segunda-feira, 31 de maio de 2010

EDUCAÇÃO E TORTURA...

Ficha técnica do livro:
Escola, instituição da tortura
Autor: Maria da Glória Costa Reis
Produção: Editora Scortecci - Publicado em 10/1/2005

O ensino da violência
Luiza Reis

“Jamais se põe em dúvida a competência e integridade dos mestres, dos diretores de escolas, dos supervisores, etc., apesar de o sistema escolar ser um campo propício à manifestação de tendências patológicas. O magistério está repleto de narcisistas e de indivíduos imaturos, para não dizer cheios de raiva, capazes de agredir, até fisicamente, as crianças”. (Lauro de Oliveira Lima)

A autora inicia o livro expondo seu objetivo: "fazer uma denúncia que não pode mais continuar ignorada em nosso país: a escola agride, machuca, violenta física e psicologicamente seus alunos. A escola é a tortura institucionalizada". Trata-se de um livro inédito na área da educação, tocando num tema tabu: a violência praticada dentro da escola contra os alunos.

Maria da Glória, professora, 28 anos de escola pública, relata as agressões aos alunos que presenciou durante sua carreira no magistério, afirmando que não há no livro "nem uma vírgula de ficção", o que torna a denúncia muito grave, fazendo com que se exija uma análise urgente, por especialistas e autoridades competentes, da realidade descrita no livro. Das duas, uma: se for verdade tudo que a professora relata, faz-se necessária uma verdadeira intervenção nas escolas, visando a uma profunda mudança e mesmo extirpação do nosso atual modelo escolar. Se não é verdade, a professora deveria ser processada por calúnia, uma vez que o livro traz relatos de aberrações inimagináveis a nós, leigos, fora da escola.

Ela não faz esses discursos vazios sobre educação, conforme se vê na mídia, repetindo a mesma lengalenga de sempre, principalmente em relação ao álibi do salário para todas as falhas dos professores. Não há conjeturas no livro, ele é todo composto de fatos gravíssimos que a autora testemunhou e de outros publicados na imprensa (sempre citando corretamente a fonte), como o episódio de uma escola em São Paulo em que a coordenadora escolar castigou os alunos obrigando-os a lavar a boca com água sanitária. A autora conta de uma diretora que não aceitava crianças negras nas festas da escola, de uma professora que rasgou com as unhas o rosto de uma criança e de uma outra que deixou, na frente da turma, o aluno em pé portando, na cabeça, uma coroa de papel na qual estava escrita a palavra "BURRO". São apenas alguns exemplos, sendo muitas as situações de tortura físicas e psicológicas citadas no livro. O livro chega a ser surreal, só lendo para acreditar.

Por uma estranha coincidência, logo após o lançamento do livro, foi divulgado nos jornais, no dia 17 de novembro de 2004, foi publicada nos jornais a notícia de um garoto de 7 anos esquecido de castigo dentro de uma escola em Nova Odessa, no estado de São Paulo, tal qual a imagem da capa do livro em questão. A autora faz também um contundente ataque às autoridades educacionais, denunciando que, em 28 anos de escola pública, nunca viu uma secretária de educação dentro de uma escola, ou seja, ficam só em seus gabinetes com ar-refrigerado, sem tomar ciência do que acontece atrás dos muros da "instituição sagrada", por todos protegida e camuflada. Glória conta que tentou fazer a denúncia por outros meios, que há tempos vem escrevendo para jornais, governantes, autoridades de ensino e até judiciárias. Nada adiantou: a escola é intocável, por todos protegida e camuflada, diz ela. Por isso, escreveu seu livro.

O maior valor do livro reside no ineditismo de ter sido escrito por uma professora, derrubando o clichê de que criança mente quando fatos de violência na escola vêm à tona na imprensa. Sem dúvida, é a primeira vez neste país que uma professora rompe com o corporativismo da classe e denuncia seus pares.

Conhecer o que se passa de real dentro das escolas nos parece fundamental neste momento em que o país discute ad infinitum o fracasso da nossa educação, discussão que não tem chegado a lugar nenhum. Discussão pomposa, vazia e repetitiva feito um disco com agulha emperrada. Totalmente diferente do livro que não faz nenhum discurso acadêmico, indo direto ao ponto: um grande desamor pela criança em nossa sociedade, que faz da escola uma instituição propícia ao exercício da violência e da tortura.

Outro componente interessante no livro são as muitas citações de vários autores famosos tecendo comentários negativos sobre a escola, entre estes, um texto instigante da Adélia Prado, no qual ela acusa os professores de "desgraçados, brigando horas e horas, pela aula a mais, o tostão a mais, o enquadramento, o quinquênio, o milênio de arrogância, frustração e azedume". O livro Escola instituição da tortura poderá ser um divisor de águas na história da nossa educação, conclamando todos a tirar a máscara da "escola sagrada, acima de qualquer suspeita" e partindo para uma nova posição compatível com uma escola realmente democrática, formadora de cidadãos e não de alunos-robôs, resultantes do medo imposto pela escola que tortura.

E acaba chegando ao que há de mais grave neste país: o enorme contingente de jovens que não concluem nem mesmo o ensino fundamental, expulsos sistematicamente por um sistema escolar "repleto de narcisistas e de indivíduos imaturos, para não dizer cheios de raiva, capazes de agredir, até fisicamente, as crianças", como bem definiu nosso grande estudioso da educação, e citado pela autora no livro, Lauro de Oliveira Lima.

Fonte: http://www.educacaopublica.rj.gov.br/cultura/livros/0017.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário