sexta-feira, 2 de março de 2012

Reações são cada vez mais agressivas

Após menina esfaquear colega na escola, especialistas recomendam maior seriedade com o tema

Fonte: Jornal de Brasília (DF)
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Mudanças no comportamento de crianças e adolescentes, tornando-as mais ansiosas, depressivas e isoladas, são alguns dos principais sintomas causados pelo bullying forma de agressão física, moral ou psicológica. Mas, às vezes, esse conjunto de fatores também pode desencadear reações mais agressivas, e inesperadas, por parte das vítimas.
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Foi o caso da menina de 13 anos que esfaqueou um colega da mesma idade no Centro de ensino fundamental 3 de Planaltina. As marcas deixadas pela violência retratam os perigos da falta de comprometimento com um tema tão complexo como o bullying. O garoto sobreviveu à tentativa de esfaqueamento, com ferimentos leves no peito e nos braços. A menina foi levada em flagrante delito, respondendo por ato infracional de tentativa de homicídio.
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Segundo as autoridades policiais, ela afirmou ter sido alvo de brincadeiras de mau gosto desde o ano passado, pedindo inclusive para ser trocada de sala. A situação reflete uma face do problema que já teve repercussão nacional. A tragédia de Realengo, em abril do ano passado, onde 12 crianças e adolescentes foram mortos por um ex-aluno que se dizia vítima de bullying, ainda está marcada na memória do País. Para o professor do Departamento de Psicologia Escolar da Universidade de Brasília (UnB), Aderson Luiz Costa, os motivos que levam uma vítima de bullying a atacar seus intimidadores não são tão fáceis de serem mensurados. "Não há uma resposta simples. É preciso analisar a história de vida da pessoa, suas patologias e transtornos. Mas qualquer pessoa submetida a uma condição de alto nível de ansiedade, obrigada a viver em sofrimento diário, vive em um potencial produtor de reações mais agressivas e intensas", explicou Costa. As pessoas vítimas de maus-tratos podem apresentar desde baixa autoestima, insegurança, ansiedade, até casos mais críticos, incluindo depressão e demais problemas psicológicos. Normalmente, as vítimas tendem a sofrer caladas. Todo aquele sentimento ruim vai se acumulando até chegar a um ponto em que explode de uma só vez , afirmou Afonso Galvão, diretor do Programa de Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Católica de Brasília (UCB).
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Qualquer Escola tem casos de bullying, em maior ou menor escala, principalmente porque ainda não se trata o tema com a devida seriedade. É preciso que as instituições trabalhem mais a Educação moral e os valores, separem os praticantes de bullying em potencial das vítimas e puni-los exemplarmente, quando necessário , ressaltou.
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REGISTROS MAIS COMUNS
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De acordo com chefe da Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA), Mônica Ferreira, os registros de casos envolvendo bullying têm se tornado mais comuns. Os pais que não estiverem satisfeitos com a diretoria das Escolas nesses casos podem registrar uma ação de injúria. Temos muitas ocorrências de brigas de estudantes que começaram devido a essas provocações , contou a delegada. A família tem que dar limites e a Escola orientar, mas quando a situação continua sem resolução, é muito importante que levem o problema até a delegacia , completou a delegada-chefe. Segundo Mônica, a escolha das Escolas e dos pais de não se identificarem nesses casos é um dos motivos que dificulta a apuração do número de ocorrências registradas.
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Segundo pesquisa de 2009 realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cada dez alunos brasileiros, três já sofreram perseguições, agressões verbais ou físicas nas Escolas. A ocorrência foi maior nas unidades de ensino particulares (35,9% contra 29,5% de Escolas públicas), e mostraram que são mais comuns em alunos da 5ª e 6ª séries. Na época, o Distrito Federal foi considerado a unidade da Federação com o maior registro de casos de bullying no País, com 35,6% dos entrevistados admitindo ter sofrido ridicularizações no ambiente Escolar.
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ESCOLA SE DIZ SURPREENDIDA
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A diretora do Centro de ensino fundamental 3 de Planaltina, Rita Cirlene, contou ter sido surpreendida pela ação da menina. Sabíamos que os dois tinham atrito, mas chamamos os pais deles para mediar a situação. Conversamos com eles e pensávamos que tivessem dado o suporte para resolver a questão, comentou a diretora. O coordenador da Regional de Ensino de Planaltina, Misael Barreto, confirmou que nada tinha chamado a atenção da instituição para que algo dessa natureza ocorresse. Registramos apenas a situação dos dois alunos, mas foi algo corriqueiro. Como havia reciprocidade nas agressões verbais, não vimos o problema como bullying, disse Barreto.
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Apesar de o local da unidade de ensino ser classificado como perigoso, Misael apontou que não havia registros de violência dentro da Escola até então. Segundo R.N.G., pai da menina de 13 anos, a situação se prolongou desde o ano passado. Ela pediu para ser transferida e não fizeram nada. Quando registrou o problema, a direção fez o que pôde, mas com o pouco efetivo de professores, ficava sempre essa lacuna que criou a possibilidade para brigas. Lamentamos pelo garoto, mas também sofremos pelo que pode acontecer com a nossa filha agora , desabafou o pai.
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PAI TEME INTERNAÇÃO
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A Vara da Infância e da Juventude (VIJ) se pronunciou ontem sobre o caso da estudante de 13 anos que esfaqueou o colega de classe, na tarde de terça-feira, em uma Escola de Planaltina. A garota será encaminhada para a Unidade de Internação do Plano Piloto (UIPP), o antigo Centro de Atendimento Juvenil Especializado (Caje). No próximo dia 7 será realizada uma nova audiência e o juiz então determinará a natureza da medida socioeducativa a ser aplicada. Nas saída da VIJ, os pais da adolescente questionaram a decisão do juiz e reclamaram que a filha já vinha sofrendo bullying há pelo menos um ano e meio. Um dia antes de a estudante esfaquear o colega, ela já havia trocados empurrões com o colega que foi vítima das facadas. Eu já tinha estado diversas vezes na Escola, para conversar com professores e orientadores sobre esse problema que envolve as humilhações diárias sofridas pela minha filha , disse o pai da menina, o vigilante R.N.G.
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Sobre o episódio e a faca usada pela adolescente, o pai explicou que o utensílio foi retirado da cozinha da casa dele, que vive separado da mãe da menina. Como moramos em uma cidade muito violenta, minha filha passa a semana comigo, pois minha casa fica mais perto da Escola. No dica do fato, nós almoçamos juntos e ela foi tranquila para a Escola. Nem eu nem ninguém viu que ela tinha colocado uma faca na mochila , afirmou o pai. Depois da decisão da VIJ, o pai da estudante se preocupou com a segurança da menina, em razão das constantes rixas entre gangues rivais que ocorre em Planaltina. Muitos adolescentes já morreram dentro do Caje pela guerra entre as gangues. Minha filha não pertence a nenhuma delas, mas só pelo fato de morar no Pombal já é motivo para outro jovem matá-la , disse o vigilante.

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