quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Educação sem recursos


Na pior escola de São Paulo segundo o Ideb, pais se revezam na segurança

THIAGO AZANHA (COLABORAÇÃO PARA A FOLHA)
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A pior escola de São Paulo sofre com falta de segurança e funcionários para monitorar os alunos e até com fezes de pombos. O colégio estadual Jardim Esperança, com Ideb 2,1 no nono ano, está na última colocação no Estado.
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Fazendo divisa de muro com a Jardim Esperança, situa-se a escola estadual Maria Peccioli Giannasi. Ela tem o dobro da numeração no Ideb: 4,2. Segundo relatos dos pais, os alunos com mau desempenho na Peccioli são transferidos para a escola vizinha.
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"A direção não deu nenhuma explicação quando fez a transferência do meu filho", diz Claudia Besto, mãe de menino que estuda no sexto ano do Esperança.
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Devido à falta de profissionais fazendo a segurança na entrada e saída dos alunos, os próprios pais se revezam na tarefa de monitorar e evitar possíveis brigas. "Os pais de alunos se juntaram e fizeram um grupo para dar mais segurança, mas tenho medo", diz Maria Inês Monteiro.
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De acordo com a Secretaria da Educação, a escola possui equipe terceirizada de limpeza e haverá averiguação das condições de higiene no local.
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Informou também que não procede a alegação de que alunos com baixo rendimento são transferidos para lá e que a Ronda Escolar desenvolve ações preventivas no local.
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Após denúncias no Facebook, escola de Isadora será reformada

A página de Isadora Fabor, 13 anos, no Facebook, criada para denunciar problemas na escola Foto: Reprodução
A página de Isadora Fabor, 13 anos, no Facebook, criada para denunciar problemas na escolaReprodução
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RIO — A Secretaria municipal de Educação de Florianópolis anunciou, nesta terça-feira, que vai reformar a Escola Básica Maria Tomázia Coelho, no Santinho, Norte da Ilha de Santa Catarina. As más condições do estabelecimento de ensino foram denunciadas pela aluna Isadora Faber, 13 anos, na página “Diário de Classe” no Facebook, que já foi curtida por mais de 140 mil pessoas.
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“Essa página veio inclusive nos auxiliar no monitoramento da escola. É uma espécie de ouvidoria”, afirmou a secretária de Educação, Sidneya Gaspar de Oliveira, em reunião para avaliar as reclamações. Sidneya caracterizou ainda a iniciativa de Isadora como “brilhante” e “saudável”.
Segundo informações divulgadas na página da secretaria, a diretora da escola, Liziane Diaz Farias, assumiu a responsabilidade pela gestão deficitária. “Eu assumo publicamente que ocorreu fragilidade na administração do estabelecimento. Vamos a partir de agora trabalhar de forma diferente a parte administrativa e a preservação do patrimônio público”, disse.
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Apesar das reclamações sobre o ensino, a Escola Básica Maria Tomázia teve nota 6,1 nos primeiros anos do ensino fundamental no Ideb, superando a média nacional, que foi 5 .
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A diretora anunciou que fará um apelo à Associação de Pais e Professores para que ajudem principalmente no cuidado com a estrutura física. Haverá também campanhas para que os alunos se conscientizem da necessidade de se engajarem no zelo de todo o ambiente escolar. “Os alunos tem que saber que a participação deles é fundamental para preservar um bem público”. Além disso, coloca, que vem participando de formação para criar o Conselho Escolar, que auxiliará na manutenção do estabelecimento e na gestão administrativa, pedagógica e financeira. De acordo com a Secretaria de Educação, a manutenção na escola teria começado já nesta terça-feira.
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Dilma sanciona Lei de Cotas para ingresso em universidades federais

 
.Presidente Dilma e a ex-deputada Nice Lobão, uma das idealizadoras do projeto
que criará cotas sociais em todas as universidades federais do paísAndré Coelho
- Agência O Globo
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Presidente Dilma e a ex-deputada Nice Lobão, uma das idealizadoras do projeto que criará cotas sociais em todas as universidades federais do país
Foto: André Coelho / Agência O Globo
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BRASÍLIA. A presidente Dilma Rousseff sancionou nesta quarta-feira a Lei das Cotas, que destina 50% das vagas nas universidade federais para alunos de escolas públicas. O texto sofreu apenas um veto, no artigo segundo, que estabelecia que o critério de seleção dos alunos cotistas seria o Coeficiente de Rendimento, obtido por meio da média das notas obtidas no ensino médio. Com o veto, o critério passa a ser a nota obtida no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), como defendia o MEC.
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Em cerimônia fechada, com a presença dos ministros da Educação, Aloizio Mercadante, e da Igualdade Racial, Luiza Bairros, além de parlamentares que participaram da elaboração e aprovação do projeto no Congresso, Dilma ressaltou o “desafio” de democratizar o acesso ao ensino superior mantendo um alto nível de ensino e a “meritocracia”.
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- A importância desse projeto e o fato de nós sairmos da regra e fazermos uma sanção especial tem a ver com um duplo desafio. Primeiro, é a democratização do acesso às universidades e, segundo, o desafio de fazer isso mantendo um alto nível de ensino e a meritocracia. O Brasil precisa fazer face a esses dois desafios, não apenas a um. Nada adianta eu manter uma universidade fechada e manter a população afastada em nome da meritocracia. Também de nada adianta eu abrir universidade e não preservar a meritocracia. Por isso, hoje nós estamos aqui celebrando, num momento, duas ações: uma pelo mérito e outra pela democratização do acesso à universidade brasileira -, disse.
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Pela lei, em até 4 anos, os estudantes oriundos do ensino público terão direito a metade das vagas nas universidade federais. Atualmente, 88% dos alunos do ensino médio no Brasil frequentam a rede pública. São 891 mil, contra 246 mil em escolas privadas. A norma ainda terá de ser regulamentada, até o final do ano, segundo o ministro da Educação, para estabelecer cronograma de implantação, procedimentos e regras. O preenchimento das vagas, de acordo com Mercadante, será feito de forma gradativa e terá início já no próximo vestibular.
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- Serão 150 mil vagas em até 4 anos. A política de cotas para o ensino público irá representar uma grande motivação para esses alunos. E isso vai ser positivo porque temos o grande desafio de melhorar o ensino médio público -, disse o ministro, que reconheceu que a implementação de cotas é “um desafio” para a meritocracia.
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A ministra da Igualdade Racial, Luiza Bairros, afirmou que a lei foi “um grande passo” para as ações afirmativas nas universidades e que a regra vai assegurar que as vagas reservadas para negros cheguem a um total de 56 mil em quatro anos. Hoje, a reserva para negros nas universidade federais é de 8,7 mil vagas.
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- A lei vai garantir cotas para negros independentemente da classe social e isso é importante para assegurar diversidade racial. O politicamente possível no Brasil, hoje, ainda é a associaçaõ de cotas éticas e raciais. Mas a presidente ressaltou que a lei não coloca em risco a meritocracia e sim, assegura a democracia, que é essencial
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terça-feira, 28 de agosto de 2012

Garota de 13 anos mostra condições de sua escola no facebook

Da redação de O Tempo (MG)
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Isadora Faber é uma garota de 13 anos que resolveu contar como as coisas em sua escola em Florianópolis iam indo. Em julho deste ano ela criou a página Diario de Classe no Facebook, a página começou com Isadora postando coisas como falhas de manutenção e problemas do dia a dia. Hoje ela já tem mais de 9 mil seguidores.
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Em entrevista ao jornal estado de São Paulo, a mãe de Isadora conta que a filha tem sofrido represálias na escola por ter mostrado suas falhas. Ela não conta com o apois nem da direção da escola nem dos professores. Isadora diz que será jornalista quando crescer.
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Observação: A foto é reprodução do facebook e publicada pelo jornal
 
 

