domingo, 25 de julho de 2010

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Um salto de qualidade na educação

Por MARIA LUISA BARROS - 25 jul. 2010

Rio - Na cartilha da alfabetização em comunidades conflagradas pela violência, pequenas palavras, de efeito devastador, surgiam antes do ABC. Nos rabiscos, modelos de fuzis AR-15, FAL, AK-47 e as siglas de facções CV, ADA e TC se misturavam a desenhos de caveirões e bandidos. A chegada das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), a partir de dezembro de 2008, a 13 comunidades mostrou que educar em tempos de paz, mais do que um sonho, é uma realidade. Nessas favelas, agora, outras letras começam a mudar a rotina de pelo menos 41.806 estudantes cariocas. De 10 escolas públicas nas áreas com UPP, oito já atingiram ou ultrapassaram as metas do Ministério da Educação. Em algumas, a frequência quase dobrou. Tais resultados são o caminho para novo futuro em toda a cidade, que não está integralmente pacificada. Não são poucas as escolas que ainda convivem com a violência — e a trágica morte do garoto Wesley, 11, atingido em plena sala de aula, no dia 16, é a dura lembrança de que há muito a fazer.

Mas a realidade das comunidades que abraçaram as UPPs mostra que mirar na segurança acerta em cheio na educação, dando a partida para uma revolução no ensino de escolas aterrorizadas por mais de três décadas de conflitos. Por três meses, O DIA viveu a rotina desses 10 colégios municipais do Rio, nas zonas Sul (Dona Marta, Chapéu Mangueira/Babilônia, Pavão-Pavãozinho/ Cantagalo, Tabajaras/Cabritos), Oeste (Cidade de Deus e Jardim Batan) e Norte (Borel) e Centro (Providência). No Ciep Dr. Antoine Magarinos Torres Filho, no Morro do Borel, na Tijuca, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), principal avaliação na qualidade do ensino no Brasil, superou a meta de 2017. Na Escola Municipal Pedro Aleixo, na Cidade de Deus, o ‘problema’ agora é criar novas turmas para reduzir o número de crianças em sala, tamanha a frequência em tempos de paz. No Ciep João Goulart, no Cantagalo, as reuniões de pais são tão concorridas que faltam cadeiras para todos.

Cada unidade tem sua história vitoriosa para contar. Neste caderno e nos próximos dias, será possível conhecê-las e entender como a retomada pelo Estado de áreas antes dominadas por traficantes e milicianos está criando novos horizontes para jovens.

Sai o tráfico, entra a escola

Nas favelas pacificadas, as leis do tráfico não fazem mais parte do currículo de jovens e crianças. Os professores tampouco precisam disputar a atenção dos estudantes com explosões de granadas, rajadas de fuzis e corpos a caminho da escola. “Antes, os alunos só vinham quando não havia conflito. Isso acabou. Eles agora estão tendo ensino regular. Os professores podem planejar as aulas, e os pais saem para trabalhar tranquilos”, percebe Marilina Amaral, diretora da Escola Municipal José Pereira Clemente, na Cidade de Deus.

No Ciep João Goulart, no Cantagalo, Copacabana, a diretora Mônica Zucarino viu, ao longo dos anos, muitos alunos obterem a certidão de óbito antes do diploma. Jovens que empunhavam fuzis hoje seguram caneta e lápis. “Tenho alunos que estavam no tráfi co e, quando a UPP entrou, voltaram a estudar. Eles ganhavam mais do que um professor, mas largaram tudo e hoje, às 7h, já estão na porta da escola. No fundo, sabem que a escola ainda é a única esperança de um futuro melhor”, destaca Mônica.

Corrida por matrículas

Diretora da Escola Municipal Alphonsus de Guimaraens, Andrea Rangel se lembra como se fosse hoje dos dias em que se deparava com alunos drogados no pátio da escola. “Aqui era terra de ninguém. Eles faziam a quadra de motel. Quando a gente chegava de manhã, havia preservativos, saquinhos de drogas e até fezes pelo chão. Nem animal faz isso”, relembra ela, que hoje tem apoio da ronda escolar da UPP da Cidade de Deus. Por causa da vigilância policial, houve uma corrida por matrículas. “Quem estava à toa na rua começou a levar dura e a ser parado pelos policiais. As mães se desesperavam para matricular os filhos que já tinham abandonado os estudos”, completa a diretora, que comemora a melhora no desempenho dos estudantes de 1º ao 5º ano. A escola é outra que já ultrapassou a meta do MEC para 2009. “Tomara que a UPP não saia nunca daqui”, torce Andrea.

Fonte: Jornal "O Dia" - http://odia.terra.com.br/portal/educacao/

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