sexta-feira, 5 de novembro de 2010

DESIGUALDADE AINDA É MOTIVO DE VERGONHA

por Liana Verdin, 05 nov. 2010

A desigualdade ainda é muito grande no Brasil. Aquilo que as pessoas percebem sem grandes dificuldades está medido no relatório deste ano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e mostra o percentual do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que é perdido devido à desigualdade. No caso do Brasil, esse prejuízo chega a 27,2%, levando o indicador para 0,509, suficiente para fazer o país perder 15 posições no ranking de 139 países, ficando na 88ª colocação.Mas o Pnud constata que a situação brasileira vem melhorando nos últimos tempos. Entre 2000 e 2005, por exemplo, as perdas do IDH do país devido à desigualdade caíram de cerca de 31% para 28,5%, em consequência de uma evolução em todas as dimensões, diminuindo três pontos percentuais na saúde e dois pontos percentuais na Educação e no rendimento.

Ana Cristina Ferreira da Silva, 28 anos, casada e mãe de uma criança de três anos, é o exemplo concreto de como a vida pode melhorar. Antes de engravidar, já estava há dois anos desempregada. Quando soube que teria um filho resolveu se dedicar exclusivamente aos cuidados do bebê. Dessa forma o marido passou a ser a única fonte de renda da casa.

Com o tempo, Ana percebeu que precisava voltar ao mercado de trabalho e resolveu distribuir currículos por várias empresas. Há três meses, a sorte lhe abriu um sorriso e ela conseguiu uma vaga, com carteira assinada, como auxiliar de serviços gerais, em um shopping. Ela passou a ganhar um salário mínimo por mês e a esbanjar felicidade. “Estava entediada dentro de casa, com algumas restrições. Precisava ter o meu próprio dinheiro. Hoje, economizo parte do salário para bancar os estudos do meu filho no futuro”, conta.

Ana passou a satisfazer boa parte das necessidades de consumo. Beneficiou-se, ainda, do crédito farto, do qual estava distante por não ter um comprovante de renda. As estimativas apontam que, nos últimos seis anos, mais de 30 milhões de brasileiros migraram para a classe média, que passou a ser maioria no Brasil. Foi um avanço importante para reduzir o fosso que separa ricos e pobres e sempre foi uma das maiores vergonhas do país.

Perigos à vista

Mas é preciso manter o sinal de alerta ligado: “Mesmo quando os países realizam progressos no IDH, nem sempre evoluem nas dimensões mais vastas. Os países podem ter um elevado IDH e serem antidemocráticos, desiguais e insustentáveis”, afirmam os técnicos do Pnud que prepararam o mais recente relatório de desenvolvimento humano. Para eles, não se pode assumir que tudo o que é bom vem sempre junto. Segundo o Pnud, a perda média no IDH é de cerca de 22%, variando entre os 6% da República Tcheca e os 45% de Moçambique. “Mais de 80% dos países perdem mais de 10% e quase 40% perdem mais de 25%”, asseguram os técnicos.

O Pnud avalia que em mais de um terço dos países analisados, a desigualdade na saúde, naEducação ou em ambas excede a desigualdade relativa ao rendimento. A variação da perda vai de 4% (Islândia) a 59% (Afeganistão) na saúde; de 1% (República Tcheca) a 50% (Iémen) na Educação; e de 4% (Azerbaijão) a 68% (Namíbia) no rendimento.

Os pesquisadores ressaltam que a desigualdade no rendimento e no não rendimento tende a ser maior nos países com um baixo IDH. “A relação entre a desigualdade e o IDH, contudo, é mais acentuada quando se trata da desigualdade nas dimensões de não-rendimento do que em termos de rendimento”. Por exemplo: alguns países com anos de Escolaridade abaixo da média não são menos equitativos do que países com Escolaridade acima da média. “A média de anos de Escolaridade é menor no Brasil (sete anos) do que na Coreia do Sul (12 anos). Mas os dois países apresentam uma perda semelhante pela desigualdade naEducação (cerca de 26%). Países com uma expectativa de vida semelhante podem também ter uma desigualdade muito diferente — por exemplo, o Paquistão (33% na saúde), a Mongólia (23%) e a Federação Russa (12%). A desigualdade na esperança de vida ao nascer é pautada principalmente pela mortalidade infantil”, constatam os técnicos do Pnud.