Operação vai apurar 1.500 casos de abuso infantil

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Lucas Simões
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Começou ontem uma megaoperação da Polícia Civil para apurar cerca de 1.500 denúncias e inquéritos ainda sem solução envolvendo casos de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes em Belo Horizonte. Os trabalhos têm a intenção de concluir, até meados de outubro, 500 inquéritos que se arrastam em delegacias - alguns iniciados há mais de dez anos.
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A delegada Tânia Darc Vieira, chefe do Departamento de Investigação, Orientação e Proteção à Família, ressaltou que houve aumento no número de casos de abuso sexual infantil, mas não revelou dados estatísticos. Ontem, foram analisados 30 casos e ouvidas cerca de cem pessoas na delegacia. Pelo menos três suspeitos deverão ter mandados de prisão ou busca e apreensão solicitados à Justiça ainda nesta semana, segundo a delegada. Denominada Anti-Herodes, a operação é composta por três diferentes frentes. Na primeira, serão verificadas 500 denúncias de exploração sexual feitas de forma anônima e que ainda não puderam ser analisadas.
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A segunda frente terá a competência de dissecar cerca de mil inquéritos pendentes. "Muitas vezes, as vítimas têm idades entre 1 e 3 anos, e a família não quer submeter a criança a um exame de corpo de delito ou tem medo do agressor, que, em muitos casos, mora na mesma casa. Isso tudo dificulta os trabalhos", explica a delegada.
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Prevenção. A terceira etapa da terá como foco montar operações preventivas em motéis, drive-ins, casas noturnas e outros locais em que existam indícios de favorecimento à prostituição infantil, como o alto da avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte, local em que haverá atuação policial, segundo Tânia.
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Números. Ao todo, mil pessoas participam da Operação Anti-Herodes, incluindo membros do Ministério Público e do Juizado da Infância e da Juventude.
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O projeto conta com o apoio de 200 policiais civis, 200 militares e 30 escrivães.
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Fonte: O Tempo (MG)

A violência contra jovens negros no Brasil

 
por Paulo Ramos
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A cada nova divulgação dos dados sobre homicídios no Brasil a mesma informação é dada: morrem por homicídio, proporcionalmente, mais jovens negros do que jovens brancos no país. Além disso, vem se confirmando que a tendência é um crescimento desta desigualdade nas mortes por homicídios.
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Foto: Luliexperiment/Flickr
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O diagnóstico produzido pelo Governo Federal apresentado ao Conselho Nacional de Juventude – CONJUVE mostra vetores importantes desta realidade, para além dos socioeconômicos: a condição geracional e a condição racial dos vitimizados.Em 2010, morreram no Brasil 49.932 pessoas vítimas de homicídio, ou seja, 26,2 a cada 100 mil habitantes. 70,6% das vítimas eram negras. Em 2010, 26.854 jovens entre 15 e 29 foram vítimas de homicídio, ou seja, 53,5% do total; 74,6% dos jovens assassinados eram negros e 91,3% das vítimas de homicídio eram do sexo masculino. Já as vítimas jovens (ente 15 e 29 anos) correspondem a 53% do total e a diferença entre jovens brancos e negros salta de 4.807 para 12.190 homicídios, entre 2000 e 2009. Os dados foram recolhidos do DataSUS/Ministério da Saúde e do Mapa da Violência 2011.
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Podemos dizer que este tema entrou na cena pública, quando, em 2007, o Fórum Nacional da Juventude Negra – FONAJUNE lançou a campanha nacional “Contra o Genocídio da Juventude Negra”. Em 2008, foi realizada a 1ª. Conferência Nacional de Políticas Públicas de Juventude, e das 22 prioridades eleitas nesta CNPPJ, a proposta mais votada foi a indicada pela juventude negra que tematizava justamente os homicídios de jovens negros.
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Depois de passar CONJUVE, o tema foiabsorvido pelo Executivo, no final de 2010, através da Secretaria de Políticas de Igualdade Racial – SEPPIR, com a realização de uma oficina chamada “Combate à mortalidade da juventude negra”.Com a sucessão presidencial, a pauta – deixada de lado pela SEPPIR, em 2011 – foi reincorporada pela Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), ligada à Secretaria Geral da Presidência da República-SG/PR, em meados de 2011. A SNJ sugeriu que o Fórum Direitos e Cidadania (coordenado pela SG/PR), que reúne os principais ministérios ligados ao tema, tomasse para si a questão. Foi o que aconteceu, a partir da criação de uma Sala de Situação da Juventude Negra dentro do Fórum. A partir daí desencadeou-se uma agenda nos moldes participativos para o desenvolvimento de propostas que agissem pela redução da violência contra a juventude negra.
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Problema velho, soluções inovadoras
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Esta pauta, de início, podemos sugerir que possui um caráter especialmente participativo. Pois inicia-se com uma Conferência de participação social e passa a ser discutido pelo Conjuve. Depois, quando chega ao executivo, mantém este formato de discussão. O problema a ser enfrentado é bem complexo. Até hoje algumas iniciativas que dialogam com este público de juventude negra. Entretanto, existe uma dissonância entre elementos fundamentais para o êxito de uma ação que vise combater os homicídios de jovens negros. Para estas políticas, quando há orçamento, não há reconhecimento de diferenças; quando o projeto aborda a juventude negra, não há recursos. E quando há reconhecimento com recursos, não existe foco nos jovens mais vulneráveis.
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Assim, esta agenda deve ser trabalhada pelo poder público a partir de duas concepções distintas de políticas públicas e a partir de uma noção convergente de direitos, pois o direito à vida de certa juventude (a juventude negra) e elaborada a partir do reconhecimento de diferenças. Mas que o Estado Brasileiro através de seus quadros burocráticos, muitas vezes reluta em fazê-lo.
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Uma delas a chamada transversalidade, que defende que as políticas públicas devem ser caracterizadas pelas dimensões que se pretendem reconhecer (racialmente, por gênero etc.). A outra maneira pela qual as políticas setoriais vêm sendo tratadas é pela ação afirmativa. Esta defende que é preciso criar políticas emergenciais, combinas às estruturantes para públicos específicos (negros, jovens, mulheres).
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As políticas chamadas transversais carregam consigo um dilema sobre a sua autoria. Se elas devem estar em todos os campos da ação pública, quem tem o dever de realizá-las? De quem é a responsabilidade de resolver o problema dos homicídios dos jovens negros no interior de um governo? A Secretaria Nacional de Juventude, A Secretaria de Políticas de Igualdade Racial? A Secretaria de Segurança Pública?
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Mas o outro lado deste assunto é que ele mostra que ações relacionadas a este tema podem partir de outros atores que não apenas o Ministério da Justiça e que o tema dos homicídios é apropriado por outros setores da sociedade e do Estado que não são os tradicionalmente ligados ao tema.
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Entretanto, antes que um ou outro ministério assuma esta tarefa, é necessário ultrapassar uma barreira que muito se vê Brasil a fora: deve-se fincar as ações de promoção de direitos e tratar o seu público “alvo” desta vez como sujeito de direitos e não como “jovens problemas”. Isso é uma tendência que os setores organizados da sociedade civil vêm defendendo, há anos, e que agora devem chegar às políticas que ligam juventude à violência. Do que decorrerá outro ponto inovador: os jovens são tratados com vítimas e não mais como os vitimizadores.
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Acredito ser este um bom exemplo de como a participação social e a abertura do processo de elaboração política para diversos setores da sociedade apontam para a criação de políticas que atendam ao reconhecimento e promoção de novos direitos, com o surgimento de novos arranjos institucionais. Ainda que os problemas sejam tão antigos.
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Paulo Ramos, 31, é especialista em análise política pela UnB e mestrando em sociologia pela Universidade Federal de São Carlos. Foi consultor da UNESCO e da Fundação Perseu Abramo para o tema das relações raciais e de juventude.
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segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Escolas da América Latina precisam avançar no uso de novas tecnologias

