terça-feira, 30 de novembro de 2010

NOTÍCIAS...

Escolas do Complexo do Alemão e da Vila Cruzeiro reabrem nesta terça-feira (30)

Globo.com, 30 nov. 2010

RIO - As 31 escolas municipais e creches da região do Complexo do Alemão - que estavam fechadas desde quinta-feira devido a guerra conta o tráfico da região - voltaram a funcionar nesta terça-feira (30). O reinício das aulas foi definido nesta segunda, seguindo as orientações da Secretaria de Segurança do Estado e após avaliar as condições estruturais das unidades escolares. Já a rede estadual de ensino ainda permanece com duas escolas fechadas. São elas: Caic Theóphilo de Souza Pinto, que fica dentro da comunidade, e CE Jornalista Tim Lopes, que será inaugurado apenas em 2011 e estava aberto exclusivamente para realização de matrículas.

Em nota oficial, a Secretaria municipal de Educação informou que a partir desta semana será iniciado um trabalho de acolhimento para a comunidade escolar das regiões da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão, com o apoio de psicólogos, pedagogos e assistentes sociais.

A onda de ataques no Rio e a reação da polícia fez com que várias escolas, creches e universidades suspendessem as aulas na última semana, no Rio, deixando milhares de estudantes sem estudar. As escolas da rede municipal que não puderam aplicar a Prova Rio na semana passada estão aplicando a avaliação nesta terça-feira (30). O teste tem por objetivo medir o nível de aprendizagem dos alunos dos 3º, 4º, 7º e 8º anos da rede municipal.

MEIOS E FINS: O SENTIDO CULTURAL DAS COISAS

Salomão Ferreira de Souza*

Falaram-me em homem, em humanidade.
Mas eu não tenho visto nenhum homem, nem humanidade.
Vi muitos homens assombrosamente diferentes entre si,
separados por um espaço sem homens.

Alberto Caieiro em Fernando Pessoa, 2001, p. 169.

É por meio da semeadura que os homens garantem o sustento biológico para o corpo. Mas o semear, na simbologia humana, tem um significado que vai além de lançar germes de vegetais sobre um solo preparado. Isso porque os homens, ao coletar frutos ou caçar animais numa floresta natural, não estão lançando sementes sobre o solo em sentido literal, mas cultivando um jeito, uma maneira própria de fazer a coleta e transportá-la, fabricar instrumentos de caça, usá-los de tal ou qual maneira criando, por meio dessas ações, um cultivo próprio cujo fim vai além de saciar a fome.

São nossos órgãos dos sentidos os primeiros instrumentos decodificadores do mundo, do espaço geográfico e das condições materiais e é por eles que cultivamos simbologias, criamos regras e estabelecemos fronteiras e divisões de poder, trabalho e gênero, determinante dos modos de resolver os problemas essenciais da sobrevivência coletiva. A cultura é, dessa forma, um modo particular de cada grupo garantir seu sustento dentro das determinações materiais e temporais dos mais diversos espaços geográficos.

Dessa maneira não é cabível dizer do culto e do não-culto. Por exemplo, dentro do espaço urbano, nas condições reais de seus diversos grupos, o sujeito se sustenta e se resolve, estabelecendo suas relações de poder e regulação próprias. Esse mesmo sujeito, com sua cultura forjada nesse ambiente, não seria capaz de resolver os problemas de sobrevivência e relações humanas dentro de uma floresta, coisa que um indígena resolveria com facilidade. Aquele sujeito urbano teria que semear outras sementes, novas ou híbridas, num campo de preparo difícil e colheita demorada. O tempo de semeadura e de colheita dependeria, diretamente, da capacidade do indivíduo ler e dar significados ao novo espaço.

Por fim, as relações de poder seriam estabelecidas dentro de regras e códigos numa condição totalmente nova, posto que a origem urbana do sujeito, ao adentrar outro espaço, levaria consigo alguma cultura que não o abandona totalmente. Esse sujeito, ao mudar de ambiente, traz consigo sementes que serão usadas de forma natural ou híbrida no campo novo.

Essa é a compreensão que devemos ter da cultura: que é diversa; que se acha em todo espaço das convivências humanas; que não tem a hierarquia metafísica aristotélica - objeto ideológico legitimador das hierarquias das ações -; que não é definitiva nem cristalizada; que não se faz igual nos diversos espaços temporais e geográficos; que são determinantes dos modos de vida de seus atores e, finalmente, que se dá no e pelo consenso entre os membros do grupo e desses com os outros por meio da assimilação onde a minoria fornece suas melhores sementes ao grupo dominante, no pluralismo cultural pela divisão de espaço e poder ou hibridismo das sementes culturais e na concepção multiétnica que pressupõe ensinar às minorias o cultivo da semente do grupo dominante.

Uma vez compreendido essa particularidade da cultura fica mais fácil entender as condições reais de cada grupo detro do espaço global, onde o exercício de poder está centrado no Norte e as condições de trabalho abaixo do Equador.

Historicamente, como podemos perceber na geografia global, temos para além dos limites simbólicos de cada território nacional, um outro limite imaginário cuja fronteira oscila nas proximidades do Equador, numa suposta divisão entre poder e não-poder, progresso e atraso, culta e não-cultura.

Quando falamos dessa divisão de poder (Norte) e trabalho (Sul), estamos nos referindo à ideologia aristotélica e medieva que considera, na hierarquia dos quatro movimentos (qualitativo, quantitativo, locomoção e geração ou corrupção dos corpos), na visão grega ou nas quatro causas (material, formal, motriz ou eficiente e final) na visão filosófica medieval. Essa metafísica aristotélica coloca o desejo de ter algo hierarquicamente superior à ação de fabricar este algo desejado.

Dessa maneira, desejar um carro é mais importante que retirar todos os produtos naturais que o compõem e que estão dispersos pelo planeta de forma bruta. Colher esses elementos, purificá-los, transportá-los até um espaço geográfico determinado, dar-lhes a forma e as funções de um carro, nessa visão ideológica, tem pouco valor nas relações de poder. O iluminado é quem deseja, pois esse tem as idéias, o acesso à luz, ao divino e por vezes, para justificar essa proximidade, legitima-se religiões, alinham-se aos sacerdotes que são legitimados e legitimadores, numa clara troca de interesses. Enquanto isso, aqueles que produzem as condições materiais, sustentáculo daquelas condição de poder, são considerados o estamento inferior da sociedade, o lado obscuro do humano. A isso chamamos ideologia.

Todas as culturas estão impregnadas de ideologias e, sem que percebamos, usamos dos mesmos mecanismos nas relações com os outros: no trabalho há quem deseja fazer e quem faz. E isso, por sua vez, determina quem manda e quem obedece, quem pode e quem não pode e, por vezes, esconde uma outra relação que é a de quem supostamente sabe e aquele que não sabe, a quem só resta a ação, como se essa não tivesse um saber necessário.

Para além das ideologias somos humanos. Antes mesmo de sermos humanos, somos seres vivos. Ser vivo exige troca constante entre o biológico e o mineral. Esse fenômeno é primordial à reprodução e manutenção da vida em todos os estágios. Para haver trocas é necessário um afetamento ou seja, uma capacidade do organismo vivo ler, interpretar e agir sobre o mundo. A falta dessa capacidade imobiliza o organismo e inviabiliza a vida.

Essa é a determinação natural da vida na Terra. Vale lembrar que não dispomos de outro planeta: ele é único e finito e é aqui que devemos compartilhar espaços. A apartir dessa realidade fica fácil perceber que precisamos pensar nossas relações com o outro. Sabemos que os homens e as mulheres, como seres culturais que são, criaram novos sentidos para o afetamento, as leituras e as ações no mundo.

Embora a essência da vida dependa do afetamento, da leitura e da ação dos organismos sobre o ambiente, na cultura esse sentido se perde por meio do estabelecimento de instâncias de poder onde uns poucos podem usufruir das trocas e outros apenas agir no mundo por determinação ideológica daqueles que desejam. Dessa maneira, as transformações resultantes das ações dos homens sobre os elementos naturais, transformando-os em objetos de uso, na absurda maioria das vezes, serve ao desejo de poucos. Vejam a espantosa quantidade de seres que se deslocam diariamente das periferias para as áreas centrais das grandes metrópoles mundiais. De onde vem e para onde vai essa gente toda? No burburinho cotidiano a que acostumamos, ignoramos os rumos que essa gente toma e, pior que isso, não perguntamos pelo trabalho que elas produzem. Alguém, por acaso, ao entrar em um grande shopping center, pergunta quais as mãos que o construíram? Os enfeites, as luzes, as vitrines, tudo conduz ao consumo, à afloração de desejos os mais apurados e mais estravagantes possíveis. Mas a pergunta que se nega a fazer, talvez pelo ofuscamento daquela enorme quantidade de luzes, não é quem deseja tudo isso, mesmo porque os desejos são vários e distintos. Há aqueles que se realizam e muitos que se perdem na impossibilidade material e temporal porque os desejosos, uma vez ocupados com as ações cotidianas de atender o desejos dos outros, fica impossibilitada de realizar os seus. Dessa forma se perdem na sua própria condição alienada. A pergunta que se instala é: que mãos fizeram tudo isso? E no fim da tarde ou da noite uma enorme multidão volta calada para dormitórios distantes dos shoppings e dos grandes edifícios da cidade. Essa esquece as mãos que a construíram e que atende prontamente seus mais sofisticados desejos e vai dormir no sossego de sua alienação programada.

* - Salomão Ferreira de Souza - é escritor e graduando em pedagogia na FAE (Faculdade de Educação) - BH - UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais).

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

PESQUISA [Notícias]

Dobra o número de agressões a professores nas escolas de BH

Nayara Menezes - Estado de Minas, 28 nov. 2010

Há 20 anos, quando começou a lecionar matemática para os alunos da rede pública de Belo Horizonte, Helena*, de 45 anos, pensava que sua maior dificuldade seria desvendar para os alunos as equações complicadas das ciências exatas. Hoje, ao relembrar o drama vivido no ano passado em sala de aula, ela sente saudades do tempo em que explicar fórmulas elaboradas era o maior desafio. Em um dia de aula como outro qualquer, Helena passou a integrar um contingente que cresce a cada dia, em um drama que a falta de números oficiais mal disfarça: o dos professores vítimas de violência. Apesar da escassez de dados, um dos poucos levantamentos feitos em Minas, pela Secretaria de Estado de Defesa Social com base em boletins de ocorrência gerados em Belo Horizonte, mostra que os episódios de agressão dobraram desde o ano passado em unidades da capital, qualquer que seja o ambiente escolar considerado. Apesar de assustador, o indicador não reflete a realidade, pois na maior parte dos casos os ataques não são denunciados à polícia.

