacoes-apos-bullying,612512,0.htm