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Há cinco ou dez anos, era comum que os sistemas educacionais se preocupassem mais com o conteúdo de seus programas acadêmicos do que com a forma de transmiti-los aos alunos. No entanto, o boom tecnológico dos últimos anos, com a democratização dos computadores e a invasão dos smart-phones e tablets, causou um salto na rotina de inúmeras casas e terminou com o script tradicional da relação entre lares e escolas.
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Essa realidade traduz o problema que se colocou na maioria das escolas públicas e, em alguns casos, privadas. Como os alunos fora do horário de aula mantêm, às vezes, um vínculo patológico com a tecnologia, as salas de aula tradicionais transformaram-se em espaços próprios do tempo das cavernas.
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Levantamento feito em conjunto pelos 11 jornais do Grupo de Diários América (GDA), do qual O GLOBO faz parte, revela que, apesar de cada país estar num estágio diferente na corrida tecnológica, há problemas comuns em quase toda a região. Entre eles destacam-se o ainda baixo acesso a computadores e à internet nas escolas e a falta de capacitação dos professores para usar ferramentas tecnológicas. No caso do México, por exemplo, de um total de 198.896 escolas públicas no nível básico — elementar médio e superior ou primário e secundário —, 84.157 têm computadores, de acordo com estatísticas do governo.
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— No entanto, apenas duas de dez escolas estão conectadas à internet — afirmou Nurit Carballo Martinez, do jornal “El Universal”.
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As mesmas estatísticas mostram que, até junho de 2011, havia um computador para cada 25 usuários no México.
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Na Colômbia, o programa governamental “Computadores para a educação” — iniciativa responsável por proporcionar equipamentos, conexão, softwares educacionais e formação de professores em relação ao uso da tecnologia e da internet para o ensino — tem sido capaz de beneficiar mais de sete milhões de crianças em todo o país, em 28 mil escolas públicas. Porém, ainda existem oito mil escolas que sequer têm um computador.
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Na Argentina, o quadro não é mais animador. Os últimos dados disponíveis no Ministério da Educação daquele país indicam que, em média, existem 40 alunos para cada computador nas escolas argentinas, e somente 29% têm acesso à internet. Enquanto isso, no Brasil a estimativa é de que a média seja de 23 computadores por escola e que, destes, 18 estejam em funcionamento para atender 800 alunos.
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No Peru, onde a população escolar ronda os nove milhões, só 19,8% dos estudantes de educação primária usam a internet. O mais alarmante é o lugar de acesso: apenas 8,3% das pessoas a partir dos 6 anos o faz na escola. Outros 56,1% acessam a internet em cabines públicas e mais 36%, em casa. No Chile, 9.680 escolas recebem subvenção estatal para usar tecnologia. Ainda assim, só 22 mil dos 140 mil docentes do sistema público estão capacitados para tal.
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O Brasil ilustra bem o problema da capacitação docente para usar a tecnologia. Pesquisa com mais de 1.500 professores, divulgada em 2011 e feita pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), revelou que, para 64%, os alunos têm mais conhecimento que eles sobre o uso de novas tecnologias de informação, e 28% ainda preferem os métodos tradicionais de ensino. A NIC.br é uma entidade civil que implementa as decisões e projetos do Comitê Gestor da Internet no Brasil.
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Um avanço considerado único na região foi o Plano Ceibal, desenvolvido pelo governo do Uruguai entre 2005 e 2010, que entregou um laptop a cada aluno das escolas públicas, maioria naquele país. Depois do projeto, quatro em cada dez lares com computador têm um do Plano Ceibal, o que significa 70% de penetração em nível nacional. Segundo a consultoria Radar, entre 2001 e 2010 a inserção de PCs nas casas cresceu 85% em Montevidéu e 215% no resto do país. O acesso a um PC e à internet, no entanto, não está distribuído de maneira equitativa: em lares de nível socioeconômico mais alto, chega a 98%, e, nos de nível mais baixo, a 49%.
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* O Grupo de Diários América (GDA) é integrado por 11 jornais da América Latina: “La Nación” (Argentina), “O GLOBO”, “El Mercurio” (Chile), “El Tiempo” (Colômbia), “La Nación” (Costa Rica), “El Comercio” (Equador), “El Universal” (México), “El Comercio” (Peru), “El Nuevo Día” (Porto Rico), “El País” (Uruguay) e “El Nacional” (Venezuela).

SOS Mulher

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'Um companheiro me disse: 'Não vou morrer mais'. Tínhamos sobrevivido'

Jacob Gorender, jornalista e historiador, lutou na Itália - Evelson de Freitas/AE

Por Edison Veiga e Marcelo Godoy
(Foto de Evelson de Freitas/AE)
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Meu pai era um homem muito pobre e minha mãe também. Eles se uniram já um tanto idosos, com 33 anos e tiveram cinco filhos. Hoje são vivos eu e um segundo. Os outros três faleceram... Meu pai era um homem muito pobre e, apesar de judeu, não sabia fazer dinheiro. Eu passei uma situação muito difícil na infância e na adolescência. Foi difícil estudar. Eu não tinha roupa para frequentar o ginásio. Usava um tênis de última qualidade, furado às vezes. Eu botava um papelão em cima do buraco para poder andar. Comecei a me estabilizar quando me tornei jornalista e passei a ganhar algum dinheiro. Com isso a minha situação começou a ficar estável, pois eu já não dependia da família. Eu devia ter então uns 17 anos. Eu estava no ginásio da Bahia, depois eu sai e fui aluno da Faculdade de Direito até o quarto ano. Aí eu fui para a FEB, fui soldado da FEB e a minha vida deslanchou.
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Depoimento de Jacob Gorender, jornalista e historiador, lutou na Itália
Eu me incorporei em Salvador como voluntário. É preciso compreender o contexto daquela época. Os submarinos alemães torpedearam navios mercantes brasileiros e centenas de brasileiros morreram nesses naufrágios. Isso gerou uma indignação muito grande e eu participei das manifestações em Salvador, onde eu residia. Manifestações contra o Eixo e pela declaração de guerra, o que acabou ocorrendo. Getúlio Vargas, presidente do Brasil, acabou declarando guerra. Aí abriu-se o voluntariado em vários lugares do Brasil. O que ocorreu, um episódio curioso, o general que comandava a região de Salvador – eu me lembro o nome dele: general Demerval Peixoto – fez o seguinte desafio: "Os estudantes que pediam guerra, declaração de guerra tem agora a oportunidade de se apresentar como voluntários". Eu considerei isso como um desafio pessoal e resolvi me apresentar. Fui ao quartel-general e me apresentei e acabei aceito. Já em Salvador fui incorporado e fui transferido para São Paulo, onde fiz algum treinamento. Depois fui transferido para a Itália.
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Na época, eu já era do Partido Comunista. Ele estava meio desagregado naquela época por causa da repressão. Militei com Mário Alves – ele não foi incorporado porque não tinha condições físicas (Alves foi um importante dirigente do PCB e acabou assassinado durante o regime militar). O fato de eu ser comunista – o prestígio da União Soviética, que estava em guerra contra os nazistas – pesou na minha resolução. Quando chegamos à Itália já havia brasileiros em combate. Eu era da companhia de transmissões do 1º Regimento de Infantaria. Nosso comandante era o coronel Caiado de Castro, mais tarde chefe do gabinete militar de Getúlio Vargas. Eu era um simples soldado. Não fui mais do que isso. Era do pelotão de transmissões. Particularmente a minha tarefa e a da equipe a qual eu pertenci era de zelar pelos fios de transmissão, que, como o front estava estabilizado, eram rompidos por granadas. Às vezes éramos obrigados a sair da cama, nós estávamos na casa da camponeses italianos, para consertar o fio. Isso era uma tarefa penosa e perigosa, pois ficávamos expostos à agressividade da artilharia nazista.
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O fato de ser judeu não tinha para mim nada de especial. Eu convivi como soldado igual aos outros. Não teve influência nem positiva nem negativa. Mas eu tinha uma noção de que se eu caísse nas mãos dos nazistas, eles facilmente saberiam que eu era judeu, circunciso, e eu estaria perdido. Não tinha jeito. Vi a queda de Monte Castelo. Eu estava no sopé do monte. O que se deu é que anteriormente as tentativas de tomar monte castelo fracassaram por falta de experiência e insuficiência de tropa, mas naquele momento, em 1945, a tropa americana, que estava ao nosso lado tomou o Monte Belvedere, que ficava a cavaleiro de Monte Castelo, e isso facilitou a tomada do Castelo.
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No fim da guerra testemunhei centenas e centenas de alemães soldados de braços levantados se rendendo. Até hoje eu gravei na memória o episódio de dois oficiais nazistas vestidos a capricho, uniformizados, se rendendo naquela fase final da guerra, para o major Sizeno Sarmento, que era comandante de uma unidade da Força Expedicionária. Eu me lembro desses dois oficiais nazistas claramente o que eles disseram: "Nicht mehr krieg", Não queremos mais guerra.
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Um certo dia tivemos a notícia de que os alemães tinham se rendido incondicionalmente. E aí a guerra foi oficialmente, pelo nosso comando aliado, declarada vencida e terminada. Aí foi uma alegria tremenda. Nós nos abraçamos e cantamos. Foi uma alegria e – é claro – bebida tinha também, pois já não havia mais o perigo de morrermos em combate. Acabou-se esse perigo. Lembro de um companheiro dizendo: "Não vou morrer mais, não vou morrer mais!" Tínhamos sobrevivido. Durante a guerra, a perspectiva de morrer existia. Não vou dizer que não era constante. Mas a gente tinha de superar e se habituar a essa situação e viver para a frente.
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De vez em quando me ocorrem lembranças daquela época... Eu me vejo uniformizado... Andando na lama... Subindo a rampa... Enfim essas coisas de vez em quando voltam à memória. A sensação que isso desperta em mim não é agradável. Eu prefiro não me lembrar... A guerra é sobretudo sujeira, lama, desconforto, perigo, sensação constante de perigo e a perspectiva da possibilidade de morrer.
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Em agosto de 1945 voltei para o Brasil e continuei minha militância. Durante muito tempo no partido havia uma quantidade grande de quadros militares. Apolônio (Apolônio de Carvalho), o Agildo Barata e outros. A presença deles era forte no partido e influenciou. E o fato de Prestes ser um militar. O grande ícone. Ele estava na ocasião ainda preso. Cumpriu dez anos de prisão e era uma lenda, uma figura lendária (Luis Carlos Prestes era o secretário-geral do partido e havia sido preso após o levante comunista de 1935).
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Nasci em 20 de janeiro de 1923. Estou com 89 anos, uma idade interessante. Ao lado de minha militância, a guerra foi uma das mais experiências mais importantes da minha vida. Tive outras: família, enfim, perigos que passei na vida clandestina de militante comunista. Fui preso, torturado. Minha vida teve momentos bons e momentos muito difíceis. Eu acho que atravessei essa trajetória honradamente. Não tenho nada do que me envergonhar. Não delatei. Não coloquei ninguém me perigo. Pra mim isso é honroso. Nem todo mundo pode dizer isso.
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domingo, 26 de agosto de 2012

