terça-feira, 26 de agosto de 2014

A educação e os meios de comunicação

 

Lúcio Alves de Barros*
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Não creio que exista dúvida sobre o importante papel da mídia nos dias atuais. Sabemos de sua importância no campo da socialização de informações, da ressonância em publicidade no que toca ao cenário das políticas públicas, à democratização das informações e à necessidade de liberdade de sua ação no que se refere ao fortalecimento dos pilares da democracia. Não obstante sua importância, a mídia como veículo de informação na educação vem se revestindo, nas últimas décadas, de roupagens constrangedoras, complexas e perigosas.
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Uma das roupagens da mídia se refere ao seu papel de mediadora de relações sociais em ambientes domésticos e privados. Os meios de comunicação, especialmente a TV, ao entrar logo cedo na casa cheia de filhos, funcionam como verdadeiras babás eletrônicas, fornecendo ao infante ou ao adolescente um turbilhão de informações sobre os quais dificilmente os responsáveis teriam controle. Imagens duras, “reportagens quentes”, notícias sensacionalistas, acontecimentos sexualizados e sensualizados se misturam em horários diversos com propagandas, programas e publicidades. Com muita dificuldade uma criança entenderia o como e o porquê de determinadas ações serem direcionadas de determinada forma na tela da TV. Os cortes, as imagens, a cadência de informações não são neutras, e o descontrole por parte do receptor é inviabilizado, apesar da fala de que “não quer ver, desligue a TV”, “não leia o jornal” ou “não escute o rádio”.
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Outra roupagem dos meios de comunicação é o de ser uma instituição acima dos seres humanos e até de “deus”. Não por acaso, católicos e protestantes invadiram tanto canais abertos como fechados, vendo nesse veículo uma boa forma não somente de angariar fundos como também de levar ao crente o que determinadas religiões entendem por deus. Como mecanismo de poder, os meios de comunicação também assumem papel político. Tal como o anterior, trata-se de agente sem neutralidade e que produz de acordo com o “coronelismo midiático”, que no Brasil aparece nas mãos de poucas famílias. É o cúmulo do absurdo, haja vista que os meios de comunicação, notadamente as redes de televisão, operam alicerçados em concessões públicas que, a despeito da temporalidade, tem se mantido nas mãos dos mesmos donos de sempre.
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Outra e polêmica roupagem que a mídia assume é o de educadora em tempo integral. Aparentemente, primeiro ela atuou na base do vídeo; os mais velhos devem lembrar dos antigos telecursos passados logo ao amanhecer. Tais cursos atendiam tanto ao Ensino Fundamental como ao Médio. Com os avanços da informática, os meios de comunicação alcançaram a hiper-realidade e acabaram com as barreiras de tempo e espaço. Atualmente, pela internet os alunos interessados que não estudam nem em sala de aula se esforçam por assistir em vários meios uma ou duas aulas que, ao longo do tempo são armazenadas no ciberespaço. Mas a mídia vai mais longe: ela tem a pretensão de ser uma educadora privilegiada e uma potencial formadora de opinião e de identidades. Para isso, não é preciso tanta força. Os meios de comunicação têm ao seu dispor, diferentemente da sala de aula, imagens, sons, movimento e relações em tempo real. Também oferecem “facilidades”: ajudam no armazenamento, na comparação de informações, na organização de dados e nas pesquisas. Todavia, ela também forja a preguiça, a miopia mental, a mentira, a falsidade e a ideia de que guardar e reter conhecimento é o mesmo que saber usá-lo. Daí a presença marcante das colas nas instituições de ensino e da produção de “intelectuais” que operam na simples repetição de ementas e conteúdos.
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Para finalizar, é preciso apontar que podemos ser vítimas desse “porre” de informações que tende a embebedar computadores com livros que não vão ser lidos, pesquisas, relatórios e dados que jamais serão aproveitados. O perfil da educação oferecido pela mídia não comporta a educação crítica e transformadora. Não é por acaso a presença do corte, dos programas gravados e da inexistência do contraditório. Não é possível, ao contrário das ações das instituições de ensino, colocar em xeque a mídia educacional que navega na burrice de massa, no pensamento pequeno e na falta de ética em relação aos que não possuem poder. Nesse caminho, é imperioso lembrar aqueles que estão por trás dos mass media. Eles, apesar do chamado ciberespaço, não falam por si. Atrás dos computadores, da TV, dos rádios, revistas e jornais, temos uma “educação” manipulada por poucos e que não possuem o mínimo de didática, currículo e que não chegam nem perto do que se entende por cuidado com o outro.
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* Professor da Faculdade de Educação da UEMG - Publicado em 26 de agosto de 2014 - Edição 32.
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Fonte: Revista Educação Pública: Reflexão e interação de educadores, RJ: In: http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/comunicacao/0035.html

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