Helena foi uma das vítimas dessa escalada. A educadora passava a matéria para os estudantes, quando foi surpreendida pela fúria de um aluno sob efeito de drogas. “Ele entrou na sala visivelmente alterado, gritando e derrubando tudo. Pedi calma e perguntei o que estava acontecendo e ele me respondeu com um chute. Caí no chão, bati a cabeça e me machuquei toda”, relembra. Colegas ainda tentaram conter o garoto, mas também foram agredidos. “Ele estava completamente fora de si; bateu também em três companheiros de classe”, recorda a professora, que ainda hoje guarda traumas do episódio. “Fiquei afastada por seis meses, tomando medicamento controlado.”


Saiba mais...

Professora denuncia ataque de estudante em sala de aula

Helena é mais uma entre centenas de vítimas de um problema cada vez mais comum. Apesar disso, faltam estatísticas oficiais sobre o número de educadores agredidos no país. Nem mesmo o Ministério da Educação tem pesquisas sobre o assunto, situação que se repete na Secretaria de Estado de Educação de Minas (SEE-MG). Para os profissionais, falta interesse em resolver a questão. A presidente do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE / MG), Beatriz da Silva Cerqueira, sustenta que a entidade é frequentemente acionada por vítimas de ameaça ou agressão, mas reclama que o poder público prefere “abafar os casos e tratá-los individualmente”.

“O que acontece, na maioria das vezes, é apenas uma suspensão do aluno, que posteriormente continua na escola, ameaçando aquele ou outro professor”, afirma Beatriz. Com Helena foi assim. Após seis meses de licença médica, ela foi transferida de escola. Já o estudante agressor, depois de uma semana suspenso, voltou às aulas. “A gente perde a saúde, o local onde gostamos de trabalhar, o convívio com os colegas, mas ele continua lá, dando problemas para outros professores”, queixa-se Helena. A mesma reclamação tem Antônia Alexandre Nogueira, professora do município de Cláudio, no Centro-Oeste mineiro, agredida este mês por um aluno. Depois de ter uma costela partida após um empurrão de um adolescente de 15 anos, a professora teme ser obrigada a encará-lo novamente. “A direção da escola quer que eu volte a dar aulas para ele, mas não tenho a menor condição”, desabafa.

Causas

Os motivos que levam a tanta violência em um ambiente onde, a princípio, deveriam imperar a paz e a harmonia são fonte de preocupações para especialistas. Para a pesquisadora Miriam Abramovay, coordenadora da área de juventude e políticas públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais e autora de diversos livros sobre a violência nas escolas, situações como essas refletem o clima hostil entre alunos e professores que vigora em muitas escolas país afora. “Constatamos em nossos estudos que as relações interpessoais no ambiente acadêmico são muito tensas e conflituosas. Falta comunicação entre educadores e estudantes”, avalia . Já a socióloga Maria Helena Barbosa acredita que a escola é apenas o reflexo da sociedade. “Ao contrário do que as pessoas pensam, não somos um povo pacífico. A violência está a cada dia mais presente em todas as esferas da nossa sociedade. E a escola é só mais um dos espaços onde ela se manifesta”, avalia.

Questionada sobre o assunto, a Secretaria de Estado da Educação informou, por meio da assessoria de imprensa, que as agressões são fatos isolados, não representando a realidade da maioria das escolas do estado. Segundo a SEE, os episódios de violência são encaminhados às Superintendências Regionais de Educação, que têm autonomia para resolvê-los.

* Por medo de ser vítimas de mais violência, parte dos professores ouvidos nesta reportagem pediu para ter a identidade preservada. Por isso, foram usados nomes fictícios.

Fonte: http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2010/11/17/interna_gerais,192841/professora-denuncia-ataque-de-estudante-em-sala-de-aula.shtml


E Mais...

Professora denuncia ataque de estudante em sala de aula

Paulo Henrique Lobato, 17 nov. 2010

O atrito entre um estudante de 15 anos e uma professora de 51 deixou a sala de aula e virou caso de polícia no município de Cláudio, no Centro-Oeste de Minas, a 183 quilômetros de Belo Horizonte. O adolescente, matriculado na 8ª série de uma escola estadual da cidade, é acusado de agredir Antônia Alexandre Nogueira, que leciona a disciplina de língua inglesa. O boletim de ocorrência registrado pela Polícia Militar informa que ela foi jogada ao chão e teve uma costela trincada, ficando com hematomas pelo corpo. A punição do menor foi uma advertência da instituição de ensino e uma suspensão que termina amanhã. O incidente ocorreu na sexta-feira.

“Aguardava, no fim da aula, junto à porta, o professor que lecionaria a disciplina no horário seguinte ao meu. O estudante tentou entrar na sala e não deixei, dizendo que ele deveria aguardar o educador. Então, ele forçou a entrada, empurrando a porta, que me acertou. Caí e bati em uma cadeira, trincando uma costela. A dor foi tanta que não consegui me levantar. Precisei da ajuda de um colega. Estou tomando remédios para aliviar o sofrimento”, disse a professora. Ela fez exame de corpo de delito na Santa Casa do município e acionou a Polícia Militar, que lavrou o boletim de ocorrência e encaminhou o caso para ser investigado pela Polícia Civil. A professora afirma que o estudante é problemático e que essa não é a primeira vez que ele causa tumulto na escola. Por mais de uma vez, acrescenta, o menor abaixou a calça diante das alunas.

“Ele mostrou a genitália na sala de aula e fora dela. Além do mais, tem o hábito de ridicularizar os colegas de classe por meio de apelidos. O dia em que ele vai à escola não fico sossegada. Não consigo lecionar direito. Sei que a PM já foi à casa do rapaz e conversou com os responsáveis. Quero que ele cumpra, para seu próprio bem, medida socioeducativa”, diz, revoltada, a educadora.

A Polícia Militar confirmou o registro da ocorrência e informou já ter encaminhado o assunto para ser esclarecido pela Civil. Já a diretora da escola, que prefere não se identificar, informou que o caso também chegou ao conhecimento do Conselho Tutelar do município. Ela, porém, prefere não emitir opinião sobre o episódio. Argumenta que o caso será tratado internamente, para preservar a boa imagem que a instituição de ensino conquistou no município.

Dentes quebrados

Esta não é a primeira ocorrência policial envolvendo estudante e professora neste mês. Há uma semana, uma coordenadora pedagógica de Porto Alegre (RS) denunciou um aluno de um curso técnico de enfermagem por tê-la agredido. A mulher teve os dois braços e cinco dentes quebrados.

O motivo da agressão seria a baixa nota tirada pelo aluno numa das disciplinas. Revoltado, o rapaz teria desferido vários socos na educadora, além de atacá-la com uma cadeira. A vítima desmaiou e foi socorrida por outros funcionários da escola, que se assustaram com a gritaria. O estudante poderá responder por tentativa de homicídio, segundo declarou à imprensa gaúcha o delegado que apura o caso.

A CRISE NO RIO E O PASTICHE MIDIÁTICO

por Luiz Eduardo Soares - 25 nov. 2010

Sempre mantive com jornalistas uma relação de respeito e cooperação. Em alguns casos, o contato profissional evoluiu para amizade. Quando as divergências são muitas e profundas, procuro compreender e buscar bases de um consenso mínimo, para que o diálogo não se inviabilize. Faço-o por ética – supondo que ninguém seja dono da verdade, muito menos eu--, na esperança de que o mesmo procedimento seja adotado pelo interlocutor. Além disso, me esforço por atender aos que me procuram, porque sei que atuam sob pressão, exaustivamente, premidos pelo tempo e por pautas urgentes. A pressa se intensifica nas crises, por motivos óbvios. Costumo dizer que só nós, da segurança pública (em meu caso, quando ocupava posições na área da gestão pública da segurança), os médicos e o pessoal da Defesa Civil, trabalhamos tanto – ou sob tanta pressão-- quanto os jornalistas. Digo isso para explicar por que, na crise atual, tenho recusado convites para falar e colaborar com a mídia:

(1) Recebi muitos telefonemas, recados e mensagens. As chamadas são contínuas, a tal ponto que não me restou alternativa a desligar o celular. Ao todo, nesses dias, foram mais de cem pedidos de entrevistas ou declarações. Nem que eu contasse com uma equipe de secretários, teria como responder a todos e muito menos como atendê-los. Por isso, aproveito a oportunidade para desculpar-me. Creiam, não se trata de descortesia ou desapreço pelos repórteres, produtores ou entrevistadores que me procuraram.

(2) Além disso, não tenho informações de bastidor que mereçam divulgação. Por outro lado, não faria sentido jogar pelo ralo a credibilidade que construí ao longo da vida. E isso poderia acontecer se eu aceitasse aparecer na TV, no rádio ou nos jornais, glosando os discursos oficiais que estão sendo difundidos, declamando platitudes, reproduzindo o senso comum pleno de preconceitos, ou divagando em torno de especulações. A situação é muito grave e não admite leviandades. Portanto, só faria sentido falar se fosse para contribuir de modo eficaz para o entendimento mais amplo e profundo da realidade que vivemos. Como fazê-lo em alguns parcos minutos, entrecortados por intervenções de locutores e debatedores? Como fazê-lo no contexto em que todo pensamento analítico é editado, truncado, espremido –em uma palavra, banido--, para que reinem, incontrastáveis, a exaltação passional das emergências, as imagens espetaculares, os dramas individuais e a retórica paradoxalmente triunfalista do discurso oficial?

(3) Por fim, não posso mais compactuar com o ciclo sempre repetido na mídia: atenção à segurança nas crises agudas e nenhum investimento reflexivo e informativo realmente denso e consistente, na entressafra, isto é, nos intervalos entre as crises. Na crise, as perguntas recorrentes são: (a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a explosão de violência? (b) O que a polícia deveria fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas? (c) Por que o governo não chama o Exército? (d) A imagem internacional do Rio foi maculada? (e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?