Prioridades


Calamidade pública

 
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Por Tostão
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Envio minha solidariedade à família do querido goleiro Félix, companheiro na Copa do Mundo de 1970, que morreu nesta sexta-feira.
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O pênalti marcado a favor do Grêmio, contra o Coritiba, que ajudou a classificar o time gaúcho, na Copa Sul-Americana, foi mais um absurdo erro. Kleber, mais uma vez, enganou o árbitro e o comentarista de TV.
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Hoje é dia de clássicos regionais. Ontem, jogariam Santos x Palmeiras e Vasco x Fluminense, este último, paixão de Nelson Rodrigues, que faria, nessa quinta-feira, 100 anos. Em uma entrevista, o maior e mais politicamente incorreto cronista esportivo disse: "O pior cego é o míope. E pior que o míope é o que enxerga bem, mas não entende o que enxerga. Há pessoas, sobretudo jornalistas esportivos, que não têm inteligência visual".
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É cada dia mais comum no Brasil clássicos regionais com apenas uma torcida, como o de hoje, entre Cruzeiro e Atlético, no Independência. A polícia de Minas reconhece a incapacidade de dar segurança aos torcedores. Muito mais que isso, mostra a incapacidade do governo federal, em todo o país. A atual violência social é uma calamidade pública. Os ricos blindam os carros, contratam seguranças, e os pobres não podem passear nem assistir a seus times jogarem. Ficam sitiados, vendo, diariamente, pela TV, tanta violência e tantos crimes. É o inferno!
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A mesma violência social está em volta dos estádios, nas arquibancadas e nos gramados. Ela sempre existiu, mas não era de rotina. Os jogadores, pressionados e até ameaçados, com a obrigação de ganhar de qualquer jeito, como se fosse uma guerra, dão pontapés, trombadas, para mostrar que têm raça. Além disso, são mal-educados, desde as categorias de base. Os treinadores são, no mínimo, omissos. Gritam e reclamam, na lateral do campo, para mostrar que "jogam com o time".
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Quando era menino e adolescente, ia muito com meu pai ao Independência, de ônibus, lotado, com torcedores dos dois times. Outros caminhavam até o estádio, cada um com sua bandeira. Gostava de ficar na fileira de baixo da arquibancada. Via de perto os jogadores, seus gestos, palavras e expressões de alegria, tristeza, medo, raiva. Aprendia que o futebol era muito mais que detalhes técnicos e táticos. "A mais sórdida pelada é de uma complexidade shakespeariana" (Nelson Rodrigues).
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Em uma decisão do título mineiro, entre Siderúrgica e América, Noventa caiu e gritou de dor. O médico do Siderúrgica disse que poderia ser uma fratura, e que ele teria de sair. O truculento técnico Yustrich mandou-o ficar. Noventa, com uma tipoia, fez um dos gols do título. No outro dia, a imprensa só falava nisso. Testemunhei tudo de perto. Deveriam ter me entrevistado.
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Fonte: O Tempo (MG)

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Por uma "nova Roma"?

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Lúcio Alves de Barros*
 
Em tempos que a TV entra em nossa casa e mostra com todas as tintas sujas o vergonhoso jogo do mensalão, sempre vem em minha memória a pergunta simples, clara e honesta de Darcy Ribeiro (1922-1997): “por que o Brasil ainda não deu certo?” O seu último livro, “O povo brasileiro”(Companhia das Letras, 2006) é uma descrição apurada de acontecimentos que feriram a ferro e fogo essa tão bela terra chamada Brasil. Na verdade em toda obra do autor - gigantesca e mágica - encontramos um país que se sustenta na luta, na violência, nas guerras do dia a dia, em meio a uma miscigenação materializada em um racismo perverso e no sangue de tantos índios e negros que selaram esse país transformando-o em um uma espécie única de terra e de povo.
E não é que a coisa continua feia e a pergunta atual? Darcy Ribeiro, um realista e romântico inveterado, não deixa de criticar a velha, doce e histórica desigualdade social, baseada em uma “democracia racial” e na possibilidade da construção de um grande país. Para ele, inclusive, “uma nova Roma”. “Uma Roma tardia e tropical”, uma coisa utópica que enche os olhos de quem lê, mas que causa agonia e mal-estar para aqueles mais avisados que sabem que a ralé brasileira está viva, ainda de pé, mas na realidade entregue a uma sonolência crítica em relação aos rumos que tomam este país aqui e acolá.
De todo modo, o otimismo de Darcy Ribeiro é contagiante. Ele fala de uma unidade nacional, de uma cultura brasileira, de um tecido social único em torno de sociabilidades que se confundem e se consolidam em um curioso mosaico cultural de cores, dores e amores. Uma etnia brasileira, uma nova identidade étnico-racial, a de brasileiros em formação que nos retiraria desta “ninguendade” que nos causa insegurança, pavor e terror. É claro que no Brasil o antropólogo não deixa de mostrar que algumas regiões se formaram a partir de símbolos multiétnicos, mas nada que inviabilizasse a etnia brasileira. Uma etnia única, singular, tolerante e, na mais romântica reflexão, “maravilhosa”. Um verdadeiro paraíso para os que estão por vir. Suas palavras em relação ao nosso mosaico não deixa dúvida: "Por essas vias plasmaram historicamente diversos modos rústicos de ser brasileiros, que permitem distingui-los, hoje como 'sertanejos' do Nordeste, 'caboclos' da Amazônia, 'crioulous' do litoral, 'caipiras' do Sudeste e Centro do país, 'gaúchos' das campanhas sulinas, além de ítalo-brasileiros, nipobrasileiros etc. Todos eles muito mais marcados pelo que têm de comum como brasileiros do que pelas diferenças devidas a adaptações regionais ou funcionais, ou de miscigenação e aculturação que emprestam fisionomia própria a uma outra parcela da população”.
Percebe-se nestas palavras como o autor monta e entende o Brasil como cultura. “Um povo, até hoje em ser, impedido de sê-lo”. Um território à deriva, com grande força para se unificar, crescer, liderar a América Latina e se consolidar como potência. Mas o que fazer com a mais que secular e cruel desigualdade social, a precariedade nas relações de trabalho, sofrimento dos que nada tem e a exploração pura e simples do outro que se acostumou com os privilégios, os latifúndios, a hierarquização das relações e concentração de poder nas elites? O otimismo de Darcy Ribeiro incomoda. Apesar de nossa "urbanização caótica" fomos em frente. Criamos um país periférico economicamente, ridículo socialmente e vergonhoso politicamente. Nossa democracia é uma falácia e Darcy Ribeiro ainda acredita em uma “brasilidade” como identidade reforçando a ideia da emergência - em longo prazo - de uma "nova Roma". Nova, pois é resultado das "dores do parto" provenientes da ganância do branco com o sangue do índio e do negro. Um nascimento singular que deu ao mundo a futura potência almejada por Simon Bolívar.
Darcy Ribeiro faleceu em 1997. Deixou uma obra impressionante e de leitura obrigatória para quem quer conhecer o Brasil. Contudo, e desculpem o desabafo, não é possível acreditar em sua utopia. O antropólogo mineiro até tentou. Atuou na “conscientização” dos menos favorecidos e gritou aos quatro cantos da necessidade da educação como política de governo. Talvez, e propositadamente, não tratou de relatar que entre a “educação ideal” e a "real" a distância é enorme. Temos milhões de analfabetos (cerca de 14 milhões e mais 35 milhões de analfabetos funcionais), outros milhões que não tem sequer acesso a água tratada. Mais que isso, quase metade dos brasileiros não possuem carteira assinada e o desemprego tornou-se natural. Resumindo o argumento, imaginem se fôssemos comentar sobre o direito e o acesso à justiça, a uma saúde ou mesmo a uma vida digna e segura sem o sofrimento e a humilhação diária?
Perdoe-me antropólogo! Neste país tudo é para depois ou em longo prazo. Mas como a frase de Keynes, “a longo prazo eu já morri”. Na realidade nos acostumamos a deixar as coisas acontecerem para depois tomarmos providências. E pasmem! Poucos se responsabilizam pelas consequências. Mas muitos - muitos mesmo - desprezam o dinheiro público, chutam as instituições, buscam privilégios e desrespeitam a alteridade que faz parte deste mosaico cultural delineado em sua obra. É impossível a crença em uma “nova Roma” com professores recebendo salários menores do que juízes, promotores e policiais. É inacreditável um país que deifica autoridades corruptas e que os exalta como celebridades e muito menos em uma nação na qual o outro é moeda de troca e fonte inesgotável de chantagens, maldades, desumanidades, leviandades...
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*- Professor da Faculdade de Educação (FAE/BH/UEMG)
 