País é terceiro em homicídios
Edson Luiz

O Brasil está na terceira colocação entre os 12 países com maior taxa de homicídios da América do Sul. Segundo o relatório de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), em 2008, foram registrados 22 crimes de morte para cada 100 mil pessoas. Os números estão abaixo apenas dos da Venezuela e da Colômbia, primeiro e segundo lugares no ranking. O Peru lidera entre as nações com menor taxa deste tipo de delito, seguido por Argentina e Uruguai. Mesmo assim, os dados do IDH animaram o governo, já que em anos anteriores, a taxa do Brasil era de 60 mortes para cada 100 mil pessoas.

“O Brasil, pela primeira vez, conseguiu reduzir suas taxas de homicídios”, comemora o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, ao analisar os dados do IDH. Segundo ele, a tendência é de queda nos próximos anos, principalmente por conta dos investimentos públicos nos estados. “Não existe mágica para acabar com os crimes de homicídios, mas vamos ter uma taxa descendente sempre”, acrescenta Barreto. Apesar disso, apenas 40% dos brasileiros, segundo o relatório, ainda têm percepção de segurança quando saem às ruas.

O Brasil não entrou no ranking dos países que registraram taxas de assaltos. Mas as estatísticas oficiais mostram que 10% das pessoas afirmam já ter sido vítimas dessa forma de violência, número inferior aos da maior parte das nações da América do Sul. Na Bolívia, 20% dos habitantes pesquisados disseram ter sido vítimas deste tipo de crime. O IDH na área de segurança considerou Honduras e Jamaica os países onde as taxas de homicídios são as maiores do mundo. O país da América Central registrou 60,9 mortes a cada 100 mil pessoas, enquanto que a nação caribenha teve 59,5 casos para o mesmo número de habitantes.

Mulheres pagam o preço do descaso

Rejane Lima não se intimida com a discriminação: alvo é a universidadeCom frequência, as mulheres sofrem discriminação na saúde, na Educação e no mercado de trabalho, com repercussões negativas sobre as suas liberdades. Essa é a principal conclusão do Relatório de Desenvolvimento Humano em relação às desigualdades de gênero, um novo indicador lançado este ano pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

O IDG é calculado levando em conta as taxas de mortalidade materna e de fertilidade na adolescência como variáveis de saúde, acesso à Educação secundária, percentual de assentos no Poder Legislativo e participação no mercado de trabalho. O índice do Brasil é 0,631, o que o coloca em 80º lugar no ranking de 138 países e longe, mas muito longe mesmo, do primeiro colocado, a Holanda, com 0,174, e do segundo, Dinamarca, com 0,209.

No Brasil, apenas 9,4% das cadeiras no Parlamento são ocupadas por mulheres. Na Holanda, essa fatia é de 39,1%. Em termos de acesso ao ensino médio, no Brasil, 48,8% da população do sexo feminino frequentam as aulas, contra 46,3% dos homens. No país número um em igualdade de gênero, 86,3% das mulheres têm ao menos a Educação secundária, contra 89,2% dos homens.A situação também é bastante diversa em termos de participação no mercado de trabalho. Enquanto na Holanda 73,4% das mulheres estão empregadas — são 85,4% de pessoas do sexo masculino —, no Brasil são 64% contra 85,2%.

Com a eleição da primeira presidente mulher do Brasil, Dilma Rousseff, o índice de desigualdade de gênero do país deverá melhorar nas próximas pesquisas, mas entre as oportunidades de trabalho e as remunerações entre homens e mulheres o fosso ainda tende a ser bem fundo. Apesar desse retrato cruel, Rejane Lima, 23 anos, ignora o estereótipo de que as mulheres costumam ser desvalorizadas no trabalho. Ela conseguiu o primeiro emprego como auxiliar de escritório em uma empresa de administração de condomínios. O bom desempenho logo chamou a atenção do chefe, que a promoveu ao cargo de escriturária. “O próximo passo é retomar a faculdade de Direito, que tive de trancar, para crescer ainda mais profissionalmente”, planeja.

Lusivânia Alves, 21, também é bem sucedida na carreira. Após um período de estágio, conquistou uma vaga efetiva como secretária em um escritório de fotografia. Com meu salário, ela financiou um curso técnico em gestão pública e, agora, sonha fazer graduação e uma pós na área administrativa.”

Fonte: Correio Braziliense (DF)

Nenhum comentário:

Postar um comentário