Ao longo dos últimos 25 anos, pelo menos, me tornei “as aspas” que ajudaram a legitimar inúmeras reportagens. No tópico, “especialistas”, lá estava eu, tentando, com alguns colegas, furar o bloqueio à afirmação de uma perspectiva um pouquinho menos trivial e imediatista. Muitas dessas reportagens, por sua excelente qualidade, prescindiriam de minhas aspas – nesses casos, reduzi-me a recurso ocioso, mera formalidade das regras jornalísticas. Outras, nem com todas as aspas do mundo se sustentariam. Pois bem, acho que já fui ou proporcionei aspas o suficiente. Esse código jornalístico, com as exceções de praxe, não funciona, quando o tema tratado é complexo, pouco conhecido e, por sua natureza, rebelde ao modelo de explicação corrente. Modelo que não nasceu na mídia, mas que orienta as visões aí predominantes. Particularmente, não gostaria de continuar a ser cúmplice involuntário de sua contínua reprodução.

Eis por que as perguntas mencionadas são expressivas do pobre modelo explicativo corrente e por que devem ser consideradas obstáculos ao conhecimento e réplicas de hábitos mentais refratários às mudanças inadiáveis. Respondo sem a elegância que a presença de um entrevistador exigiria. Serei, por assim dizer, curto e grosso, aproveitando-me do expediente discursivo aqui adotado, em que sou eu mesmo o formulador das questões a desconstruir. Eis as respostas, na sequência das perguntas, que repito para facilitar a leitura:

(a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a violência e resolver o desafio da insegurança?

Nada que se possa fazer já, imediatamente, resolverá a insegurança. Quando se está na crise, usam-se os instrumentos disponíveis e os procedimentos conhecidos para conter os sintomas e salvar o paciente. Se desejamos, de fato, resolver algum problema grave, não é possível continuar a tratar o paciente apenas quando ele já está na UTI, tomado por uma enfermidade letal, apresentando um quadro agudo. Nessa hora, parte-se para medidas extremas, de desespero, mobilizando-se o canivete e o açougueiro, sem anestesia e assepsia. Nessa hora, o cardiologista abre o tórax do moribundo na maca, no corredor. Não há como construir um novo hospital, decente, eficiente, nem para formar especialistas, nem para prevenir epidemias, nem para adotar procedimentos que evitem o agravamento da patologia. Por isso, o primeiro passo para evitar que a situação se repita é trocar a pergunta. O foco capaz de ajudar a mudar a realidade é aquele apontado por outra pergunta: o que fazer para aperfeiçoar a segurança pública, no Rio e no Brasil, evitando a violência de todos os dias, assim como sua intensificação, expressa nas sucessivas crises?

Se o entrevistador imaginário interpelar o respondente, afirmando que a sociedade exige uma resposta imediata, precisa de uma ação emergencial e não aceita nenhuma abordagem que não produza efeitos práticos imediatos, a melhor resposta seria: caro amigo, sua atitude representa, exatamente, a postura que tem impedido avanços consistentes na segurança pública. Se a sociedade, a mídia e os governos continuarem se recusando a pensar e abordar o problema em profundidade e extensão, como um fenômeno multidimensional a requerer enfrentamento sistêmico, ou seja, se prosseguirmos nos recusando, enquanto Nação, a tratar do problema na perspectiva do médio e do longo prazos, nos condenaremos às crises, cada vez mais dramáticas, para as quais não há soluções mágicas.

A melhor resposta à emergência é começar a se movimentar na direção da reconstrução das condições geradoras da situação emergencial. Quanto ao imediato, não há espaço para nada senão o disponível, acessível, conhecido, que se aplica com maior ou menor destreza, reduzindo-se danos e prolongando-se a vida em risco.

A pergunta é obtusa e obscurantista, cúmplice da ignorância e da apatia.

(b) O que as polícias fluminenses deveriam fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas?

Em primeiro lugar, deveriam parar de traficar e de associar-se aos traficantes, nos “arregos” celebrados por suas bandas podres, à luz do dia, diante de todos. Deveriam parar de negociar armas com traficantes, o que as bandas podres fazem, sistematicamente. Deveriam também parar de reproduzir o pior do tráfico, dominando, sob a forma de máfias ou milícias, territórios e populações pela força das armas, visando rendimentos criminosos obtidos por meios cruéis.

Ou seja, a polaridade referida na pergunta (polícias versus tráfico) esconde o verdadeiro problema: não existe a polaridade. Construí-la –isto é, separar bandido e polícia; distinguir crime e polícia-- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico armado, assim como as milícias.

Não digo isso para ofender os policiais ou as instituições. Não generalizo. Pelo contrário, sei que há dezenas de milhares de policiais honrados e honestos, que arriscam, estóica e heroicamente, suas vidas por salários indignos. Considero-os as primeiras vítimas da degradação institucional em curso, porque os envergonha, os humilha, os ameaça e acua o convívio inevitável com milhares de colegas corrompidos, envolvidos na criminalidade, sócios ou mesmo empreendedores do crime.

Não nos iludamos: o tráfico, no modelo que se firmou no Rio, é uma realidade em franco declínio e tende a se eclipsar, derrotado por sua irracionalidade econômica e sua incompatibilidade com as dinâmicas políticas e sociais predominantes, em nosso horizonte histórico. Incapaz, inclusive, de competir com as milícias, cuja competência está na disposição de não se prender, exclusivamente, a um único nicho de mercado, comercializando apenas drogas – mas as incluindo em sua carteira de negócios, quando conveniente. O modelo do tráfico armado, sustentado em domínio territorial, é atrasado, pesado, anti-econômico: custa muito caro manter um exército, recrutar neófitos, armá-los (nada disso é necessário às milícias, posto que seus membros são policiais), mantê-los unidos e disciplinados, enfrentando revezes de todo tipo e ataques por todos os lados, vendo-se forçados a dividir ganhos com a banda podre da polícia (que atua nas milícias) e, eventualmente, com os líderes e aliados da facção. É excessivamente custoso impor-se sobre um território e uma população, sobretudo na medida que os jovens mais vulneráveis ao recrutamento comecem a vislumbrar e encontrar alternativas. Não só o velho modelo é caro, como pode ser substituído com vantagens por outro muito mais rentável e menos arriscado, adotado nos países democráticos mais avançados: a venda por delivery ou em dinâmica varejista nômade, clandestina, discreta, desarmada e pacífica. Em outras palavras, é melhor, mais fácil e lucrativo praticar o negócio das drogas ilícitas como se fosse contrabando ou pirataria do que fazer a guerra. Convenhamos, também é muito menos danoso para a sociedade, por óbvio.

(c) O Exército deveria participar?

Fazendo o trabalho policial, não, pois não existe para isso, não é treinado para isso, nem está equipado para isso. Mas deve, sim, participar. A começar cumprindo sua função de controlar os fluxos das armas no país. Isso resolveria o maior dos problemas: as armas ilegais passando, tranquilamente, de mão em mão, com as benções, a mediação e o estímulo da banda podre das polícias.

E não só o Exército. Também a Marinha, formando uma Guarda Costeira com foco no controle de armas transportadas como cargas clandestinas ou despejadas na baía e nos portos. Assim como a Aeronáutica, identificando e destruindo pistas de pouso clandestinas, controlando o espaço aéreo e apoiando a PF na fiscalização das cargas nos aeroportos.

(d) A imagem internacional do Rio foi maculada?

Claro. Mais uma vez.

(e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?

Sem dúvida. Somos ótimos em eventos. Nesses momentos, aparece dinheiro, surge o “espírito cooperativo”, ações racionais e planejadas impõem-se. Nosso calcanhar de Aquiles é a rotina. Copa e Olimpíadas serão um sucesso. O problema é o dia a dia.

Palavras Finais

Traficantes se rebelam e a cidade vai à lona. Encena-se um drama sangrento, mas ultrapassado. O canto de cisne do tráfico era esperado. Haverá outros momentos análogos, no futuro, mas a tendência declinante é inarredável. E não porque existem as UPPs, mas porque correspondem a um modelo insustentável, economicamente, assim como social e politicamente. As UPPs, vale dizer mais uma vez, são um ótimo programa, que reedita com mais apoio político e fôlego administrativo o programa “Mutirões pela Paz”, que implantei com uma equipe em 1999, e que acabou soterrado pela política com “p” minúsculo, quando fui exonerado, em 2000, ainda que tenha sido ressuscitado, graças à liderança e à competência raras do ten.cel. Carballo Blanco, com o título GPAE, como reação à derrocada que se seguiu à minha saída do governo. A despeito de suas virtudes, valorizadas pela presença de Ricardo Henriques na secretaria estadual de assistência social --um dos melhores gestores do país--, elas não terão futuro se as polícias não forem profundamente transformadas. Afinal, para tornarem-se política pública terão de incluir duas qualidades indispensáveis: escala e sustentatibilidade, ou seja, terão de ser assumidas, na esfera da segurança, pela PM. Contudo, entregar as UPPs à condução da PM seria condená-las à liquidação, dada a degradação institucional já referida.

O tráfico que ora perde poder e capacidade de reprodução só se impôs, no Rio, no modelo territorializado e sedentário em que se estabeleceu, porque sempre contou com a sociedade da polícia, vale reiterar. Quando o tráfico de drogas no modelo territorializado atinge seu ponto histórico de inflexão e começa, gradualmente, a bater em retirada, seus sócios –as bandas podres das polícias-- prosseguem fortes, firmes, empreendedores, politicamente ambiciosos, economicamente vorazes, prontos a fixar as bandeiras milicianas de sua hegemonia.

Discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados? Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis, ineficientes na prevenção e na investigação?

As polícias são instituições absolutamente fundamentais para o Estado democrático de direito. Cumpre-lhes garantir, na prática, os direitos e as liberdades estipulados na Constituição. Sobretudo, cumpre-lhes proteger a vida e a estabilidade das expectativas positivas relativamente à sociabilidade cooperativa e à vigência da legalidade e da justiça. A despeito de sua importância, essas instituições não foram alcançadas em profundidade pelo processo de transição democrática, nem se modernizaram, adaptando-se às exigências da complexa sociedade brasileira contemporânea. O modelo policial foi herdado da ditadura. Ele servia à defesa do Estado autoritário e era funcional ao contexto marcado pelo arbítrio. Não serve à defesa da cidadania. A estrutura organizacional de ambas as polícias impede a gestão racional e a integração, tornando o controle impraticável e a avaliação, seguida por um monitoramento corretivo, inviável. Ineptas para identificar erros, as polícias condenam-se a repeti-los. Elas são rígidas onde teriam de ser plásticas, flexíveis e descentralizadas; e são frouxas e anárquicas, onde deveriam ser rigorosas. Cada uma delas, a PM e a Polícia Civil, são duas instituições: oficiais e não-oficiais; delegados e não-delegados.