Em memória de Amaury de Souza


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Octavio Amorim Neto (EBAPE/FGV-Rio)
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Na madrugada de 17 de agosto de 2012, faleceu, no Rio de Janeiro, Amaury de Souza. Um dos líderes do “esquadrão de ouro” que fundou o IUPERJ e criou a moderna ciência política brasileira – em pleno regime militar –, Amaury deixou inúmeras contribuições à disciplina e à profissão. Fiel à marca da sua geração, nunca abandonou a militância política, vendo nesta o irmão siamês do labor acadêmico. Foi pioneiro em tudo que fez, seja no doutoramento em instituições de elite dos EUA (Amaury foi Ph.D. pelo MIT), na adoção de métodos quantitativos, na análise de pesquisas de opinião, no estudo do planejamento urbano, no uso da computação, como no estabelecimento da atividade de consultor político profissional.
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O pioneirismo de Amaury é um produto nobre do pioneirismo da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, em que, apesar da precariedade dos meios, buscou-se consolidar o ensino das ciências sociais em nível universitário, algo incipiente no país à época. Entre seus colegas dos tempos de graduação que viriam a colaborar decisivamente no estabelecimento da ciência política acadêmica no Brasil estavam Antônio Octávio Cintra (Ph.D. pelo MIT), Bolívar Lamounier (Ph.D. pela UCLA), Fábio Wanderley Reis (Ph.D. por Harvard), José Murilo de Carvalho (Ph.D. por Stanford) e Simon Schwartzman (Ph.D. por Berkeley).
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Amaury não foi apenas politólogo. Além de bacharel em sociologia política, obteve também o diploma de administração, ambos os títulos pela UFMG. Daí ter-se tornado também especialista em consultoria empresarial, atividade a que viria dedicar-se intensamente após desligar-se do IUPERJ em 1987.
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Amaury era, pois, um homem polivalente e, como acadêmico, multitemático. Suas dezenas de artigos e livros versam sobre os mais variados assuntos: política local, sindicalismo, eleições, sistemas eleitorais, sistemas partidários, Congresso, elites, presidencialismo, cultura política, burocracias, consolidação democrática, desenvolvimento político, economia política, política urbana, demografia, reforma política, política externa, política comercial, e a nova classe média.
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Esse rol impressionante de temas é, na verdade, a melhor expressão do que foi a grande vocação de Amaury: a atividade acadêmica. Apesar de ter deixado de ser professor em tempo integral relativamente cedo e passado a dedicar-se à consultoria política e empresarial, Amaury nunca deixou de ser um grande scholar, impecável no seu profissionalismo e na adesão ao estilo de trabalho universitário que aprendera no MIT. Prova disso eram sua insaciável sede por ler tudo de relevante sobre todo assunto que entrava em seu radar, seu interesse por obras clássicas e pelo que escreviam os mais verdes autores, pela atenção aguda a detalhes, pela análise isenta dos dados empíricos apesar das intensas paixões políticas que o animavam, e o fato de estar sempre atualizado com os debates acadêmicos. Não obstante sua pesada agenda de compromissos empresariais e políticos, Amaury sempre impressionava por dominar todas as vertentes que marcavam as áreas de pesquisa que porventura estudasse, como se ainda fosse um recém-doutor cheio de ardor pelo assunto da sua tese. Foi assim até o último dia de vida.
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Evidência eloquente de que Amaury foi sempre um acadêmico é o fato de seus últimos dois livros terem sido publicados há pouquíssimo tempo: A Agenda Internacional do Brasil: A Política Externa de FHC a Lula (Campus, 2009) e A Classe Média Brasileira: Ambições, Valores e Novos Projetos de Sociedade(Campus, 2010), este escrito juntamente com Bolívar Lamounier. De maneira coerente com o que Amaury fez ao longo de sua carreira, essas duas obras já são referências obrigatórias para os principais debates sobre o novo Brasil que nasceu no começo do século XXI.
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O que permitiu uma carreira tão polivalente, multitemática e produtiva? O fato de Amaury combinar uma grande inteligência com um trabalho obsessivo e incansável. Essa foi sua segunda grande marca. Todos aqueles que foram seus alunos ou assistentes aprenderam não apenas a substância do que ele ensinava ou pesquisava, mas também o amor ao trabalho, que transmitia com muito orgulho e carisma. Amaury podia ser também um mestre duro e abrasivo, mas sua generosidade sempre foi muito maior do que suas idiossincrasias. Há hoje uma legião de cientistas sociais que muito deve ao coração de Amaury, entre eles o autor destas linhas.
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Amaury se dedicou de corpo e alma a várias causas. A sua defesa intelectual da democracia representativa, do parlamentarismo, do voto distrital, da economia de mercado e da redução de impostos ficará também como mais uma das suas contribuições à ciência política nacional e à vida política do país.

Infatigável em sua vocação acadêmica, Amaury deu o ponto final ao seu último artigo dois dias antes de partir. Aliás, só se permitiu partir depois de fazê-lo.
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Valeu, Mestre!
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sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Educação e recursos

Educação como necessidade

Corrupto: quem tem o coração corrompido na origem

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Leonardo Boff*
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A indignação generalizada face à corrupção no Brasil e no mundo está dando lugar à resignação e ao descaso. Pois a impunidade é tão vulgarizada que a maioria já descrê de qualquer solução.
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Sobre esse fato, a teologia tem algo a dizer. Ela sustenta que a atual condição humana é dilacerada e decadente (infralapsárica, se diz no dialeto teológico), consequência de um ato de corrupção. Segundo a narrativa bíblica, a serpente corrompeu a mulher; a mulher corrompeu o homem; e ambos nos deixaram um legado de corrupções, a ponto de Deus "ter-se arrependido de ter criado o ser humano na Terra", como nos lembra o texto de Gênesis (6,6). Somos filhos e filhas de uma corrupção originária.
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Alegava-se, nos espaços cristãos, que todo mal deriva dessa corrupção originária, chamada de pecado original. Mas essa expressão se tornou estranha aos ouvidos modernos. Mesmo assim, ouso resgatá-la, pois contém uma verdade inegável, atestada pela reflexão filosófica de um Sartre e mesmo pelo rigorismo filosófico de Kant, segundo o qual "o ser humano é um lenho tão torto que dele não se podem tirar tábuas retas".
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Importa anotar que é um termo criado pela teologia. Não se encontra como tal na Bíblia. Foi santo Agostinho, em diálogo epistolar com são Jerônimo, que o inventou. Com a expressão "pecado original", não pretendia falar do passado. O "original" não tinha a ver com as origens da história humana. Com ela, santo Agostinho queria falar do presente: a atual situação do ser humano, em seu nível mais profundo, é perversa e marcada por uma distorção que atinge as origens de sua existência (daí "original"). Fez a sua filologia da palavra "corrupto": é ter um coração (cor) rompido (ruptus, de rompere).
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Somos portadores, portanto, de uma rachadura interna que equivale a uma dilaceração do coração. Em palavras modernas: somos diabólicos e simbólicos, sapientes e dementes, capazes de amor e de ódio. Mas, por curiosidade, perguntava santo Agostinho: quando ela começou? Ele mesmo responde: desde que conhecemos o ser humano; desde as "origens". Mas ele não confere importância a essa questão. O importante é saber que, aqui e agora, somos seres corruptos, corruptíveis e corruptores. E que cremos em alguém, o Cristo, que nos pode libertar.
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Mas onde se manifesta mais visivelmente esse estado de corrupção? Quem nos responde é o famoso e católico Lord Acton (1843-1902): é nos portadores de poder. Enfaticamente afirma: "Meu dogma é a geral maldade dos homens de poder; são os que mais se corrompem". E fez uma afirmação sempre repetida: "O poder tem a tendência a se corromper, e o absoluto poder corrompe absolutamente". Por que, exatamente, o poder? Porque é um dos arquétipos mais poderosos e tentadores da psique humana; dá-nos o sentimento de onipotência e de nós sermos um pequeno "deus". Por isso, Hobbes, no seu "Leviatã" (1651), nos confirma: "Assinalo, como tendência geral de todos os homens, um perpétuo e irrequieto desejo de poder e de mais poder, que cessa apenas com a morte; a razão disso reside no fato de que não se pode garantir o poder senão buscando ainda mais poder".
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Esse poder se materializa no dinheiro. Por isso, as corrupções a que estamos assistindo envolvem dinheiro. Diz um dito de Ghana: "A boca ri, mas o dinheiro ri melhor".
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Não achamos cura para essa ferida. Só podemos diminuir-lhe a sangria. Creio que vale o método bíblico: desmascarar o corrupto, deixando-o nu diante de sua corrupção, e a pura e simples expulsão do paraíso, quer dizer, tirar o corruptor e o corrompido da sociedade e metê-los na prisão.
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*Teólogo e escritor
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 Fonte: O Tempo (MG)

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Caos e educação

O IDEB

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Fonte Tribuna de Minas (MG)

Abismo separa melhores e piores resultados do Brasil

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RIO - Nas melhores e piores escolas ou redes do país, é fácil perceber o que leva ao caminho do bom aprendizado e o que condena os alunos a um mau desempenho. Nas melhores, há foco nos alunos e participação dos pais. Nas piores, a infraestrutura é precária e ninguém assume a responsabilidade pelos maus resultados.
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Com cerca de 200 alunos, a Escola Municipal Santa Rita de Cássia, em Foz do Iguaçu (PR), recebeu nota 8,6 no Ideb 2011 e empatou com a Escola Municipal Carmélia Dramis Malaguti, de Itaú de Minas (MG), no topo do ranking das melhores escolas públicas para os anos iniciais do ensino fundamental. A diretora Shirlei de Oliveira, que comanda há cinco anos uma equipe de dez professores, uma supervisora e uma secretária — todos com curso superior e pós-graduação —, atribui o sucesso ao trabalho que faz junto aos pais e ao reforço escolar que oferece para todos os alunos. Os que têm boas notas assistem a aulas extras três vezes por semana. Os que têm notas baixas, todos os dias.
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As professoras Maria Isabel Gomes Vieira e Leda Márcia Dal Gin vêem ainda mais um ingrediente na receita do sucesso: dividiram as turmas conforme a afinidade que têm com as disciplinas. Uma ensina português e ciências. A outra, matemática, história e geografia. Um terceiro professor completa o currículo com jogos matemáticos, literatura, dicionário e informática. Na Escola Municipal Carmélia Dramis Malaguti, que fica a 360km de Belo Horizonte e divide o posto de melhor com a Santa Rita de Cássia, o enfoque no aluno também é o que explica o bom resultado.
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— Nossa prioridade é descobrir o que está por trás das dificuldades do aluno. Por isso, a relação olho no olho entre professor e aluno é fundamental — destaca a diretora da escola, Maria Flávia Oliveira.
Se não há receita, há um conjunto de fatores que tem funcionado. A escola subiu 2,6 pontos no Ideb desde 2007. No mesmo período, a prefeitura de Itaú de Minas fez um programa de capacitação de professores que não exige participação, mas valoriza o profissional presente com uma gratificação no fim do ano.
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Outra característica em comum entre as duas melhores escolas do país é a boa relação com os pais. A diretora Carmélia Malaguti diz se orgulhar de telefonar à família no caso de três faltas seguidas. Também costuma encaminhar, para fonoaudiólogos e psicólogos, alunos com dificuldades. Os tratamentos são todos custeados pela prefeitura. Nos anos finais do ensino fundamental, o melhor resultado por escola foi encontrado em Pernambuco, no Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco. O 8,1 do Ideb coroa um espaço que praticamente não tem evasão — só houve uma desistência no ano passado — e exibe percentuais de aprovação que chegam a 98%.
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Além do alto grau de especialização dos profissionais, o CAp estimula os estudantes a monitorar não só o desempenho de suas turmas, como também o dos professores. A iniciativa dá chance aos alunos de reconhecerem suas deficiências e ajuda os professores a descobrir novos caminhos em sala de aula.
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— O que tentamos fazer é criar um ambiente para o aluno aprender junto com o professor, e o professor, junto com ele — diz o diretor do CAp, Alfredo Matos.
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No pior município, precaridade é total
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Do outro lado do espectro, está a cidade de Monteirópolis, situada a 194km de Maceió (AL). É dela a pior rede municipal de educação de todo o país no que diz respeito aos anos iniciais do ensino fundamental. Segundo o Ideb, as cinco escolas da cidade tiveram média 2,3.
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— A estrutura das escolas é precária, a merenda tem problemas. No cardápio de hoje, era arroz com frango, mas só tem bolacha com suco. Nem manteiga ou margarina — conta a professora Rose Braga.
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Segundo ela, além do problema com a merenda, os alunos sofrem também com o cheiro das fezes dos pardais que se acumulam no telhado. Apesar da seca que afetou a cidade neste ano, os alunos não comemoram quando chove:
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— As escolas viram uma cachoeira. Imagine a cena: alunos com fome, mau cheiro de pardais e goteiras.
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Na escola de Rose Braga, a direção prefere não falar sobre o assunto. Na Secretaria municipal de Educação, ninguém atende os telefonemas. O pior resultado entre as redes estaduais de ensino médio também ficou com Alagoas, com nota 3,8 (0,2 a menos do que na pesquisa anterior). O secretário estadual de Educação, Adriano Soares da Costa, promete agir em cinco frentes para reverter a situação. Até outubro, realizará provas para contratar 2.500 professores e mil monitores. Até meados de 2013, reformará as 334 escolas que comanda e, em 60 delas, instalará uma espécie de ponto eletrônico para reduzir a evasão de alunos.
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No caso de escolas, a pior pública dos anos iniciais do ensino fundamental é o Grupo Escolar Dr. Antônio Carlos Magalhães, que fica no município de Cairu, a 83km de Salvador. O 0,9 registrado pela pesquisa causou estranhamento à Secretaria municipal de Educação já que, nas duas últimas edições da pesquisa, o município teve média 3,8. O prefeito Hildécio Meireles acredita que houve um problema isolado, mas já pediu o levantamento dos dados da escola.
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A pior escola pública para os anos finais do ensino fundamental também é baiana: o Colégio Estadual 29 de Março, em Salvador. A Secretaria estadual de Educação do Estado afirmou que houve um erro no preenchimento de dados que fez com que as taxas de aprovação, em vez de serem de 50%, fossem registradas como 3%.

MEC planeja mudanças no currículo do ensino médio

Brasília. O governo federal pretende mudar a grade curricular do ensino médio público e diminuir o número de disciplinas na grade das escolas. O plano de mudança foi desenhado pelo Ministério da Educação após a divulgação dos resultados do Índice Básico de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que mede o desempenho da educação básica nacional.
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Segundo os dados referentes ao ano passado divulgados anteontem, o ensino médio estagnou no país. A nota, que vai de zero a dez, considera o desempenho em português e matemática e também a taxa de aprovação dos estudantes (quantos passaram de ano). Divulgado a cada dois anos, o índice estagnou em 3,4 no ensino médio público, o mesmo indicador de 2009, dentro da meta de 2011, mas muito abaixo dos dez pontos, a nota máxima.
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Na rede privada, por exemplo, a nota média nessa etapa de ensino foi de 5,7. A meta estipulada é de 5,8.
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O Ideb mostra também que o desempenho de estudantes do ensino médio público em português e matemática foi inferior ao atingido por alunos do último ano do fundamental particular. Em matemática, a nota foi 265 pontos na rede pública contra 298 na particular, por exemplo. Durante a divulgação do Ideb, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, reclamou que é grande o número de matérias obrigatórias no ensino médio - atualmente são 13.
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"É uma sobrecarga muito grande. Não contribui para formar melhor o aluno", afirmou. A proposta de redução do currículo nessa etapa do ensino público será apreciada pelo Conselho Nacional de Educação (CNE).
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"O ensino médio atingiu a meta, mas não superou. Esse é o grande desafio do sistema educacional brasileiro. É um problema que temos de enfrentar com prioridade", afirmou o ministro.
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Docentes. Para Mercadante, além dos currículos, as redes responsáveis pela oferta do ensino médio precisam avaliar as dificuldades do ensino noturno (que possui muitos alunos dessa fase, segundo ele) e a falta de investimento na formação continuada dos professores. "Ainda temos muitos docentes que não têm formação das disciplinas que lecionam. Temos de investir na educação integral e no Pronatec (programa que dá cursos técnicos a jovens)", ponderou.
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Análise - Ideb revela crise do modelo atual
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Brasília. O desempenho das escolas de ensino médio no Ideb foi classificado pelo movimento Todos pela Educação como "uma verdadeira crise do modelo de ensino atual". "Temos uma crise por duas razões: primeiro, porque essa etapa acaba recebendo o acúmulo das deficiências das etapas anteriores, ou seja, o aluno chega com muitas lacunas de aprendizagem. Em segundo lugar, ocorre um problema de estrutura. Temos um ensino médio com 13 disciplinas obrigatórias, não se consegue aprofundar em tema nenhum, a fragmentação é enorme", afirmou a diretora-executiva do Todos pela Educação, Priscila Cruz.
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Segundo ela, somam-se a esses fatores o desinteresse de boa parte dos estudantes nessa etapa e a falta de professores para todas as disciplinas. "Sabemos das dificuldades, mas termos um retrocesso em nove Estados é simplesmente inadmissível", disse. Fonte: O Tempo (MG)

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

O tráfico ultrapassa os portões das escolas

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Por Marco Araújo
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O tráfico de drogas ronda as portas das escolas e já ultrapassa seus portões. A Tribuna acompanhou a rotina de alguns colégios e observou situações de tentativa de invasões, colhendo relatos de educadores e pais a respeito do medo da proximidade das drogas. Diversas instituições enfrentam o problema já nos primeiros dias de retomada das aulas neste segundo semestre letivo. Na última segunda-feira, uma ocorrência foi registrada próximo de uma escola no Santa Cândida. No local, um homem, 28, foi detido com nove buchas de maconha e R$ 80. Segundo a Polícia Militar, ele faria a venda do entorpecente perto do colégio.
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Este ano, oito escolas públicas solicitaram a seus órgãos competentes a ampliação e construção de muros a fim de melhorar a segurança. Na Superintendência Regional de Ensino (SRE), foram seis pedidos, enquanto na Secretaria de Educação foram dois. Quando as apurações desta reportagem tiveram início, em abril, um grupo de adolescentes foi visto debaixo de uma árvore, fumando uma substância que passava de mão em mão bem próximo do colégio Estadual Deputado Olavo Costa, no Monte Castelo, Zona Norte. A cena, que mostrava jovens, supostamente, consumindo maconha, foi observada em plena luz do dia, de dentro da instituição, uma vez que o muro do colégio, por ser baixo, não impedia a visão do grupo do lado de fora. A estrutura, que se mantém inalterada até hoje, não é obstáculo para que desconhecidos invadam o estabelecimento educacional.
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A mãe de um estudante de 13 anos da Deputado Olavo Costa avisou a direção, quando, por volta das 7h30, viu dois homens em atitude suspeita, na porta do colégio, com algo suspeito nas mãos como se quisessem oferecer aos alunos que chegavam para a aula. A dupla ainda teria entrado no estabelecimento, mesmo sem a permissão da direção. "Assim que vi, liguei para a PM. Mais tarde, por volta das 11h, quando fui buscar meu outro filho, vi que os mesmos continuavam no interior da escola. Eles transitam livremente dentro do estabelecimento, e a direção encontra problemas para contê-los", disse a dona de casa, 35. "Meu receio é que alguém ofereça alguma coisa para meu filho experimentar."
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Invasões
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O diretor da escola, André Avelar, confirma as invasões no pátio. Seriam jovens, com idades entre 18 e 20 anos, que não são alunos da instituição. "Temos informações de que eles possam estar ligados ao tráfico de drogas. Eles pulam o muro e invadem o colégio."No dia em que a Tribuna visitou o lugar, o diretor contou que precisou pedir para que alguns desses jovens deixassem a quadra, onde estavam sem permissão. "Nossa escola é muito vulnerável. Nossas condições de segurança, como o muro, não impedem que eles acessem o colégio." No mesmo dia, a reportagem flagrou jovens em cima do muro, comprovando a facilidade que encontram para entrar na instituição. O vandalismo também foi detectado, pois, no muro que fica ao lado da quadra de esportes, parte da tela de proteção foi danificada.
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Ocorrências comprovam vulnerabilidade - Não há números sobre a penetração das drogas nas escolas juiz-foranas. Entretanto, a impressão que se tem e os dados esparsos indicam que ela avança em todas as regiões do município. De todos os casos acompanhados pela reportagem, alguns merecem destaque. Como no dia 20 de março, quando 14 pedras de crack foram encontradas pela PM escondidas em um buraco feito em um muro próximo à Escola Municipal Marília de Dirceu, no Filgueiras, Zona Nordeste. A ocorrência foi registrada quando uma viatura se deparou com um homem, 23, e um adolescente, 17, em atitude suspeita em frente ao colégio, na hora da saída dos alunos. Um dos problemas enfrentados por essa escola é a aglomeração de adolescentes que não são estudantes do estabelecimento do lado de fora, na saída do período noturno. Segundo a vice-diretora, Raquel Lucindo, o colégio vem realizando ações de combate às drogas. "Procuramos orientar alunos e familiares a respeito do aliciamento de meninos mais novos por mais velhos. Também pedimos que pais sempre fiscalizem os horários de chegada dos filhos em casa, depois das aulas", afirmou Raquel, lembrando que também são feitas palestras e reuniões com o Conselho de Segurança Pública.
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Já no dia 17 de fevereiro, a Polícia Civil desmantelou um esquema de tráfico de drogas que utilizava "vapores" para vender entorpecente na porta da Escola Estadual Sebastião Patrus de Souza, no Santa Terezinha, Zona Nordeste, localizada a poucos metros da 1ª Delegacia Regional. Um homem, 37, que seria o proprietário do entorpecente, foi preso. Conforme o vice-diretor do colégio do período noturno, Rogério Villa Verde, o consumo de drogas do lado de fora vem acontecendo. "A rua é deserta e sem saída. Além disso, dois postes estão sem lâmpadas desde o início do ano, o que contribui ainda mais para a situação. Trabalho há oito anos nesta escola, e o consumo de drogas na parte exterior sempre existiu", afirmou o educador. Como forma de conscientizar os alunos, a escola já realizou reuniões com o Conselho de Segurança Pública e palestras sobre os malefícios causados pelo crack. Em 24 de abril, a Tribuna mostrou que, na Escola Estadual Professor Lindolfo Gomes, no São Benedito, Zona Leste, a quadra esportiva, localizada em uma área separada do prédio da instituição, era utilizada para o consumo de drogas e práticas sexuais. Na ocasião, a direção da escola informou que a Superintendência Regional de Ensino (SRE) teve ciência da situação, sendo solicitada urgência na construção do muro para minimizar os problemas.
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Superação depende de diversos atores sociais
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O problema é de âmbito nacional e já bateu às portas do primeiro escalão da educação pública no Brasil. Tanto que, deste mês até abril de 2013, cerca de 112 mil educadores inscritos de todo o país vão participar do Curso de Prevenção do Uso de Drogas para Educadores de Escolas Públicas, organizado pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad). Só de Minas Gerais, são 3.899 profissionais. A iniciativa faz parte da capacitação prevista no eixo de prevenção do programa "Crack, é possível vencer", lançado em dezembro de 2011 pelo Governo federal. Além de profissionais das redes de educação, o programa treinará agentes de segurança pública, justiça, saúde e assistência social e também conselheiros e lideranças comunitárias e religiosas. Na cidade, profissionais da área também buscam ações de combate e prevenção. Para a diretora de comunicação do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (Sind-UTE), Yara Aquino, a inserção das drogas no espaço escolar demonstra que é preciso haver intervenções. "Um local que era tido como santuário torna-se, a cada dia, mais vulnerável. E isso é inevitável, pois, a instituição, inserida em uma comunidade, não tem como ficar imune. A questão não é apenas de polícia, mas de toda a sociedade que precisa encontrar uma forma de superá-la".
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'Triste constatação'
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Conforme André Avelar, diretor da Escola Estadual Deputado Olavo Costa, a instituição já está tomando providências para combater as drogas. "Por meio de reuniões, queremos mostrar aos pais que eles têm papel fundamental no combate ao problema. Subir o muro hoje, para enfrentar a invasão, é importante, mas, a longo prazo, é isolar ainda mais a instituição. É fundamental a participação dos familiares em nossa rotina, pois temos relatos, inclusive, de pais envolvidos com o tráfico de drogas, assim como tios, primos e outros parentes", afirma André, ressaltando: "Na ordem do dia das escolas, atualmente, estão os muros e não a ampliação de instalações e implantação de salas multimeios. É uma triste constatação." A assessoria de comunicação da Secretaria de Estado da Educação (SEE) informou que, das seis escolas que, este ano, solicitaram obras de ampliação e construção de muros, quatro já foram contempladas e duas aguardam autorização. A pasta também realiza parcerias com a Polícia Militar, para coibir o tráfico de drogas ao redor das escolas e já estuda ações a serem implementadas com outros agentes sociais a fim de combater essa situação.
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Ações preventivas
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A partir deste semestre, as escolas municipais terão ações voltadas para Campanha Permanente de Orientação Preventiva Contra a Inserção das Drogas nas Escolas Públicas Municipais. A iniciativa foi proposta em projeto de lei do vereador Francisco Canalli (PMDB) e sancionada no dia 25 de junho. A lei prevê que a campanha será planejada, promovida e supervisionada pela Secretaria de Educação da Prefeitura, que informou que a orientação prevista pelo projeto já é realizada nos colégios, e faz parte do currículo dos estudantes. Assim, o projeto de Canalli reforçaria o trabalho desenvolvido atualmente.
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Em relação à Polícia Militar, o assessor de comunicação organizacional, major Sebastião Justino, disse que a corporação, ao longo dos anos, tem adotado ações preventivas, como o Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd) e Jovens Construindo a Cidadania (JCC). "Há ainda o patrulhamento escolar que orienta diretores, professores e funcionários das escolas a adotarem medidas de autoproteção", afirmou o assessor, acrescentando que operações são realizadas constantemente nos colégios com o objetivo de identificar autores de tráfico de drogas e de outros delitos, tendo sido apreendidas armas e drogas. "Ainda está em andamento, um projeto com as secretarias de Educação estadual e municipal para realização, em breve, de um curso de mediação de conflito escolar."
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A droga não escolhe classe social
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L., de 34 anos, portador do vírus HIV, está há cinco meses tratando sua dependência química na Clínica Boa Esperança. Sua vida foi atropelada pelas drogas ainda na fase escolar. Quando tinha 13 anos, ele teve o primeiro contato com a cola de sapateiro, depois a maconha, até conhecer a cocaína, quando abandonou seus estudos. "Comecei no colégio por influência de amizades malignas, que me apresentaram a droga. Fiquei viciado. Cheguei a cometer pequenos roubos e furtos para manter o vício. Comprava drogas na porta da escola. Quando não tinha dinheiro, trocava meu sapato ou meu tênis para conseguir o que queria," relatou, L., acrescentando que saiu de casa e passou a usar cocaína injetável. "Quando conheci o "canhão" (cocaína injetável), fui contaminado pelo vírus da Aids. A droga tirou a minha vida dos trilhos completamente", desabafa.
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Atualmente, L. enfrenta a dependência química, uma vez que se tornou usuário de crack. Ele já passou por nove clínicas de internação. "É uma luta, pois a recuperação é difícil. A dependência tira nosso foco, nosso juízo", afirma, completando: "Apesar de tudo, tive uma companheira, que não sabia que eu era soropositivo. Ela acabou sendo contaminada, mas, pela graça de Deus, tivemos uma filha, que hoje tem 7 anos, e não é soropositiva." O tráfico na porta da escola é uma situação que ele diz que conhece muito bem. "Não importa se a escola é pública ou privada. O fato é que as drogas estão em todo lugar. Sou de uma família de classe média em Juiz de Fora e só estudei em colégios caros. A droga não escolhe classe social. Ela pega qualquer um e estraga a vida da pessoa", alerta, avisando: "Os pais devem prestar a atenção nos filhos, saber sobre suas amizades, como é a atitude delas, pois elas influenciam a cabeça de um adolescente. Infelizmente, fui influenciado de maneira negativa."

