05 de março de 2012
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Antes de abrir o portão de casa para quem bate, a aposentada Magali da Conceição Câmara Soares, de 65 anos, espia pela fresta da janela. Seus olhos são o reflexo do medo, que é vizinho, tem nome e sobrenome: Escola Estadual professor Pedro Américo, do outro lado da esquina, no Bairro de Santa Tereza, Região Leste de Belo Horizonte. Sob ameaça iminente de fechamento, em parte motivado pelas próprias condições de segurança, esse endereço, que como muitos outros na capital e no estado deveria ser referência em Educação, tornou-se um marco de violência e preocupação. O temor, que antes rondava professores, diretores e funcionários de instituições de ensino, pulou o muro e se espalhou pela vizinhança, traduzindo-se em arrombamentos, assaltos e agressões, além de tráfico e uso de drogas diante das moradias.
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O problema está longe de se restringir a Santa Tereza. Em várias regiões de BH, morar perto de Escola virou sinônimo de insegurança e até mesmo pânico, diante da ameaça em que se transformaram alunos, principalmente os envolvidos com uso e tráfico de drogas, que cometem delitos na vizinhança para sustentar o vício. A infiltração dos tóxicos na comunidade Escolar já chegou ao ponto de jovens se matricularem a mando de criminosos apenas para traficar, segundo relatos de funcionários.
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No ano passado, de acordo com a Secretaria de Estado da Defesa Social (Seds), foram 174 registros de crimes contra a pessoa (como agressões e ameaças) e 201 ocorrências de crimes contra o patrimônio (como furtos e roubos) em Escolas de BH. E essa violência continua, ou começa, do lado de fora. Até mesmo quem passou a vida profissional lidando com infrações à lei se surpreende com o comportamento dos estudantes. O militar reformado Walter Costa, de 72 anos, mora em frente à Escola Pedro Américo, em Santa Tereza, e também vive com medo. “Quebraram meu carro na porta de casa. Jogaram pedras de dentro da Escola. Fui lá, mas fui ameaçado. Eles me xingaram de tudo quanto é nome. São perigosos”, diz Walter, se unindo ao coro de queixas contra as drogas. “Têm 16, 17 anos, mas até os seguranças e a diretora têm medo deles. No dia em que eles quebraram meu carro, fui lá e o vigia não quis falar quem foi.”
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O medo da aposentada Magali também se relaciona a um carro destruído. Ela conta que tudo ocorreu quando uma vizinha, com quem conversava na rua, indicou um aluno da Pedro Américo que vendia drogas. “Ela falou tão sem maldade que apontou. No dia seguinte, meu carro estava todo quebrado: para-brisa, espelhos, porta, tudo. Ele viu que ela apontou e deve ter entendido que eu iria fazer alguma coisa contra ele”, disse a aposentada. “Moro aqui há 12 anos, perdi meu marido há quatro meses e faz uma semana que arrombaram a minha casa. Estou com medo de continuar aqui”, lamenta a aposentada, decidida a instalar cerca elétrica para tentar se proteger.
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ZONA SUL
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A região da cidade é outra, o nome da Escola é parecido, a situação é idêntica. Na Escola Estadual Pedro Aleixo, apenas as questões do dever de casa permanecem intactas na sala de aula, apesar de escritas a giz. Em volta está tudo destruído: paredes pichadas, vidros quebrados e cadeiras depredadas, com o estofado azul arrancado até o esqueleto de madeira. Na instituição, a violência também transborda, atingindo moradores do Bairro Mangabeiras, Centro-Sul de BH. “A maioria dos meus alunos são bons, mas existem aqueles que roubam. No fim do ano passado, meninos arrombaram uma casa e vieram se esconder aqui dentro”, conta uma professora, que já teve o rádio do carro furtado diante da Escola. Dias atrás, conta ela, uma colega ficou sem um notebook que deixara escondido debaixo do banco do veículo.
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Em fevereiro de 2011, a Escola enfrentou uma onda interna de violência, desencadeada pelo assassinato de um dos estudantes, Jefferson Coelho da Silva, de 17 anos, morto por policiais quando estava na companhia do tio Renilson Veriano da Silva, dentro do Aglomerado da Serra. “Os alunos passaram a depredar a Escola. Pulavam o muro, quebravam os vidros e faziam gestos obscenos para as professoras, dependurados nas grades”, afirma uma fonte. Segundo ela, todos os vidros foram trocados e novamente quebrados. O clima piorou em setembro, quando o auxiliar de serviços gerais Marco Túlio Miranda Dias, de 38, escapou ileso de três tiros disparados por um aluno, de 17 anos. O funcionário desistiu do posto e mudou de endereço. “Tentei consertar as coisas, mas perdi a esperança. Está tudo errado”, desabafou. Desde então, a Escola permanece sem o funcionário, que atuava informalmente como disciplinário. Também não conta com vigilantes. Na semana passada, até a roçadeira (máquina usada para aparar a grama do jardim) e o retroprojetor foram roubados.
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A diretora, Raquel Coutinho, mandou aumentar o muro de 1,5 metro com uma grade de mais 2 metros e aguarda investimento de R$ 2,5 milhões na reforma das instalações, aprovado pela Secretaria de Estado da Educação. Conseguiu também portão eletrônico e sistema de vigilância por vídeo. Em Belo Horizonte, apenas 15 Escolas estaduais, de um total de 237, receberam câmeras em 2011. Pouco para conter a ousadia de estudantes que transformam a vida de colegas, vizinhos e funcionários das unidades em um tormento diário.
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Enquanto isso...
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...Pedro Américo está definhando
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A violência motivada pelo tráfico é um dos motivos para o iminente fechamento da Escola Estadual Pedro Américo, no Bairro Santa Tereza, que está acabando aos poucos com as turmas. Das 13 salas de aula, apenas cinco são ocupadas por cerca de 150 alunos do ensino médio. A instituição cancelou as matrículas para o primeiro ano, que foi extinto, e, assim que a última turma do terceiro ano concluir os estudos, a Escola deixa de existir de vez. A Secretaria de Estado de Educação, por nota, informou que a instituição vem recebendo cada vez menos matrículas, mas não esclarece os motivos. “Outras Escolas na região já atendem à demanda e não faltará vaga para nenhum aluno que necessite estudar na região”, informa o texto.
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Fonte: Estado de Minas (MG)
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