E nesse quadro, a PEC-300 é varrida do mapa no Congresso pelos governadores, que pagam aos policiais salários insuficientes, empurrando-os ao segundo emprego na segurança privada informal e ilegal.

Uma das fontes da degradação institucional das polícias é o que denomino "gato orçamentário", esse casamento perverso entre o Estado e a ilegalidade: para evitar o colapso do orçamento público na área de segurança, as autoridades toleram o bico dos policiais em segurança privada. Ao fazê-lo, deixam de fiscalizar dinâmicas benignas (em termos, pois sempre há graves problemas daí decorrentes), nas quais policiais honestos apenas buscam sobreviver dignamente, apesar da ilegalidade de seu segundo emprego, mas também dinâmicas malignas: aquelas em que policiais corruptos provocam a insegurança para vender segurança; unem-se como pistoleiros a soldo em grupos de extermínio; e, no limite, organizam-se como máfias ou milícias, dominando pelo terror populações e territórios. Ou se resolve esse gargalo (pagando o suficiente e fiscalizando a segurança privada /banindo a informal e ilegal; ou legalizando e disciplinando, e fiscalizando o bico), ou não faz sentido buscar aprimorar as polícias.

O Jornal Nacional, nesta quinta, 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro, salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas.

Ou se começa a falar sério e levar a sério a tragédia da insegurança pública no Brasil, ou será pelo menos mais digno furtar-se a fazer coro à farsa.

Fonte: http://luizeduardosoares.blogspot.com/

NÃO HAVERÁ VENCEDORES

MARCELO FREIXO

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Pode parecer repetitivo, mas é isso: uma solução para a segurança pública do Rio terá de passar pela garantia dos direitos dos cidadãos da favela
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Dezenas de jovens pobres, negros, armados de fuzis, marcham em fuga, pelo meio do mato. Não se trata de uma marcha revolucionária, como a cena poderia sugerir em outro tempo e lugar. Eles estão com armas nas mãos e as cabeças vazias. Não defendem ideologia. Não disputam o Estado. Não há sequer expectativa de vida. Só conhecem a barbárie. A maioria não concluiu o ensino fundamental e sabe que vai morrer ou ser presa.

As imagens aéreas na TV, em tempo real, são terríveis: exibem pessoas que tanto podem matar como se tornar cadáveres a qualquer hora. A cena ocorre após a chegada das forças policiais do Estado à Vila Cruzeiro e ao Complexo do Alemão, zona norte do Rio de Janeiro.

O ideal seria uma rendição, mas isso é difícil de acontecer. O risco de um banho de sangue, sim, é real, porque prevalece na segurança pública a lógica da guerra. O Estado cumpre, assim, o seu papel tradicional. Mas, ao final, não costuma haver vencedores. Esse modelo de enfrentamento não parece eficaz. Prova disso é que, não faz tanto tempo assim, nesta mesma gestão do governo estadual, em 2007, no próprio Complexo do Alemão, a polícia entrou e matou 19. E eis que, agora, a polícia vê a necessidade de entrar na mesma favela de novo.

Tem sido assim no Brasil há tempos. Essa lógica da guerra prevalece no Brasil desde Canudos. E nunca proporcionou segurança de fato. Novas crises virão. E novas mortes. Até quando? Não vai ser um Dia D como esse agora anunciado que vai garantir a paz. Essa analogia à data histórica da 2ª Guerra Mundial não passa de fraude midiática.

Essa crise se explica, em parte, por uma concepção do papel da polícia que envolve o confronto armado com os bandos do varejo das drogas. Isso nunca vai acabar com o tráfico. Este existe em todo lugar, no mundo inteiro. E quem leva drogas e armas às favelas? É preciso patrulhar a baía de Guanabara, portos, fronteiras, aeroportos clandestinos. O lucrativo negócio das armas e drogas é máfia internacional. Ingenuidade acreditar que confrontos armados nas favelas podem acabar com o crime organizado. Ter a polícia que mais mata e que mais morre no mundo não resolve.

Falta vontade política para valorizar e preparar os policiais para enfrentar o crime onde o crime se organiza -onde há poder e dinheiro. E, na origem da crise, há ainda a desigualdade. É a miséria que se apresenta como pano de fundo no zoom das câmeras de TV. Mas são os homens armados em fuga e o aparato bélico do Estado os protagonistas do impressionante espetáculo, em narrativa estruturada pelo viés maniqueísta da eterna "guerra" entre o bem e o mal.

Como o "inimigo" mora na favela, são seus moradores que sofrem os efeitos colaterais da "guerra", enquanto a crise parece não afetar tanto assim a vida na zona sul, onde a ação da polícia se traduziu no aumento do policiamento preventivo. A violência é desigual. É preciso construir mais do que só a solução tópica de uma crise episódica. Nem nas UPPs se providenciou ainda algo além da ação policial. Falta saúde, creche, escola, assistência social, lazer.

O poder público não recolhe o lixo nas áreas em que a polícia é instrumento de apartheid. Pode parecer repetitivo, mas é isso: uma solução para a segurança pública terá de passar pela garantia dos direitos básicos dos cidadãos da favela. Da população das favelas, 99% são pessoas honestas que saem todo dia para trabalhar na fábrica, na rua, na nossa casa, para produzir trabalho, arte e vida. E essa gente -com as suas comunidades tornadas em praças de "guerra"- não consegue exercer sequer o direito de dormir em paz.

Quem dera houvesse, como nas favelas, só 1% de criminosos nos parlamentos e no Judiciário... "

Fonte: Folha de S. Paulo - 28 nov. 2010 - In: "TENDÊNCIAS/DEBATES

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

NOTÍCIAS...

Algumas escolas e universidades suspendem aulas no Rio e em São Gonçalo

Publicada em 25 nov. 2010, por Rodrigo Gomes - Globo.com

RIO - A onda de ataques no Rio e a reação da polícia deixaram várias escolas, creches e universidades sem aulas nesta quinta-feira, em São Gonçalo, no município do Rio e no Grande Rio. Segundo a Secretaria Municipal de Educação, 159 unidades escolares, entre escolas e creches - a maioria na Zona Norte, Oeste e no Subúrbio da cidade - não funcionaram, deixando mais de 38.500 estudantes sem aulas. As escolas da rede municipal também não puderam aplicar a Prova Rio nesta quinta em função da série de ataques de traficantes. A avaliação será aplicada na próxima terça-feira, dia 30. O teste é uma avaliação externa, elaborada e aplicada pelo Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília (Cesp-UnB), com o objetivo de medir os níveis de aprendizagem dos alunos dos 3º, 4º, 7º e 8º anos da rede municipal.

Vinte e um colégios estaduais na Zona Norte também ficaram fechados: C.E. Compositor Luiz Carlos da Vila, em Manguinhos; C.E. Gomes Freire de Andrade, na Penha; C.E. Compositor Manaceia José de Andrade, em Madureira; C.E. Olga Benário Prestes, em Bonsucesso; I.E. Carmela Dutra, em Madureira; Caic Joaquim da Silva Xavier - O Tiradentes, no Caju; Ciep Brizolão Federico Felline, na Vila Cruzeiro; EEES Berlim - Olaria; CE República de Angola - IAPI da Penha; CE Barão de Macaúbas - Inhaúma; CE Mal João Batista de Matos - Coelho Neto; CE Lélia Gonzales - Ramos; CAIC Theophilo de Souza Pinto - Nova Brasília - Bonsucesso; CIEP Maria Werneck de Castro - Irajá; CE Antonio Houaiss - Méier; CE Central do Brasil - Méier; CE França - Cascadura; Ciep Raul Ryff - Paciência; CE Leopoldina - Bangu; CIEP 311 Bocayuva Cunha - Paciência; CES SENAI de Paciência.

O número de alunos prejudicados não foi informado. Em nota, a Secretaria Estadual de Educação ressaltou que os conteúdos das aulas serão repostos. Em São Gonçalo, onde veículos também foram incendiados, escolas do bairro Paraíso - onde há morros controlados por facções criminosas - suspenderam as aulas. O reitor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Ricardo Vieiralves informou que as aulas continuam normais nesta quinta e sexta-feira. Em função da série de ataques de traficantes na cidade, a orientação do reitor é que os professores não apliquem nenhuma avaliação para que ninguém seja prejudicado.

- Os funcionários, estudantes e professores que faltarem não serão considerados faltosos - diz. As aulas também continuam normal na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), segundo a assessoria de imprensa. As Universidades Estácio e Gama Filho suspenderam as aulas dos turnos da noite nesta quinta-feira em todas as unidades do Rio e Grande Rio. Nesta sexta-feira, as universidades vão avaliar se existe a necessidade de suspender novamente as aulas. Segundo a assessoria de imprensa da Gama Filho, as provas marcada para esta quinta serão remarcadas para próxima semana.

Já a Unisuam já decidiu suspender suas aulas nesta sexta-feira, em virtude dos últimos acontecimentos na cidade e para garantir a segurança de seus alunos, professores e colaboradores. A decisão vale para suas cinco unidades: Bonsucesso, Bangu, Campo Grande, Vila da Penha e Jacarepaguá.

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ) também adiou as aulas esta quinta-feira. Segundo a assessoria de imprensa, nesta sexta a previsão é que apenas o campus de Nilópolis permaneça fechado.

Ainda nesta quarta-feira, cerca de 17 mil alunos da rede municipal ficaram sem aulas no turno da tarde. Segundo a Secretaria de Educação, 47 escolas e dez creches que funcionam perto de comunidades que foram alvos de operações policiais dispensaram os estudantes.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

NOTÍCIAS...

Rio tem 21 escolas e 12 creches fechadas devido a confrontos

DO RIO, Folha.com - 25 nov. 2010

Os confrontos entre policiais e traficantes levaram ao fechamento de 21 escolas e 12 creches do Rio nesta quinta-feira. A medida foi tomada para proteger alunos, professores e funcionários em áreas consideradas de risco. A maioria das unidades afetadas fica na zona norte da cidade.