Fonte: Tribuna de Minas (JF - MG)

Educação em caos

Universidades virtuais

George Bernard Shaw fuzilou: “Desde pequeno tive de interromper minha educação para ir à escola”. Albert Einstein não ficou atrás: “É um milagre que a curiosidade sobreviva à educação formal”.
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Nossa sociedade celebra a educação, mas não perde oportunidade para criticar as escolas. E não faltam motivos. O Brasil tem um sistema peculiar. Nossa antiga classe média frequenta colégios privados e universidades públicas, nas quais entra sem objetivos, frequenta sem inibições e sai sem aspirações. Durante quatro ou cinco anos, convive com mestres de imponentes insígnias e pouco apreço à educação.
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Nossa nova classe média frequenta colégios públicos e universidades privadas, nas quais entra com algumas ambições, frequenta como pode e sai por sorte. Durante quatro ou cinco anos, convive com mestres que são verdadeiros operários do ensino, com muitas contas a pagar e pouco tempo para se dedicar.
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Agora, dizem os sabidos e novidadeiros, a grande novidade é a universidade virtual. Mais uma vez, profetizam, as novas tecnologias vão operar o milagre de transformar água em vinho, pedra em pão. Será?
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O Coursera é um start-up norte-americano criado pelos professores de Ciência da Computação Daphne Koller e Andrew Ng, da Universidade de Stanford, matriz maior de empresas do Vale do Silício. A empresa foi criada com a missão de oferecer, gratuitamente, por meio da internet, a qualquer indivíduo, a melhor educação do mundo, leia-se, aquela oferecida pelas melhores universidades. Por enquanto, a empresa sobrevive graças a investidores.
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O fato relevante foi o anúncio recente de que mais uma seleta lista de universidades concordou em fornecer conteúdo para o Coursera disponibilizar na rede. As parceiras da empresa agora incluem as universidades de Princeton, Duke, Stanford, Pensilvânia, Michigan, Toronto e Edimburgo, entre outras. Uma delas já declarou que reconhecerá créditos realizados no Coursera, outras duas informaram que colocarão mais 3,7 milhões de dólares na empresa, elevando os investimentos a 22 milhões de dólares. No próximo período letivo, o Coursera pretende oferecer mais de cem cursos online, visando atingir 100 mil alunos. Não é pouco!
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A educação superior tornou-se uma grande questão e, ao mesmo tempo, um grande negócio, atraindo empreendedores e investidores. O Coursera não está sozinho. Seus concorrentes incluem o projeto edX, da Universidade Harvard e do MIT, a Udacity e a Minerva. No Brasil, há iniciativas similares, tais como o Veduca, da iniciativa privada, e a Univesp, do governo do Estado de São Paulo.
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Pensada como negócio, a educação superior é extremamente ineficiente: é cara, atende apenas uma pequena parcela da população e desperdiça recursos, à medida que cada professor (um recurso escasso e caro) cria o próprio conteúdo e o repete semestre a semestre para pequenas plateias, nem sempre muito interessadas. Segundo Koller, do Coursera, as aulas tradicionais surgiram há centenas de anos quando havia apenas uma cópia do livro, a do professor. Portanto, a única maneira de transmitir o conteúdo era o professor sentar na frente da classe e ler o livro. Hoje, com o uso das tecnologias de informação e comunicação, há maneiras mais eficientes de transmitir conteúdo, sugeriu a empreendedora em entrevista para a revista The Atlantic.
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Naturalmente, as investidas da lógica de mercado sobre a educação superior causam arrepios. Entretanto, iniciativas como as do Coursera não devem ser temidas. Aulas ao vivo, para grandes plateias, como ocorre com frequência nos ciclos básicos dos cursos superiores, estão se tornando anacrônicas. Alguns professores tentam agir como animadores de auditório, usam anedotas e recursos performáticos para manter a atenção das hordas de apedeutas. A vítima é o aprendizado.
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Um sistema de estudo dirigido, com apoio de recursos online e que respeite o ritmo do aprendiz pode, eventualmente, ajudar. Afinal, o valor de frequentar uma instituição de ensino superior não está nas aulas básicas, mas no contato com professores e colegas, na criação de redes de relacionamento e, principalmente, no trabalho conjunto e na realização de projetos de interesse comum.
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Iniciativas como as do Coursera e de seus pares estão ainda em sua infância. Os conteúdos são fragmentados e muitos registros foram feitos simplesmente colocando-se uma câmera no fundo de uma sala de aula. A estética é pobre, e o material divulgado não é atraente. A grande promessa pode se transformar em grande decepção. Não terá sido a primeira vez. Não será a última. Talvez, o que precisamos é mais Jean Piaget e menos Bill Gates; mais Paulo Freire, menos Steve Jobs.
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Fonte: Carta Capital