Por Leonardo Boff*
Dada a crise generalizada que vivemos, toda e qualquer educação deve incluir o cuidado para com tudo o que existe e vive. Sem isso, não garantiremos uma sustentabilidade que permita ao planeta manter sua vitalidade, os ecossistemas, seu equilíbrio e a nossa civilização, seu futuro. Somos educados para o pensamento crítico e criativo, visando a uma profissão e um bom nível de vida, mas nos olvidamos de educar para a responsabilidade e o cuidado para com o futuro comum da Terra e da humanidade.
Os analistas mais sérios da pegada ecológica da Terra nos advertem que, se não cuidarmos, podemos conhecer catástrofes piores do que as vividas em 2011, no Brasil e no Japão. Para se garantir, a Terra poderá, talvez, ter que reduzir sua biosfera, eliminando espécies e milhões de seres humanos.
Quando contemplamos a Terra, a partir do espaço exterior, surge em nós um sentimento de reverência diante de nossa única casa comum. Somos inseparáveis da Terra, formamos um todo com ela. Sentimos que devemos amá-la e cuidar dela para que nos possa oferecer tudo que precisamos para continuar a viver.
A segunda excelência do cuidado como atitude ética e forma de amor é o encantamento que irrompe em nós pela emergência mais espetacular e bela que jamais existiu no mundo: o milagre, melhor, o mistério da existência de cada ser individual. Os sistemas, as instituições, as ciências, as técnicas e as escolas não possuem o que cada pessoa humana possui: consciência, amorosidade, cuidado, criatividade, solidariedade, compaixão e sentimento de pertinência a um todo maior, que nos sustenta e anima. Devemos nos sentir orgulhosos de poder desempenhar essa missão para a Terra e todo o universo, mas somente o faremos se cuidarmos de nós mesmos, dos outros e de cada ser que aqui vive.
Poucos expressaram melhor esses nobres sentimentos que o exímio músico e também poeta Pablo Casals. Em discurso na ONU nos anos 80, dirigia-se à Assembleia Geral pensando nas crianças como o futuro da nova humanidade. A mensagem vale também para todos nós, adultos. Dizia ele: "A criança precisa saber que ela própria é um milagre; saber que, desde o início do mundo, jamais houve uma criança igual a ela e que, em todo o futuro, jamais aparecerá alguém como ela. Cada criança é algo único, do início ao fim dos tempos. Assim, a criança assume uma responsabilidade ao reconhecer: é verdade, sou um milagre, do mesmo modo que uma árvore é um milagre. E sendo um milagre, poderia eu fazer o mal?
Acredito que o que estou dizendo às crianças pode ajudar a fazer surgir um outro modo de pensar o mundo e a vida. O mundo de hoje é mau e é assim porque não falamos às crianças do jeito que estou falando agora e do jeito que elas precisam que lhes falemos. Então, o mundo não terá mais razões para ser mau".
Cada realidade, especialmente a humana, é única e preciosa, mas, ao mesmo tempo, vivemos num mundo conflitivo, contraditório e com aspectos terrificantes. Mesmo assim, há que se confiar na força da semente. Cada criança que nasce é semente de um mundo que pode ser melhor. Por isso, vale ter esperança.
Um paciente de um hospital psiquiátrico que visitei, escreveu, em pirografia, numa tabuleta que me deu de presente: "Sempre que nasce uma criança é sinal de que Deus ainda acredita no ser humano". Nada mais é necessário dizer, pois nessas palavras se encerra todo o sentido de nossa esperança face aos males e às tragédias deste mundo.
* Leonardo Boff é filósofo, teólogo e escritor
Fonte: O Tempo (MG)
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