Na rede estadual, foram fechados os colégios Compositor Luiz Carlos da Vila, em Manguinhos, Gomes Freire de Andrade, na Penha, Compositor Manaceia José de Andrade, em Madureira, e Olga Benário Prestes, em Bonsucesso. A secretaria estadual de Educação não informou o número de alunos que ficaram sem aulas. Já na rede municipal foram fechadas 17 escolas e 12 creches. Juntas, elas atendem a 12.414 alunos.

Para as autoridades de segurança, a onda de ataques e incêndios em veículos são uma retaliação dos traficantes contra a instalação das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) nos morros e favelas. O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), fez na manhã desta quinta-feira um apelo à população para que não se "acovarde" diante da onda de ataques do tráfico e respalde a política de segurança pública do Estado. Desde domingo, foram incendiados pelo menos 55 veículos e confrontos entre polícia e criminosos deixaram 27 mortos.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

NOTÍCIAS...

Mãe é liberada de assistir às aulas com a filha em Fernandópolis (SP)

FELIPE LUCHETE, DE SÃO PAULO - 24 nov. 2010

A empregada doméstica que assistia aulas com a filha de 14 anos em Fernandópolis (553 km de São Paulo) foi ontem à escola estadual José Belúcio levar a jovem, mas não precisou ficar ali. Na segunda-feira, a Justiça e o Conselho Tutelar entenderam que a garota "retomou a linha" e aceitaram o pedido da mãe, que disse precisar voltar ao trabalho. No início de outubro, após decisão dos dois órgãos, a mulher de 36 anos passou a frequentar todos os dias a 7ª série. A intenção era corrigir a alta evasão escolar da menina, uma "medida extrema" depois que outras iniciativas não deram certo.

Mesmo com o curto espaço de tempo, o diretor da escola, Jefferson Quintanilha Coutinho, afirmou ter ficado surpreso com a melhora no comportamento da adolescente. Disse que ela faz "trabalhos de compensação de ausência" e pode passar para a 8ª série, a depender de decisão do conselho de classe.

Segundo o juiz Evandro Pelarin, da Vara da Infância e da Juventude, a mãe se comprometeu a levar e buscar a filha todos os dias. E a menina demonstrou consciência de que deve ficar na escola. Caso ela volte a faltar, é possível que a medida seja aplicada novamente, de acordo com Pelarin. Depois desse caso, o Conselho Tutelar decidiu que outras duas jovens passassem a ser acompanhadas por responsáveis na sala de aula.

O mais recente, definido há quase duas semanas, não foi seguido pela mãe, segundo o conselheiro tutelar Alan Mateus. Ele diz que pedirá ao juiz "nova orientação" para que ela cumpra a medida. O município foi um dos pioneiros a adotar, em 2005, o "toque de recolher" à noite para menores de idade. Neste ano, adotou o "toque escolar", que permite a policiais e conselheiros tutelares abordarem jovens fora da aula.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/saber/835342-mae-e-liberada-de-assistir-as-aulas-com-a-filha-em-fernandopolis-sp.shtml

domingo, 21 de novembro de 2010

INTOLERÂNCIA faz vítimas, todos os dias, no país...

Religiosos, homossexuais, negros e nordestinos são alvos

por Marcelo Remígio - Publicada em 20 nov. 2010 (O Globo.com)

RIO - O Brasil de todas as raças, culturas e credos está intolerante. Negros, homossexuais, nordestinos, moradores de rua e religiosos são alvos constantes de preconceito. As agressões vão muito além da violência física: incluem de xingamentos a ataques na internet. Somente a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, com sede no Rio de Janeiro, registrou no estado, de janeiro de 2009 ao mês passado, 119 atendimentos que resultaram em 63 processos na Justiça. O grupo ainda acompanha dez casos em quatro estados.

Os números também são altos no Programa Rio Sem Homofobia, que recebeu, nos últimos 12 meses, cerca de 600 denúncias de agressões contra gays. No feriado prolongado da Proclamação da República, dois casos engrossaram as estatísticas de violência nacional. Um jovem de 19 anos foi agredido no Rio por militares do Exército e baleado. Ele havia participado de uma parada gay em Copacabana. Já em São Paulo, três jovens foram vítimas de um grupo de rapazes na Avenida Paulista. A polícia investiga se a causa foi homofobia.

- Houve sempre um falso discurso de que o Brasil era tolerante, uma democracia racial e religiosa. Mas também havia um mundo de invisíveis, que sofriam preconceito calados. Grupos passaram a se organizar e a lutar contra a intolerância e os casos começaram a ser divulgados - diz o sociólogo Paulo Baía, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ.

Para Baía, o preconceito tende a crescer, em especial contra religiosos, por ser muito difundido por meio da Internet. Ele alerta para a perseguição promovida por igrejas neopentecostais fundamentalistas que, em sua visão, representa um risco à liberdade religiosa. Segundo o pesquisador, os fiéis miram nas religiões católica e de matriz africana, como o candomblé.

- Os fundamentalistas difundem que só a religião deles é boa. Eles satanizam as demais e propagam a intolerância.

REPORTAGEM: Bullying entre crianças causa tragédias no Brasil

Do Portal R7 com Rede Record, 20 nov. 2010 - Jornal Hoje em Dia

Provocações e brincadeiras fazem parte da rotina adolescente. Mas quando o limite do aceitável é ultrapassado e essas práticas vêm acompanhadas de agressão e violência, sejam psicológicas ou físicas, ganham o nome de bullying. Praticado sem controle, esse tipo de violência tem provocado tragédias em todo o Brasil.

Recentemente, um garoto de 17 anos morreu depois de ter sido agredido pelos colegas dentro da sala de aula por causa de seu novo corte de cabelo. Até mesmo famosos já sofreram esse tipo de abuso. O empresário Bruno Chateaubriand, que hoje circula na alta sociedade carioca, lembra ressentido o que acontecia com ele na época da escola. "É aquele massacre, quase que diário. Você não tem mais vontade de ir ao colégio, não tem mais vontade de participar das festinhas com as crianças".

Na maioria das vezes, só se descobre o bullying depois de muito tempo. Isso porque além de humilhar e agredir, os agressores também ameaçam suas vítimas. A demora para identificar as agressões às vezes pode ser fatal. Pesquisa realizada no país pelo Ceats (Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor) indica que cerca de 70% dos estudantes brasileiros já viram algum colega ser maltratado pelo menos uma vez na escola. Na região Sudeste, o índice chega a 81% e, na Centro-Oeste, a 75%.

Para especialistas, esclarecer e educar são as principais armas das escolas para lutar contra a disseminação do bullying. No mês passado, a SBP (Sociedade Brasileira de Psicologia) discutiu o assunto em um seminário que reuniu mais de 2.000 profissionais. A presidente da SBP, Paula Gomide, disse que é preciso prevenir, até porque a maioria das vítimas de bullying acabam se tornando adultos violentos, pois reproduzem o padrão de comportamento que vivienciaram.

Para Paula, a maior dificuldade e também o maior trunfo é descobrir a agressão precocemente. "O processo de prevenção começa quando o caso é identificado. Muitas vezes pais e professores têm dificuldade de entender que abusos psicológicos - como comparações, xingamentos ao corrigir uma criança - atingem o ser, o que ela é, e não o seu comportamento. Isso provoca baixa autoestima, o que torna a criança uma vítima fácil do bullying".

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

NOTÍCIAS...

Aluno acusado de agredir professora em Porto Alegre se apresenta à polícia

SÃO PAULO - O Globo.com

O aluno do curso de enfermagem, Rafael Soares Ferreira, de 25 anos, acusado de agredir a professora Jane de Leon Antunes, 57 anos, a socos e cadeiradas por causa de uma nota baixa se apresentou à polícia nesta quarta-feira, em Porto Alegre. Ele estava com a prisão preventiva decretada e foi encaminhado ao Presídio Central. A professora teve os braços quebrados, perdeu vários dentes e ficou com hematomas na cabeça. Ele deve responder por tentativa de homicídio.

Em depoimento à polícia, o jovem negou a agressão. Disse que tentou se defender de um segurança da escola que o agredia. Na versão dele, os ferimentos da professora foram causados acidentalmente durante a suposta briga. Rafael disse que estava lutando com um segurança da escola, que havia impedido que ele deixasse a sala de coordenação.

Na briga, ele disse ter jogado uma cadeira no segurança, que acabou atingindo a professora. Rafael afirmou ser vítima de racismo. A agressão aconteceu numa escola técnica particular de Porto Alegre. O depoimento do estudante contradiz a versão de pelo menos dez testemunhas que afirmaram à polícia que Rafael agrediu a professora. A professora disse que o aluno avisou que ia agredi-la.

- Ele disse "Eu gosto muito de ti mas vou te punir". E veio com a cadeira e quebrou minha sala.

O aluno, que tem histórico de notas altas, teria ficado indignado com a escola devido a uma nota C e partiu para a violência descabida. Ferreira é instrutor de jiu-jitsu. O delegado Fernando Soares afirmou que a agressão pode ser considerada uma tentativa de homicídio.

- Se não houvesse a intervenção de terceiros, ele teria concluído e essa senhora estaria em óbito. Nunca vi uma agressão como essa no ambiente escolar - afirmou.

A matrícula de Rafael foi cancelada. A professora diz que espera por Justiça.

CONSCIÊNCIA NEGRA DE TODOS OS DIAS

NOTÍCIAS...

Estudante sofre traumatismo craniano após briga em escola no interior de SP

LUIZA PELLICANI - 19 nov. 2010 (Colaboração para a Folha, de Ribeirão Preto)

Um estudante da oitava série da escola municipal Dom Luiz do Amaral Mousinho, no Campos Elíseos, em Ribeirão Preto (313 km de São Paulo), teve traumatismo craniano após ser agredido por um colega na tarde de anteontem dentro da escola. Os alunos têm 15 anos. Os dois se desentenderam no pátio da escola por causa de uma partida do game Counter-Strike na internet e, na sequência, se agrediram. O jogo é recomendado para maiores de 18 anos.

Segundo a mãe do adolescente, seu filho conversava com outro estudante na hora da agressão. "Ele me disse que só apontou para o outro e que depois o menino bateu." Uma servente teria visto a movimentação de alunos, viu a briga e separou os estudantes, segundo a mãe. O caso teria ocorrido durante o intervalo das aulas, às 15h30. No entanto, os pais dos alunos foram avisados somente às 16h45. Em sua casa, por volta das 21h30, o adolescente passou mal e vomitou sangue.

Levado à Santa Casa de Ribeirão Preto, o jovem foi diagnosticado com traumatismo craniano leve e passou a noite internado. O adolescente teve alta hospitalar na manhã de ontem. De acordo com a secretária da Educação de Ribeirão Preto, Débora Vendramini, as famílias dos dois jovens devem participar de uma reunião hoje e os estudantes receberão apoio psicológico. Os dois adolescentes também serão ouvidos pela DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) de Ribeirão.

Fonte: Folha.com

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

PESQUISA [Notícias]

Ipea: ricos no Brasil estudam quase o dobro dos pobres

por Claudia Andrade - Direto de Brasília, 18 nov. 2010

A renda continua sendo um diferencial na educação brasileira, é o que indica análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2009 (Pnad). Segundo o Ipea, se dividirmos a população com 15 anos ou mais por renda em cinco partes, os mais ricos estudam, em média, 10,7 anos, contra 5,5 anos da quinta parte mais pobre da população - praticamente o dobro. A Pnad é realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

"Os mais ricos sempre estão em melhor situação do que os mais pobres (na educação). Apenas na área rural o indicador para os mais ricos está abaixo da escolarização prevista no texto constitucional (no mínimo 8 anos). Enquanto isso, os mais pobres não atingem o mínimo recomendado em nenhuma categoria", diz o instituto em nota.

Segundo o Ipea, há grande diferença também entre os mais ricos que vivem em área urbana e os que vivem na zona rural - os primeiros estudam, em média, 3,5 anos a mais. A diferença entre os mais pobres na cidade e no campo é menor - de 1,8 ano de estudo.

Mantidas as atuais políticas de educação, o Brasil deve levar ainda cinco anos para atingir uma média de oito anos de estudo entre a população de 15 anos de idade ou mais. E esses oito anos ainda são um patamar baixo, comparando-se com países desenvolvidos que têm uma educação básica completa de 11 anos de estudo. Um dos principais fatores que atravancam o processo de melhoria é a desigualdade de renda, segundo estudo do Ipea.

"Avançamos, mas continuamos com diferenciais fortes entre regiões, no quesito renda, raça/cor, no quesito rural/urbano", afirma o pesquisador do Ipea, Jorge Abrahão. "É importante o crescimento econômico que permite às famílias, com o aumento da renda, manter seus filhos na escola. Mas também não vamos melhorar isso tudo se não atuarmos de forma diferenciada", afirma Abrahão.

O pesquisador também aponta o analfabetismo como outro problema a ser enfrentado. Apesar da redução verificada desde o começo da década de 90, o número de analfabetos ainda gira em torno de 14 milhões de brasileiros. "A educação brasileira está avançando nos últimos 20 anos, mas anda sobrexiste muitos problemas, como o analfabetismo que ainda é muito alto no país, atingindo 9,7% da população de 15 anos ou mais. (O índice) está caindo muito devagar".

O grau de instrução da população brasileira acima de 15 anos atingiu a média de 7,5 anos de estudo no ano passado. No entanto, a melhora anual verificada entre os anos de 1992 e 2009 ficou em apenas 0,14 ano de estudo, em média. "Estamos ainda muito longe de atingir um indicador razoável para a educação básica. (...) O mínimo, o desejável para um país desenvolvido seria ser ousado e imaginar que em um espaço de tempo razoável se chegasse aos 11 anos", afirma o pesquisador.

Diferença expressivas

Segundo o Ipea, outros grupos também são desfavorecidos na educação brasileira. Os negros, por exemplo, estudam 1,7 ano a menos que os brancos. A população urbana estuda, em média, 3,9 anos a mais que a rural.


E mais...

Ipea: conclusão da educação básica ainda é desafio no Brasil

por Claudia Andrade - Direto de Brasília, 18 nov. 2010

A universalização do ensino fundamental deve estar direcionada para a conclusão dos anos escolares e não apenas para o acesso à educação. A conclusão é de um estudo sobre a situação da educação no Brasil divulgado nesta quinta-feira (18) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2009 (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O pesquisador do instituto Jorge Abrahão considera a defasagem de ensino é "um dos problemas mais sérios" da formação escolar. Em todo o País, 87,6% dos alunos concluem a quarta série do ensino fundamental, mas a taxa cai para 53,8% na conclusão da oitava série.

Mesmo no Sul do País, que tem a maior taxa de alunos no ensino fundamental até a quarta série, 95%, vê o indicador cair para cerca de 70% na oitava série. "De cada 100, 95 terminam a quarta série, mas só 70 terminam a metade; 25 ficam na metade (do caminho). Ou o estudante foi reprovado e ficou para trás ou evadiu e não volta mais (para a escola)".

No Nordeste do Brasil, a taxa de estudantes na escola até a quarta série chega a 79,4%, mas cai para apenas 38,7% quando se chega à oitava série. No Norte, o índice cai de 81% para 40,5%, no Sudeste, passa de 94,5% para 66,6%, e no Centro-Oeste, de 88,9% para 54,2%. Quando se avalia o índice de adequação, ou seja, a idade adequada ao ano de escolaridade, os percentuais apresentam queda à medida que a idade aumenta. Na faixa etária dos 9 anos, todas as regiões do Brasil apresentam um índice de adequação de pelo menos 80%. Quando se chega aos 16 anos, no entanto, a média nacional cai para 60%. No Nordeste, chega a 40%."Além de ainda haver uma porcentagem residual de crianças e jovens fora da escola, entre os matriculados há os que não aprendem ou progridem lentamente, repetem o ano e acabam abandonando os estudos", diz a pesquisa do Ipea.

Os fatores que contribuem para a dificuldade de permanência do estudante na escola estão relacionados, segundo o instituto, à qualidade do ensino, à gestão das escolas e às desigualdades sociais dos próprios alunos e de suas famílias.

Fonte: Portal Terra

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

NOTÍCIAS...

Acusados de agressão na av. Paulista colecionam "expulsões" de escolas

DE SÃO PAULO- 17 nov. 2010

Um dos adolescentes acusados de agredir quatro rapazes na avenida Paulista, na manhã do último domingo, tem um histórico de indisciplina nas escolas por onde passou. A informação é da reportagem de Talita Bedinelli publicada na edição desta quarta-feira da Folha. De acordo com o texto, após estudar por sete anos no Dante Alighieri, o rapaz de 17 anos "foi convidado" a não se rematricular na escola, em 2009, devido a problemas disciplinares. Segundo o colégio, ele levou advertências verbais e por escrito e pelo menos seis suspensões durante o ano.

Amigos do rapaz afirmam que ele mudou para o colégio Objetivo em 2009, de onde também foi expulso após atitudes "sem noção, como fazer xixi na sala de aula", diz um ex-colega de colégio. Ainda de acordo com amigos, o adolescente de 16 anos também acusado de agressão foi expulso do Objetivo após se envolver numa briga.

O Objetivo diz apenas que os dois foram embora "porque não conseguiram acompanhar o ritmo do colégio". No Objetivo, na mesma Paulista das agressões, os rapazes eram o assunto ontem: eles têm fama de briguentos. Os alunos dizem que eles já haviam batido em um homossexual em uma festa. A Folha não localizou a família dos jovens ontem.

Entenda o caso...


Justiça concede liberdade provisória para jovem suspeito de agressão na Paulista, em SP

15 nov. 2010 (DE SÃO PAULO)

A Justiça concedeu, na tarde desta segunda-feira, liberdade provisória ao jovem de 19 anos suspeito de agredir quatro rapazes na avenida Paulista, região central de São Paulo, no domingo (14). Ele deixou o 2º DP (Bom Retiro), onde estava preso, por volta das 16h30, segundo a polícia. O estudante vai responder em liberdade pelos crimes de agressão corporal gravíssima e formação de quadrilha. No início da tarde de hoje, os outros quatro adolescentes suspeitos de participarem das agressões já haviam sido liberados da Fundação Casa, onde estavam detidos. Segundo o advogado Orlando Machado, que defende um dos adolescentes, a Justiça entendeu que o caso se tratou de uma briga --e que não houve homofobia. "Houve, sim, uma paquera de uma das vítimas para um dos menores, e eles [amigos] não concordaram", afirmou o advogado. Segundo ele, seu cliente está "bem machucado", e o caso segue sob investigação.

ATAQUES

Os jovens suspeitos são de classe média, e, conforme relatos iniciais, as agressões ocorreram sem motivo aparente. Em dois desses ataques a polícia diz haver indícios de motivação homofóbica. As agressões eram feitas com chutes, socos e até com bastões de luz branca. Duas das vítimas foram socorridas em hospitais da região. Os agressores foram reconhecidos.

Advogados e parentes dos cinco jovens, quatro deles adolescentes de 16 e 17 anos, dizem haver um exagero por parte da polícia e o que houve foi apenas "uma confusão que acabou em agressão". Dois dos ataques ocorreram por volta das 6h30 próximo à estação Brigadeiro do Metrô, na avenida Paulista. Os jovens, segundo a família e advogados, voltavam de ônibus de uma festa em Moema.

De acordo com as vítimas Otávio Dib Partezani, 19, e Rodrigo Souza Ramos, 20, eles estavam próximos a um ponto de táxi quando viram o grupo caminhar na direção de ambos, mas sem demonstrar qualquer agressividade. Mas quando o grupo chegou próximo aos dois iniciou os ataques. O grupo dizia, segundo as vítimas, "Suas bichas", "Vocês são namorados!". Rodrigo fugiu para o Metrô, quando Otávio foi agredido por três rapazes. Logo após essa agressão, o quinteto atacou outro jovem, Luís, 23, que estava com dois colegas. Ele foi ferido no rosto e na cabeça com lâmpadas de bastão. Os colegas não foram agredidos, segundo a polícia. O sobrenome dele foi preservado a pedido dele.

Testemunhas que viram as agressões chamaram a PM e os jovens foram levados para o 5º DP (Aclimação). Por volta das 13h, quando a ocorrência estava sendo registrada como formação de quadrilha e lesão corporal gravíssima, apareceu o lavador de carros Gilberto Felipe Andrade, 18, dizendo ter sido vítima de uma agressão. Ele reconheceu os jovens. Segundo Andrade, ele foi agredido por volta das 3h na avenida Brigadeiro Luís Antônio (região central de SP). Ele disse à Folha que o grupo seguia atrás dele quando um dos adolescentes lhe acertou com um soco na nuca. Os outros rapazes o agrediram em seguida.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/831725-acusados-de-agressao-na-av-paulista-colecionam-expulsoes-de-escolas.shtml

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Escola é depredada e roubada em Carmo de Minas

FERNANDO COSTA - 17 nov. 2010

A Polícia Civil vai investigar o caso de um arrombamento a uma escola estadual ocorrido nessa terça-feira (16), em Carmo de Minas, no Sul de Minas Gerais. De acordo com a Polícia Militar, a corporação foi acionada depois que o diretor da instituição chegou ao local e encontrou portas e janelas arrombadas.

Apesar de portas e janelas terem sido quebradas por toda a escola, a pior situação foi registrada na cozinha, onde alimentos foram jogados no chão, ovos quebrados e atirados nas paredes. Foram levados, segundo a PM, diversos frangos e biscoitos que seriam utilizados na merenda escolar dos estudantes. Um molho de chaves das salas de aula foi encontrado jogado no pátio do estabelecimento escolar. A escola não possui monitoramento de vídeo ou vigia noturno. Não há informações sobre suspeitos.

Fonte: Jornal O Tempo, BH/MG

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

NOTÍCIAS...

Estudante é suspeito de quebrar braços e dentes de professora no RS

FELIPE LUCHETE, DE SÃO PAULO - 12 nov. 2010

Um estudante de um curso técnico de enfermagem em Porto Alegre é suspeito de quebrar os dois braços e seis dentes da orientadora educacional Jane Mauss de Leão Antunes, 57. A Polícia Civil de Porto Alegre (RS) ouvirá o estudante Rafael Soares Ferreira, 25, nesta sexta-feira (12). A agressão ocorreu na tarde de terça-feira (9). Segundo relatos feitos à polícia, Ferreira ficou insatisfeito com a nota de uma prova no curso e começou a ofender uma professora. Ele foi encaminhado à orientadora educacional, para atendimento pedagógico.

Após os dois conversarem por cerca de uma hora e meia, de acordo com o delegado Fernando Soares, o estudante perguntou se a orientadora estava com medo, levantou-se e a agrediu com uma cadeira de ferro. Ela ainda foi agredida com socos, pontapés e puxões de cabelo. Antunes foi socorrida por outras pessoas. Ferreira fugiu. Ele ainda agrediu um segurança e um porteiro na fuga.

Ainda de acordo com a polícia, ele disse na escola que é lutador e instrutor de artes marciais. O suspeito responderá por tentativa de homicídio. O delegado diz que decidirá no fim do dia se irá pedir a prisão dele à Justiça. A reportagem não conseguiu falar com o estudante. Ele se apresentou à polícia na manhã de hoje, mas retornará à tarde, acompanhado de advogado. Em nota, a escola Factum, onde ocorreu a agressão, informou que "acompanhará incansavelmente os desdobramentos junto à polícia e ao Ministério Público para que este fato não fique impune".

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/829730-estudante-e-suspeito-de-quebrar-bracos-e-dentes-de-professora-no-rs.shtml

MONTEIRO LOBATO


"No fundo não sou literato, sou pintor. Nasci pintor, mas como nunca peguei nos pincéis a sério, arranjei, sem nenhuma premeditação, este derivativo de literatura, e nada mais tenho feito senão pintar com palavras" - Carta a Godofredo Rangel, Areias, 6/7/1909.

"Há dois modos de escrever. Um, é escrever com a idéia de não desagradar ou chocar ninguém (...) Outro modo é dizer desassombradamente o que pensa, dê onde der, haja o que houver - cadeia, forca, exíli" - Carta a João Palma Neto, São Paulo, 24/1/1948.

"No fundo, o que há contra mim é inveja em conseqüência de minha vitória comercial nas letras. Até o fim do ano, passo dos 2 milhões em minhas tiragens". Carta a Jaime Adour da Câmara, São Paulo, 10/5/1946.

"Tudo é loucura ou sonho no começo. Nada do que o homem fez no mundo teve início de outra maneira - mas já tantos sonhos se realizaram que não temos o direito de duvidar de nenhum" - Mundo da Lua, 1923.

"Nunca no mundo uma bala matou uma idéia".

OPINIÃO


Caras (os) Colegas:

O recente episódio envolvendo a obra de Monteiro Lobato deixa patente a lógica de funcionamento da liberdade de imprensa em nosso país. Conforme vocês poderão avaliar a partir da leitura do texto do parecer emitido pelo Conselho Nacional de Educação; em momento algum faz-se menção à censura ou veto ao texto do escritor. A imprensa - leia-se Rede Globo - foi quem interpretou o parecer a partir de seus interesses mais imeditos e difundiu aos quatro cantos que o parecer propõe a censura à obra literária, alardeando que até mesmo haveria o recolhimento da obra das bibliotecas escolares.

A proposta do parecer alerta para a necessidade de recontextualização da obra e enfatiza a necessidade de se trabalhar a formação de professores para que a obra não seja vista como mais um veículo de reprodução e reforço de estereótipos que posicionam as pessoas negras na condição de subalternidade no complexo processo de desenvolvimento das relações raciais em nosso país. O que se sutenta no texto é que, da mesma forma que há na versão da obra analisada pelo Conselho Nacional de Educação alusões quanto à necessidade de preservar a "onça pintada" do extermínio, dado o avanço de nossa consciência ambiental, há que se fazer referência aos avanços trilhados pela sociedade, desde a Constituição até a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, alterada pelas leis 10.639/03 e 11.645/08, no sentido de condenar a prática do racismo.

Percebe-se que esse exercício da "liberdade de imprensa", ao contrário do que se apregoa, atenta contra a consolidação de valores democráticos e é sintomático que essa interpretação midiática venha a tona justamente no mês em que se comemora o Dia Nacional da Consciência Negra, mobilizando a sociedade em torno de um fato que, a rigor, resulta de uma ficção cuja intenção está muito distante de reconhecer o valor positivo da diversidade étnico-racial brasileira.

José Eustáquio de Brito - Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação e Relações Étnico-Raciais da FaE/UEMG.

QUEM PAGA A MÚSICA ESCOLHE A DANÇA?

Marisa Lajolo*

“Caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato, está em pauta e é bom que esteja, pois é um livro maravilhoso. Narra as aventuras da turma do sítio de Dona Benta primeiro às voltas com a bicharada da floresta próxima e, depois, com uma comissão do governo encarregada de caçar um rinoceronte fugido de um circo. Nos dois episódios prevalecem o respeito ao leitor, a visão crítica da realidade, o humor fino e inteligente.

Na primeira narrativa, a da caçada da onça, as armas das crianças são improvisadas e na hora agá não funcionam. É apenas graças à esperteza e inventividade dos meninos que eles conseguem matar a onça e arrastá-la até a casa do sítio. A morte da onça provoca revolta nos bichos da floresta e eles planejam vingança numa assembléia muito divertida: felinos ferozes invadem o sítio e – de novo - é apenas graças à inventividade e esperteza das crianças (particularmente de Emília) que as pessoas escapam de virar comida de onça.

Na segunda narrativa, a fuga de um rinoceronte de um circo e seu refúgio no sítio de Dona Benta leva para lá a Comissão que o governo encarregou de lidar com a questão. Os moradores do sítio desmascaram a corrupção e o corpo mole da comissão, aliam-se ao animal cioso da liberdade conquistada e espantam seus proprietários. E, batizado Quindim, o rinoceronte fica para sempre incorporado às aventuras dos picapauzinhos.

Estas histórias constituem o enredo do livro que parecer recente do Conselho Nacional de Educação (CNE), a partir de denúncia recebida, quer proibir de integrar acervos com os quais programas governamentais compram livros para bibliotecas escolares. O CNE acredita que o livro veicula conteúdo racista e preconceituoso e que os professores não têm competência para lidar com tais questões. Os argumentos que fundamentam as acusações de racismo e preconceito são expressões pelas quais Tia Nastácia é referida no livro, bem como a menção à África como lugar de origem de animais ferozes.

Sabe-se hoje que diferentes leitores interpretam um mesmo texto de maneiras diferentes. Uns podem morrer de medo de uma cena que outros acham engraçada. Alguns podem sentir-se profundamente tocados por passagens que deixam outros impassíveis. Para ficar num exemplo brasileiro já clássico, uns acham que Capitu (D. Casmurro, Machado de Assis, 1900) traiu mesmo o marido, e outros acham que não traiu, que o adultério foi fruto da mente de Bentinho. Outros ainda acham que Bentinho é que namorou Escobar...!

É um grande avanço nos estudos literários esta noção mais aberta do que se passa na cabeça do leitor quando seus olhos estão num livro. Ela se fundamenta no pressuposto segundo o qual, dependendo da vida que teve e que tem, daquilo em que acredita ou desacredita, da situação na qual lê o que lê, cada um entende uma história de um jeito. Mas essa liberdade do leitor vive sofrendo atropelamentos. De vez em quando, educadores de todas as instâncias – da sala de aula ao Ministério de Educação- manifestam desconfiança da capacidade de os leitores se posicionarem de forma correta face ao que lêem.

Infelizmente, estamos vivendo um desses momentos. Como os antigos diziam que quem paga a música escolhe a dança, talvez se acredite hoje ser correto que quem paga o livro escolha a leitura que dele se vai fazer. A situação atual tem sua (triste) caricatura no lobo de Chapeuzinho Vermelho que não é mais abatido pelos caçadores, e pela dona Chica-ca que não mais atira um pau no gato-to. Muda-se o final da história e re-escreve-se a letra da música porque se acredita que leitores e ouvintes sairão dos livros e das canções abatendo lobos e caindo de pau em bichanos. Trata-se de uma idéia pobre, precária e incorreta que além de considerar as crianças como tontas, desconsidera a função simbólica da cultura. Para ficar em um exemplo clássico, a psicanálise e os estudos literários ensinam que a madrasta malvada de contos de fada não desenvolve hostilidade conta a nova mulher do papai, mas – ao contrário- pode ajudar a criança a não se sentir muito culpada nos momentos em que odeia a mamãe, verdadeira ou adotiva...

Não deixa de ser curioso notar que esta pasteurização pretendida para os livros infantis e juvenis coincide com o lamento geral – de novo, da sala de aula ao Ministério da Educação - pela precariedade da leitura praticada na sociedade brasileira. Mas, como quem tem caneta de assinar cheques e de encaminhar leis tem o poder de veto, ao invés de refletir e discutir, a autoridade veta. E veta porque, no melhor dos casos e muitas vezes com a melhor das intenções, estende suas reações a certos livros a um numeroso e anônimo universo de leitores...

No caso deste veto a “Caçadas de Pedrinho”, Conselheira Relatora Nilma Lino Gomes acolhe denúncia de Antonio Gomes da Costa Neto que entende como manifestação de preconceito e intolerância de maneira mais específica a personagem feminina e negra Tia Anastácia e as referências aos personagens animais tais como urubu, macaco e feras africanas; (...) aponta menção revestida de estereotipia ao negro e ao universo africano, que se repete em vários trechos do livro analisado e exige da editora responsável pela publicação a inserção no texto de apresentação de uma nota explicativa e de esclarecimentos ao leitor sobre os estudos atuais e críticos que discutam a presença de estereótipos na literatura.

Independentemente do imenso equívoco em que, de meu ponto de vista, incorrem o denunciante e o CNE que aprova por unanimidade o parecer da relatora, o episódio torna-se assustador pelo que endossa, anuncia e recomenda de patrulhamento da leitura na escola brasileira. A nota exigida transforma livros em produtos de botica, que devem circular acompanhados de bula com instruções de uso.

O que a nota exigida deve explicar? O que significa esclarecer ao leitor sobre os estudos atuais e críticos que discutam a presença de estereótipos na literatura? A quem deve a editora encomendar a nota explicativa? Qual seria o conteúdo da nota solicitada? A nota deve fazer uma auto-crítica (autoral, editorial?), assumindo que o livro contém estereótipos? A nota deve informar ao leitor que “Caçadas de Pedrinho” é um livro racista? Quem decidirá se a nota explicativa cumpre efetivamente o esclarecimento exigido pelo MEC?

As questões poderiam se multiplicar. Mas não vale a pena. O panorama que a multiplicação das questões delineia é por demais sinistro. Como fecho destas melancólicas maltraçadas aponte-se que qualquer nota no sentido solicitado – independente da denominação que venha a receber, do estilo em que seja redigida, e da autoria que assumir - será um desastre. Dará sinal verde para uma literatura autoritariamente auto-amordaçada. E este modelito da mordaça de agora talvez seja mais pernicioso do que a ostensiva queima de livros em praça pública, número medonho, mas que de vez em quando entra em cartaz na história desta nossa Pátria amada idolatrada salve salve. E salve-se quem puder... pois desta vez a censura não quer determinar apenas o que se pode ou não se pode ler, mas é mais sutil, determinando como se deve ler o que se lê!

* Marisa Lajolo - Profª Titular (aposentada) da UNICAMP. Profª da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pesquisadora Senior do CNPq. Organizadora, com João Luís Ceccantini do livro de Monteiro Lobato livro a livro (obra infantil), obra que recebeu o Prêmio Jabuti 2010 como melhor livro de não ficção. Texto enviado pela Professora Maria Cristina da Silva.

MUNDO INFANTIL: reflexões sobre a mídia e sexualidade


por Carla Brittes, Cássia Rocha, Luís Augusto, Paloma Toche, Raquel Barbosa, Simone Moura, Tamires Godoy*

Cada vez mais tem-se observado o excessivo número de comerciais de TV, programas infantis, desenhos animados e jogos eletrônicos carregados de apelos eróticos, de violência e atitudes antiéticas. De acordo com Marcos Nisti (2010), coordenador da campanha “Semana do desligue a TV”, 98% dos lares brasileiros tem televisão.

Conforme artigo publicado pelo site Socialtec, “Erotismo infantil nos programas de TV” de Márcio Ruiz Schiavo professor especialista em marketing social, das 150 crianças entrevistadas por ele, 47,3% manifestaram assistir TV mais de 4 horas diárias e 18,6% assistem mais de 3 horas diárias. Este dado é bastante preocupante. Além dos programas ditos infantis as crianças assistem novelas, programas de humor, séries, entre outras atrações que não são apropriados para determinadas idades.

Nessa atmosfera de desinformação, há algum tempo, surgiu a tendência de se confundir sexualidade com ato sexual e, até mesmo, com o coito. Dessa forma, a discussão sobre sexualidade é alijada do seu verdadeiro percurso, tomando rumos que vão desde o tom da brincadeira à libertinagem. Além disso, para maximizar a confusão no entendimento do assunto, o termo amor, que define um sublime sentimento, é utilizado como sinônimo de ato sexual.

Há que se esclarecer que sexualidade não pode, e nem deve, ser confundida e definida como ato sexual e/ou coito. Sexualidade é o termo que se refere ao conjunto de fenômenos da vida sexual de um ser humano. Ela é um dos aspectos centrais de nossa personalidade e, por meio da qual nos relacionamos com o outro. O ato sexual pode ser definido como qualquer ato que envolva a sexualidade, tais como um toque, um afeto, carícia, olhar, variantes sexuais e até mesmo a penetração. Já o coito é o termo correto para se definir a penetração propriamente dita, a qual muitos confundem como sexo ou ato sexual único (CHAUÍ, 1984).

Muito mais do que o simples debate sobre educação sexual, utilizado muitas vezes apenas para afirmar a diferença dos gêneros, a discussão sobre sexualidade deve ser tratada de forma séria, necessária e sem preconceitos dentro e fora da escola.

A erotização precoce, estimulada de diversas formas, exige do educador atenção redobrada. É urgente a percepção em relação aos desenhos, jogos eletrônicos, filmes e revistas que trazem ora disfarçados, ora explícitos, personagens sensuais que atuam subliminarmente no inconsciente infantil.

Expostos constantemente durante a programação da TV, propagandas, cartazes, etc., a estes estímulos que relacionam amor/sexo, adultos e crianças naturalizam esta relação e legitimam comportamentos sexuais precoces, acreditando-os como manifestação da sensibilidade. Atentando para este fato, observamos como os “marqueteiros” e os profissionais da mídia se utilizam desta associação para despertar o interesse de consumo em seus espectadores e promover produtos. Sendo agentes passivos na relação mercado versus consumidor, as crianças passam a ser alvo fácil para se atingir os interesses comerciais escusos de certas empresas que, se aproveitando de personagens “inocentes”, estimulam o consumo associado à satisfação de necessidades sentimentais.

A televisão é um dos meios de comunicação de maior acesso e por isso é também o principal veículo de estímulo ao processo de erotização na infância. A grade de programação dos canais vem sempre recheada de sexo, mulheres bem aparentadas e produtos para comprar. A mídia, nos dias atuais, parece se resumir a isso e, não raro, três coisas estão interligadas cabendo ainda dizer que tais temas não estão manifestos apenas em programas adultos, mas também nos infantis.

Como a primeira aprendizagem da criança é através da imitação, ela internaliza todos os conceitos passados e, se não houver um acompanhamento pedagógico, é claro, ocorrerá uma reprodução desses valores. Marta Kohl (1999) deixa claro como a criança, ao brincar (brincadeira de faz-de-conta), imita o adulto e se comporta de forma avançada a sua idade. Sendo assim, a criança tem o adulto como o seu modelo.

Pode-se observar também que os estímulos eróticos e as referências de gênero com cunho machista são recorrentes nos programas infantis, os quais têm suas atrações apresentadas por mulheres bem apresentadas, maquiadas e com pouca roupa reforçando o mito que o papel feminino na sociedade é o de educar e entreter. As apresentadoras impõem um padrão de beleza que influencia no modo de como a criança quer vestir e ser. Beleza, charme e sensualidade: requisitos básicos para se dar bem na vida. Nota-se que conhecimento intelectual não está na lista.

As meninas vêem seu corpo não apenas como fonte de prazer, mas também de consumo e status social. É muito simples perceber por que isso ocorre, uma vez que o corpo feminino há muito faz parte da exposição banalizada, considerada natural e bela pela mídia. Os meninos absorvem isso com a ideia de que a mulher também é um produto a ser consumido e, caso este tenha algum problema, basta trocar a marca.

A sexualidade é vista somente pelo lado sensual, erótico e excitante, enquanto deveria ser canalizada para a construção de emoções, relações pessoais e afetividade. O brincar, que é típico dessa fase, já não existe, o importante é parecer adulto e adotar os valores da idade decadente. As crianças são “anãzinhas” e daqui a pouco, num retrocesso histórico, o termo “infância” caíra por terra. Tais valores são recorrentes nas programações, visto que a maior parte do dia, a criança fica com a “babá eletrônica”, pois, os pais, cada dia mais atarefados, com menos tempo para se dedicar a seus filhos, muitas vezes desconhecem o conteúdo da programação televisiva ou não refletem sobre o assunto. Assim, sem a intervenção deles ou de outro adulto consciente, as crianças nem sempre capazes de escolher algo adequado, acabam por ficarem horas expostas a uma quantidade absurda de estímulos eróticos, como por exemplo, apresentação de dançarinos de axé, cenas de orgia em clipes musicais, corpos turbinados e flexíveis, criminalidade e violência. Além disso, ainda tem os jogos eletrônicos, os quais apresentam cenas de sexo, de assassinato e assaltos à mão armada.

Diante desta realidade é urgente que educadores percebam como esta naturalização da lascívia vem adentrando o contexto escolar a partir das manifestações culturais. Crianças em danças com excesso de sensualidade, músicas com conteúdo ofensivo, roupas que estimulam o desejo sexual, são coisas aceitas em nome de uma “abertura cultural” às vezes mal interpretada.

Talvez a resistência às investidas da TV seja muito dura e o modismo tente nos engolir. Contudo, no dia adia da sala de aula, ao conhecer cada criança com a qual se lida, que o educador possa descobrir o ponto chave para se atingir realmente a sensibilidade daquele ser que busca, nas interações com seus semelhantes, o desenvolvimento por completo.


Referências

CHAUÍ, Marilena. Repressão sexual: essa nossa (des)conhecida. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1984.

NISTI, Marcos. A TV não é o único meio que liga as pessoas ao mundo. Disponível em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos - Acesso em: 12 jun. 2010.

OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sócio-histórico. 4. ed. São Paulo: Ed. Scipione, 1999.


* - Este artigo tem por objetivo despertar no leitor uma visão crítica relacionada à forma como a sexualidade é tratada atualmente no contexto escolar. Foi elaborado pelos estudantes a partir de discussões realizadas no III Núcleo Formativo do curso de Pedagogia, da Faculdade de Educação (FAE) da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), quando foram debatidos temas relacionados a “Criança na idade da mídia”. O artigo foi recentemente publicado na Revista "Elas por Elas", do Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010.